História
da Itália
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A Itália é um país da Europa meridional que faz fronteira ao
norte com França, Suíça, Áustria e Eslovênia, cujo território principal forma
uma península no mar Mediterrâneo e inclui
duas grandes ilhas, a Sicília e a Sardenha. Sofreu, historicamente, a influência de etruscos, gregos e celtas
antes de ser unificada em 262 a.C. pelo domínio romano. Roma continua a ser a capital da Itália até
hoje. O nome Itália vêm da Roma antiga. Os romanos chamavam de Itália o sul
da península Itálica ou Apenina, que significa
"terra de bois" ou "terra de pastos".
Antiguidade
Línguas itálicas antigas
Expansão etrusca entre 750-500 a.C.
A lupa capitolina, símbolo da Roma Antiga.
A Itália influenciou bastante o desenvolvimento cultural e social de
toda a Europa mediterrânea, bem como teve muita influência sobre a cultura
europeia, pois importantes culturas e civilizações existiram no país. No
terceiro milénio a.C., foi povoada por populações mediterrâneas que ali se
estabeleceram com o nome de lígures (na península) ou sicanos (na Sicília). No segundo milénio a.C., com as
migrações indo-europeias, instalou-se uma civilização específica, dita "dos terramares",
na planície do Pó; os últimos a chegar, os vilanovianos,
praticavam a incineração e faziam uso do ferro
Em aproximadamente 1 000 a.C., dois grupos itálicos (ou italiotas) constituíram o cerne da população da
Itália. No século VIII a.C., os etruscos instalaram-se entre o Pó e a Campânia, dominando a região central da península Itálica durante
séculos; os gregos estabeleceram colônias e postos
comerciais na Sicília e na costa meridional da Itália (Magna Grécia). No século IV a.C., os celtas
ocuparam a planície do Pó. A civilização etrusca conheceu seu apogeu nos
séculos VI e V a.C.
Roma Antiga
Reino de Roma
A realeza ou monarquia romana vai desde as origens de Roma à queda da
realeza em 509 a.C. Ou seja, vai desde o momento lendário de sua fundação em 21
de abril de 753 a.C.1 , até o final da monarquia em 509 a.C., quando o
último rei, Tarquínio, o Soberbo
(último dos reis Tarquínios), foi expulso, instaurando-se a
República Romana. A
documentação desse período é precária, e até mesmo o nome dos reis são
desconhecidos, citando-se apenas os reis lendários, apresentados nas obras de Virgílio ("Eneida") e Tito Lívio ("História de Roma").
República Romana
A República Romana (do latim
res publica, "coisa pública") é o termo utilizado por
convenção para definir o Estado romano e suas províncias desde o fim do Reino de Roma em 509 a.C. (quando o último rei foi deposto) ao estabelecimento do Império Romano em 27 a.C.
Roma aproveitou-se das dissensões entre os diferentes povos da Itália
para conquistar progressivamente o conjunto da península, dominando ao mesmo
tempo, depois de derrotar Cartago, o conjunto do Mediterrâneo ocidental. O latim, a língua do vitorioso,
impôs-se em toda a Itália. Entre 91 a.C. e [89 a.C., a Guerra Social
obrigou Roma a conceder a cidadania romana a todos os habitantes da península Itálica. Entre
58 a.C. e 51 a.C., com Júlio César, a Itália conquistou a Gália.
Império Romano
O
imperador Augusto, na Estátua da Prima Porta
O Império Romano é a fase da história da Roma Antiga caracterizada por uma forma autocrática de governo. O Império Romano sucedeu a República Romana que durou
quase 500 anos (509 a.C. – 27 a.C.) e tinha sido enfraquecida pelo conflito
entre Caio Mário e Lúcio Cornélio Sula e pela
guerra civil
de Júlio César contra Pompeu.nota 1 Muitas datas são comumente propostas para marcar
a transição da república ao império, incluindo a data da indicação de Júlio
César como ditador perpétuo 44 a.C.), a vitória do herdeiro de Otaviano na Batalha de Áccio (2 de
setembro de 31 a.C.), ou a data em que o senado romano outorgou a Otaviano o
título honorífico augusto (16 de janeiro de
27 a.C. a.C.).nota 2 Otávio incorporou a Gália Cisalpina à Itália, empurrando as suas fronteiras para o
Norte.
A partir de Augusto, a Itália tornou-se o centro de um vasto império,
que ela dirigia e que a alimentava. O cristianismo, introduzido no século I e perseguido durante
muito tempo, triunfou no século IV em Roma, que se tornou a sede do papado.
No século IV, o imperador Constantino reconstruiu e ampliou a cidade grega de Bizâncio, chamando-a de "Nova Roma". Após sua morte,
a cidade foi renomeada Constantinopla (atual Istambul) e gradualmente transformou-se na capital do Império,
originando o que mais tarde seria chamado de Império Bizantino. Roma
permaneceu como capital do Império do Ocidente
até sua queda em 476 d.C.. Após a morte do imperador Teodósio I, em 395 d.C., o império foi definitivamente
dividido em dois.
No século V, com as invasões bárbaras, o
Império do Ocidente reduziu-se à Itália, que tampouco foi poupada. Alarico, rei dos visigodos, saqueou Roma em 410 d.C..
Seguiu-se o saque do vândalo Genserico em 455 d.C..
Idade Média
Península Itálica na Idade Média
Itália em 500 d.C. - Reino Ostrogodo
Itália em 550 d.C. - Parte do Império Bizantino
Em 476 d.C., Odoacro, rei dos hérulos, depôs o imperador Rômulo Augústulo, pondo
fim ao Império Romano do Ocidente,
e assumindo o título de rei da Itália. Esta data foi convencionada para marcar
o início da Idade Média.
Em 488 d.C., Teodorico, o Grande, rei
dos ostrogodos, invadiu a península Itálica e se
proclamou soberano absoluto, mas após sua morte (526 d.C.), seu reino entrou em
decadência. Justiniano I, imperador romano do Oriente,
restabeleceu a autoridade bizantina na maior parte
da península e Ravena tornou-se capital da Itália bizantina.
Em 568 d.C., os lombardos, outro povo germânico, invadiram
a península e a controlaram quase toda, com exceção do enclave bizantino ao
norte, o Exarcado de Ravena. Além
do Reino Lombardo, os lombardos fundaram os ducados
de Espoleto e Benevento.
A partir de então, a Itália teve três capitais: Roma,
sede do papado; Ravena, onde ficava o exarca,
representante do imperador; Pavia,
onde se tinha fixado o rei lombardo.
Os lombardos
Em 560 d.C., o novo e enérgico rei lombardo Alboíno derrotou os vizinhos gépidas, os fez seus súditos e, em 566 d.C., casou sua filha
Rosamund com o rei Cunimond. Na primavera de 568 d.C., Alboíno liderou os
lombardos junto com outros povos germânicos, bávaros, gépidas, saxões e búlgaros, através dos Alpes,
com uma população de 400.000 a 500.000 pessoas, para invadir o norte da península Itálica,
derrotando os bizantinos e fundando o Reino Lombardo.
Depois da morte de Alboíno, em 572 d.C., ocorreu um vazio no poder que
propiciou a união de diferentes grupos sob o comando de um líder regional
chamado duque. Os lombardos, como fizeram anteriormente os godos,
abraçaram o credo denominado arianismo, o que originou contínuos confrontos
religiosos com os habitantes nativos do país, majoritariamente católicos. Por fim, a conversão à fé católica do rei lombardo Agilolfo (reinou entre 590 d.C. -615 d.C.) trouxe no seu bojo
um período de relativa calma. Os lombardos, que pretendiam consolidar seu poder
político, começaram a fazer incursões no território papal. Em 754 d.C., o papa Estêvão II pediu
ajuda aos francos, convertidos à fé católica um século antes.
Dos francos ao Renascimento
Carlos Magno, estátua em Frankfurt
Itália no ano 1000
Itália em 1494
No século VIII, o papa pediu ajuda aos francos contra os avanços lombardos. Sob a forte liderança de Pepino, o Breve, e posteriormente de seu filho, Carlos Magno, os francos derrotaram os lombardos e depuseram
seu último rei. Graças à proteção de Pepino e Carlos Magno, constituíram-se os Estados Pontifícios. Em
774 d.C., Carlos Magno proclamou-se rei dos lombardos.
Em 775 d.C., Carlos Magno estabeleceu com o Papa Leão III o acordo que por um lado permitiu-lhe ser ungido
como imperador do Império Sacro-Romano
pelo papa, por outro lado o comprometeu a promover a difusão do cristianismo em seus domínios, respeitando Roma
como sede do cristianismo, defendendo-a inclusive das investidas do Império Bizantino. Seu
domínio na península Itálica se
concentrou na Lombardia, ao Norte que passou a fazer parte do Império Carolíngio,
enquanto ao sul de Roma, os conquistadores árabes da Sicília e o Império Bizantino disputavam o
domínio.
A influência carolíngia, entretanto, foi dificultada no século IX com as
incursões sarracenas e normandas no Sul, e a fragmentação feudal. Após 875 d.C., os imperadores renunciaram à defesa da
Itália, que, dado o enfraquecimento do papado, caiu na anarquia (século X).
No século X, o rei da Germânia Oto I foi coroado imperador em Roma (962
d.C. e a Itália foi integrada ao Sacro Império Romano Germânico.
As cidades do norte da atual Itália passaram a ficar mais independentes entre
si, tornando-se centros econômicos e políticos importantes. Nos meados do século XI, o papado
reagiu, sacudindo o jugo imperial.
Os longos conflitos entre o papa e o imperador (1073-1266), dos quais a
Itália foi, com frequência, o principal alvo, debilitaram, na realidade, os
dois poderes, enquanto nascia (séculos XI-XII) uma Itália comercial, urbana,
independente e rica.
A querela das Investiduras
(1075-1122) encerrou-se com a vitória do papado sobre o império. Apoiados por
Roma, os normandos de Roberto Guiscardo criaram
um reino no Sul da Itália. Entre 1122-1250, surgiu uma nova força, a das
cidades, erigidas em comunas e enriquecidas pelo crescimento
econômico (Pisa, Gênova, Florença, Milão e Veneza).
Quando o conflito entre Roma e o Império recrudesceu com a querela do Sacerdócio e do Império (1154-1250), que permitiu
ao imperador Frederico Barbarossa
conquistar o reino normando, as cidades foram obrigadas a envolver-se nele e
dilaceraram-se entre guelfos (partidários do papa) e gibelinos (partidários do imperador).
A partir do século XIII, o poder, nas cidades, passou às mãos de potentados. Na
Itália do Norte, dominavam quatro grandes cidades-Estado (Florença, Gênova, Veneza
e Milão), sendo San Marino uma remanescente dessas
cidades-Estado setentrionais. Na Itália central, o papado, forçado a deixar
Roma por Avinhão (1309 - 1376), foi enfraquecido pelo Grande Cisma do Ocidente
(1378-1417). O Sul da Itália foi entregue a Carlos de Anjou e a Sicília, à coroa de Aragão, pondo fim às pretensões imperiais sobre a Itália. O
Sul da península, entretanto, ficou dividido pelas lutas entre os angevinos e os aragoneses (séculos XIV-XV).
No século XIV, a península Itálica foi
campo de batalha para os franceses, os aragoneses e os suíços. No final do século XV, a Itália foi invadida pela
França e, mais tarde, pelo imperador Carlos V, que subjugou a
maior parte do território em 1550. A França, pelo Tratado de
Cateau-Cambrésis, renunciou às suas pretensões à parte transalpina
(1559), e os aragoneses, herdeiros de Carlos V na Itália, dominaram o sul da
península durante dois séculos.
Apesar disso, o século XIV foi uma época de grande desenvolvimento em
função da atividade comercial das quatro repúblicas marítimas, Veneza, Génova, Pisa
e Amalfi, e da atividade financeira dos banqueiros de Florença.
O desenvolvimento econômico e a riqueza da Itália permitiram um grande
desenvolvimento cultural e artístico, conhecido como Renascimento, que se irradiou pela Europa.
No século XV, surgiu no norte uma nova potência, o ducado de Saboia. Nas cidades, onde famílias principescas
sobrepujaram o regime republicano, assistiu-se ao apogeu
do Renascimento (Florença).
Renascimento
Autorretrato
de Leonardo da Vinci.
O Renascimento é a ponte entre e Idade Média e a Era Moderna. O saber passou a ser o centro de todas as
atenções nesta época. A Itália ofereceu à humanidade nestes séculos
contribuições de homens notáveis em muitos campos do conhecimento, como por
exemplo: na Pintura e Escultura: Michelangelo, Rafael, Ticiano, Tintoretto e Leonardo da Vinci; na Arquitetura: Filippo Brunelleschi; na Física: Leonardo da Vinci, talvez o gênio mais eclético da humanidade; nas Ciências Políticas: Maquiavel; nas Ciências Contábeis: Luca Pacioli.
A influência da Igreja Católica continuou sendo muito grande, e por muitas
vezes, Roma estabeleceu confrontos abertos com as cidades-estado apoiada por
potências estrangeiras, como por exemplo, Papa Alexandre VI, que favoreceu a influência espanhola na
Itália. O país, então dividido entre cidades-estado rivais, passou a sofrer
grande influência espanhola (1559-1700).
O domínio espanhol e austríaco (séculos XVII -
XVIII), o desmembramento extremo do país e o deslocamento das vias marítimas em
detrimento do Mediterrâneo provocaram o declínio
econômico da península, centro da Contra-Reforma. Pouco a pouco, as velhas cidades perderam sua
influência em proveito do Reino da Sardenha (casa de Saboia).
Risorgimento
Risorgimento
Itália em 1796
Itália em 1843
No século XVIII, o tratado de Utrecht (1713)
submeteu o país à dominação dos Habsburgo da Áustria. Na Toscana e no reino de Nápoles, que, com
Parma, retornaram às mãos dos Bourbon da Espanha (1734), implantou-se uma política
reformista e esclarecida. Entre 1792 e 1799, a Itália permaneceu sob a
influência da França, que anexou a Saboia
e Nice e ocupou a república de Gênova. Foram
instituídas efêmeras "repúblicas irmãs".
Entre 1802 e 1804, Napoleão Bonaparte
conquistou o conjunto da península e instituiu, no norte, a "República Italiana".
Entre 1805 e 1814, esta tornou-se Reino de Itália,
tendo Napoleão Bonaparte como soberano; o reino de Nápoles, ocupado em 1806,
foi confiado a José Bonaparte e depois
(1808) a Joaquim Murat.
Em 1814, a Itália reassumiu a divisão anterior (12 estados). A dominação austríaca foi restaurada no norte e no
centro. A oposição dos italianos ao domínio austríaco manifestou-se em
um sentimento cada vez mais forte em favor da unidade nacional e da
independência, cujo primeiro sintoma foi o nascimento de uma rede de sociedades
secretas que desempenharam um papel de vital importância no transcurso das
revoluções de 1820, fortemente reprimidas pela Áustria.
Entre 1820 e 1821, conspirações de sociedades secretas (carbonários) contra o retorno do absolutismo, duramente reprimidas. Entre 1831 e 1833, eclodiram
novas revoltas, inspiradas pelo republicano Mazzini, fundador do movimento Jovem Itália.
As insurreições liberais e nacionais não obtiveram resultado em 1820,
1831 e 1848. As novas forças do Risorgimento criaram esperanças de
independência dos governos austríaco e francês. O Reino da Sardenha (com Carlos Alberto e,
mais tarde, Vítor Emanuel II e seu
ministro Cavour) assumiu a sua
liderança e obteve o apoio da França. Em 1859, as tropas franco-sardas
derrotaram a Áustria (campanha da Itália), que foi obrigada a deixar a Lombardia. Em 1860, a França recuperou Nice e a Saboia. A
união dessas regiões com o Piemonte deu origem a movimentos revolucionários na
Itália central e no Reino de Nápoles,
conquistado por Garibaldi (general e herói
italiano).
Em 1861, houve a proclamação do reino da Itália,
tendo Vítor Emanuel como soberano e Turim (substituída por Florença a partir de 1865) como capital. Em 1866, o reino
ampliou-se com a inclusão do Vêneto, graças à ajuda prussiana. A unificação
completa do país, entretanto, foi concluída apenas em 20 de setembro de 1870,
quando Roma foi conquistada, tornando-se a capital. Em consequência
da unificação, a Itália desenvolveu amplamente seus recursos econômicos e
militares.
Giuseppe Garibaldi e Vítor Emanuel II, por Sebastiano De
Albertis (1828-1897).
Em 1876, o chefe de governo passou a ser Francesco Crispi, anticlerical e hostil à França. Vítor
Emanuel II foi sucedido por Humberto I (1878), assassinado em 1900, e
por Vítor Emanuel III.
Num esforço para juntar-se à Escalada para a África, o premier e ministro italiano dos assuntos
exteriores, Crispi, reivindicou a colônia da Eritreia (1889), mas o malogrado avanço para a Etiópia culminou em uma derrota decisiva (1896) na batalha de Adowa.
Entre 1903 e 1914, G. Giolitti, presidente do Conselho, restabeleceu a ordem e o
equilíbrio econômico. A política externa, dominada
pelas reivindicações irredentistas, resultou na Guerra ítalo-turca
(1911-1912). Durante o conflito, a Itália conquistou o norte de Trípoli e o Dodecaneso e, e em 1914, ocupou grande
parte da Líbia, declarando-a parte integral do país em 1939. Criou
assim um império colonial na África que incluía, além da Líbia, a chamada África Oriental Italiana,
composta das atuais Eritreia, Somália Italiana e
Etiópia.
Fascismo
Benito Mussolini, à direita de Adolf Hitler.
A Itália participou da Primeira Guerra Mundial ao
lado dos Aliados (1915 a 1918),
satisfazendo apenas parte das suas ambições com a conquista de Trentino e do Alto Adige (ou Tirol Meridional), e depois Fiume.
Em 1922, Mussolini, depois da marcha sobre Roma dos seus camisas-negras, foi nomeado primeiro-ministro pelo rei e
instaurou um regime totalitário, o fascismo.
Mussolini, o duce (chefe), consolidou a unificação italiana com o "Concordato"
com a Igreja católica que abriu
mão de grande parte de seu território, restringindo o Estado do Vaticano a uma pequena área na Cidade de Roma.
O ditador Mussolini estava determinado a criar um novo Império Romano,
invadiu com sucesso a Etiópia (1935), ligando-a à Eritreia e à Somália Italiana para formar a África Oriental Italiana,
e a Albânia (1939).
Em junho de 1940, sonhando com a união completa da "Itália irredentista", Mussolini, que constituíra em 1936
o Eixo Roma–Berlim e, em
1939, assinara com o III Reich o pacto de Aço, entrou na Segunda Guerra Mundial ao
lado do Japão e da Alemanha de Hitler. Mas os reveses das potências do Eixo, a perda de seu
império no norte da África e o desembarque anglo-americano na Sicília trouxeram a queda e a prisão de Mussolini por ordem do
rei (1943). Um governo presidido pelo marechal Badoglio assinou o armistício e declarou
guerra à Alemanha. O Duce, libertado pelos alemães, constituiu
um governo fascista no norte da Itália, a República Social Italiana
(república de Saló), mas
com o avanço aliado na península, foi detido e fuzilado pelos antifascistas em
abril de 1945.
A república
O
primeiro-ministro Aldo Moro, sequestrado e morto pelas Brigadas Vermelhas.
Em 1944, com a abdicação de Vítor Emanuel III,
seu filho, Humberto II, tornou-se
lugar-tenente geral do reino. Em 1946, depois do efêmero reinado de Humberto
II, a república parlamentarista
foi proclamada na Itália após um plebiscito (2 de junho de 1946). A Assembléia Constituinte
redigiu o rascunho da Constituição que entrou em vigor em 1 de janeiro de 1948. A
campanha eleitoral que se seguiu à aprovação da mesma coincidiu com uma
intensificação da Guerra Fria e levou a Itália à beira da guerra civil.
O período imediatamente após a guerra foi marcado por um crescimento
econômico impressionante e uniforme, mas também por instabilidade política,
caracterizada por frequentes mudanças de governo. O democrata-cristão A. De Gasperi, presidente do Conselho (1945-1953), empreendeu
a reconstrução política e econômica do país, apoiando-se na aliança com os Estados Unidos.
Apesar da instabilidade política e de numerosas dificuldades de ordem
social, a Itália recuperou-se amplamente no plano econômico e acabou por se
tornar membro fundador da Comunidade Econômica Europeia
(CEE)
- atual União Europeia - e da Organização do
Tratado do Atlântico Norte (OTAN),
fundada em 4 de abril de 1949. Em 14 de dezembro de 1955,
a Itália tornou-se um membro da Organização das Nações Unidas
(ONU).
Entre 1958 e 1968, os democratas-cristãos,
com A. Fanfani e depois Aldo Moro, foram os artífices de um "milagre"
econômico que, todavia, não impediu o avanço eleitoral da esquerda. Em 1963, os
elementos moderados do Partido Socialista Italiano
(PSI) sob a direção de Pietro Sandro Nenni,
concordaram em fazer parte de um governo de centro-esquerda, fato que não
ocorria desde 1947. O democrata-cristão Aldo Moro formou então um governo de
coalizão com a participação de quatro partidos e ele mesmo assumiu o cargo de primeiro-ministro. Entre 1968 e 1972, a instabilidade política
fez os governos se sucederem em ritmo acelerado. A classe política, vista como corrupta, foi ficando cada
vez mais isolada do resto da sociedade.
O Partido Comunista Italiano
ajustou-se com sucesso à democracia, mas durante a década de 1970 o terrorismo político, apoiado inclusive pela Máfia [, organização criminosa de origem secular,
passou a criar grande insegurança, realizando sequestros e atentados políticos. O mais emblemático foi o
sequestro e assassinato do ex-primeiro-ministro Aldo Moro pelas Brigadas Vermelhas em
1978. Este assassinato provocou uma profunda reformulação política na Itália,
onde os governos da república, formados desde 1946, por coalizões dominadas
pelos democratas cristãos, evidenciavam sua incompetência, sofrendo acusações
de corrupção. Para restabelecer a ordem, os partidos políticos buscaram
realizar a aliança mais ampla possível, que foi obtida com o "compromisso histórico"
(1976-1979), união no poder dos comunistas e democratas-cristãos.
Em 1981, Giovanni Spadolini, líder
do Partido Republicano, tornou-se o primeiro-ministro. As crises do governo de
1983 levaram à formação de um novo governo sob a direção de Bettino Craxi, o primeiro chefe de governo socialista desde a
guerra. Em 1984, sob sua direção, o governo firmou um acordo com o Vaticano com o qual a religião católica deixou
de ser a oficial do país.
Em 1985, com a vitória dos democratas-cristãos,
Francesco Cossiga
(1985-1992) foi eleito presidente, sucedendo ao socialista Sandro Pertini. Como primeiro-ministro, manteve-se o socialista B. Craxi, até 1987, quando renunciou; sucederam-lhes na
presidência do Conselho os democratas-cristãos (Giovanni Goria, 1987; Ciriaco De Mita, 1988; G. Andreotti, 1989).
Francesco Cossiga convocou uma reforma contra a Máfia. Este processo foi
longo e penoso, provocando inclusive o assassinato do juiz Giovanni Falcone, responsável pela prisão de mafiosos. Em 1988
e 1989, vários brigadistas foram condenados à prisão.
Primeiro-ministros recentes
Em 1991, o Partido Comunista Italiano
transformou-se em Partido Democrático de Esquerda. Intensificou-se a luta contra
a Máfia. A partir de então, em 1992, o país aprofundou com sucesso a "Operação Mãos Limpas",
expulsando da vida política e econômica do país personalidades envolvidas com a
Máfia e a corrupção.
Em 1992, o presidente F. Cossiga foi substituído por Oscar Luigi Scalfaro. As
eleições legislativas foram marcadas pela derrota dos grandes partidos
tradicionais e pela emergência das "Ligas" (movimentos regionalistas
e populistas) no norte da Itália. O socialista G. Amato compôs um governo de coalizão que adotou uma política
de austeridade e revisão das instituições, mantendo a luta contra a Máfia e a
corrupção. Em 1993, essa política foi prosseguida por Carlo Azeglio Ciampi,
diretor do Banco Central, que chefiava o novo
governo. Iniciou-se uma reforma do sistema político, que incidiu especialmente
sobre o funcionamento dos partidos e as leis eleitorais.
Nas eleições de 1994 uma coalizão de partidos de direita e
extrema-direita, a Aliança
Liberdade, saiu vitoriosa. A Aliança Liberdade é formada pela Liga Norte (anteriormente chamada Liga Lombarda), a Aliança Nacional
e o partido Força Itália, criado pelo magnata da
mídia Silvio Berlusconi, que
ocupou o cargo de primeiro-ministro (presidente do Conselho). Sete meses depois
foi forçado a renunciar, havendo sido eleito para o cargo o economista Lamberto Dini, o qual saneou as finanças e governou um ano com
ministério técnico. Dini renunciou em janeiro de 1996, sendo sucedido por Antonio
Maccanico.
Nas eleições gerais celebradas no início de 1996 foi vencedora a
coalizão de centro-esquerda O Olivo, que levou Romano Prodi à presidência do conselho. Em 1998, foi sucedido
na chefia do governo por Massimo D'Alema, líder do Partido Democrático de Esquerda (PDS), herdeiro do antigo Partido Comunista Italiano.
Em 1999, a Itália participou da intervenção militar da OTAN
e da força multinacional de manutenção da paz no Kosovo.
Em 13 de maio de 1999, C. A. Ciampi foi eleito o
décimo presidente da República Italiana. Ciampi é um político
independente que contou, nessas presidenciais, com o apoio da coalizão de centro-esquerda
e da oposição de centro-direita liderada por Silvio Berlusconi. Elegeu-se por uma ampla margem de votos no
primeiro turno (707 votos de 1.010 eleitores), o que não é comum na Itália. Os
analistas atribuem o grande apoio com que contou à sua imagem de economista
brilhante e trabalhador e à sua independência política.
M. D'Alema demitiu-se depois da derrota dos partidos de centro-esquerda
nas eleições regionais. G. Amato retornou à chefia
do governo. Em 2001, vitória, nas eleições legislativas, de uma coalizão de
direita liderada por S. Berlusconi, reconduzido à presidência do Conselho. Em
julho de 2003, Berlusconi assumiu a presidência da UE durante o período que, pelo sistema de rodízio, coube à
Itália.
Notas
1. Durante estas lutas, centenas
de senadores morreram, e o senado romano foi renovado com legalistas
do primeiro triunvirato e
depois do segundo triunvirato.
2. Augusto oficialmente proclamou ter salvo a República Romana e
cuidadosamente disfarçou seu poder sob formas republicanas: cônsules continuaram a ser eleitos, tribunos dos plebeus continuaram a servir a justiça, e
senadores ainda debatiam na cúria romana. Porém, era Otávio, e cada um de seus
sucessores após ele, quem influenciava tudo e controlava as decisões finais e,
em última análise, tinha as legiões para garanti-lo, caso fosse necessário.
Imigração italiana no Brasil
.
A imigração italiana no Brasil teve como ápice o período entre
1880 e 1930. Os ítalo-brasileiros estão
espalhados principalmente pelos estados do Sul e do Sudeste do Brasil.
Os ítalo-brasileiros são descendentes da enorme massa de imigrantes italianos que chegaram ao Brasil entre 1870 e 1960.
Segundo estimativa da embaixada italiana no Brasil, em 2013 viviam no país cerca de 30
milhões de descendentes de imigrantes italianos (cerca de 15% da população brasileira), metade no
estado de São Paulo. É importante notar, contudo,
que o Censo Brasileiro não pesquisa este tipo de informação, nem a Embaixada
Italiana no Brasil realiza pesquisas nesse sentido.
Os ítalo-brasileiros são considerados a maior população de oriundi
(descendentes de italianos)
fora da Itália.2 Muitos ítalo-brasileiros mantêm certos costumes
tradicionais italianos. A contribuição dos italianos é notável em todos os
setores da sociedade brasileira, principalmente na mudança sócio-econômica que
os italianos produziram no campo e nas cidades. Podemos citar desde o modo de
vida que mudou profundamente influenciado pelo catolicismo, bem como nas artes,
música, arquitetura, alimentação e no empreender italiano na abertura de
empresas, e também como trabalhadores especializados. No campo podemos citar a
introdução de novas técnicas agrícolas, e principalmente na mudança do
latifúndio para pequenas propriedades agrícolas e na introdução da policultura
de produtos. A grande maioria dos ítalo-brasileiros está no sul e no sudeste do Brasil, mas há
ítalo-brasileiros também em outras regiões do Brasil. Muitos ítalo-brasileiros
já residentes no Brasil, em especial no sul, migrariam para estados do Centro-Oeste – em
especial para o Mato Grosso do Sul. No Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Espírito Santo alguns
ítalo-brasileiros ainda falam italiano e outros dialetos regionais da Itália.
Mas ítalo-brasileiros mais jovens costumam falar apenas português.
Antecedentes e início da imigração
A imigração italiana no Brasil foi intensa, tendo como ápice o período
entre os anos de 1880 e 1930. A maior parte dela se concentrou no estado de São Paulo. Os italianos começaram a imigrar em número
significativo para o Brasil a partir da década de 1870. Foram impulsionados
pelas transformações socioeconômicas em curso no Norte da península itálica, que
afetaram sobretudo a propriedade da terra. Um aspecto peculiar à imigração em
massa italiana é que ela começou a ocorrer pouco após a unificação da Itália
(1861), razão pela qual uma identidade nacional desses imigrantes se forjou, em
grande medida, no Brasil.
O século XIX foi marcado por uma intensa expulsão demográfica na Europa.
O alto crescimento da população, ao lado do acelerado processo de industrialização, afetaram
diretamente as oportunidades de emprego naquele continente. Estima-se que,
entre 1870 e 1970, em torno de 28 milhões de italianos emigraram
(aproximadamente a metade da população da Itália). Entre os destinos principais
estavam diversos países da Europa, América do Norte e América do Sul.
Não apenas a população da Itália, mas de toda a Europa de um modo geral
estava afundada na miséria no século XIX. A transição entre um modelo de
produção feudal para um sistema capitalista afetou diretamente as condições sociais no
continente europeu.5 As terras ficaram concentradas nas mãos de poucos
proprietários, havia altas taxas de impostos sobre a propriedade, fazendo o
pequeno proprietário se endividar com empréstimos. Havia a concorrência
desigual com as grandes propriedades rurais, que fazia o preço dos produtos do
pequeno proprietário ficarem muito baixos, empurrando essa mão-de-obra para as
indústrias nascentes, que não conseguiam absorver essa massa de trabalhadores,
saturando as cidades com desempregados. A medida que a disputa pelos mercados
consumidores se acirrou, a concentração de terras nas mãos de poucos se
agravou. Assim, milhões de camponeses, que antes eram pequenos proprietários
rurais, desceram à condição de trabalhadores braçais (bracciante) nas
grandes propriedades rurais. Mesmo aqueles que continuaram na condição de
pequenos proprietários não conseguiam mais tirar seu sustento da terra. Isto
porque as terras eram normalmente adquiridas por herança, e o filho mais velho
adquiria a propriedade após a morte do pai, enquanto os outros filhos eram
excluídos. Mesmo quando as terras eram divididas entre os filhos, o
fracionamento acarretava no recebimento de um pedaço de terra muito pequeno,
tornando impossível dali extrair o sustento.
No século XIX, a população europeia cresceu duas vezes e meia, agravando
ainda mais os problemas sociais naquele continente. Ao retratar o Vêneto oitocentista, região italiana de onde veio 30% dos
imigrantes italianos no Brasil, o historiador Emilio Franzina escreveu que
"podia-se morrer de inanição e que a única alimentação da classe rural não
passava de polenta, uma vez que a carne de vaca era um mito e o pão de farinha
de trigo inacessível pelo seu alto preço". Em outras regiões da Itália e
em outros países europeus a situação não era diferente: a fome e a miséria
assolavam a Europa. O camponês europeu nutria grande amor pelo seu pedaço de
terra e toda a sua existência girava em torno da manutenção da sua propriedade.
O seu mundo não ia além da comunidade a qual pertencia e seu ideal econômico
era a auto suficiência. O Continente Americano aparece, nesse contexto, como um
destino sonhado por milhões de europeus, que imigravam com a promessa de se
tornarem grandes proprietários agrícolas.
Foi assim que milhões de camponeses europeus, que não conheciam nada
além do seu vilarejo de origem, tornaram-se emigrantes. Primeiramente, buscaram
trabalho nas cidades. Em seguida, nos países vizinhos, numa migração sazonal
quando a demanda por mão-de-obra aumentava, como em época de colheitas. Depois,
regressavam para casa. Quando essas alternativas já não surtiam mais efeito,
buscaram a emigração transoceânica, sobretudo para os países das Américas. Estados Unidos, Canadá e Argentina eram países que tinham a
capacidade de atrair grande número de imigrantes espontâneos. O Brasil, por sua
vez, teve que apelar para uma migração subvencionada, na qual o próprio governo
brasileiro pagava a passagem dos imigrantes.5 Do fim das Guerras Napoleônicas até a
década de 1930, 60 milhões de europeus emigraram. Destes, 71% foram para a América do Norte, 21% para
a América Latina (sobretudo
Argentina e Brasil) e 7% para a Austrália. Nota-se que a nacionalidade que mais imigrou para a
América Latina foi a italiana, superando os espanhóis e os portugueses. Dos 11
milhões de imigrantes que foram para a América Latina, 38% eram italianos, 28%
eram espanhóis e 11% eram portugueses.
“Que entendeis por uma Nação, Senhor Ministro?
É a massa dos infelizes? Plantamos e ceifamos o trigo, mas nunca provamos pão
branco. Cultivamos a videira, mas não bebemos o vinho. Criamos animais, mas
não comemos a carne. Apesar disso, vós nos aconselhais a não abandonarmos a
nossa Pátria? Mas é uma Pátria a terra onde não se consegue viver do próprio
trabalho?”
|
—
Fala anônima de um italiano para o Ministro de Estado da Itália.7
|
Emigração
italiana (1870-1970)
|
|||||
País de destino
|
Número de
emigrantes recebidos (em milhões)
|
||||
Estados Unidos
|
5,6
|
||||
França
|
4,1
|
||||
Suíça
|
3,0
|
||||
Argentina
|
2,9
|
||||
Alemanha
|
2,4
|
||||
Brasil
|
1,5
|
||||
Império Austro-Húngaro
|
1,1
|
||||
Canadá
|
0,6
|
||||
Bélgica
|
0,5
|
||||
Austrália
|
0,4
|
||||
Venezuela
|
0,2
|
||||
Grã-Bretanha
|
0,2
|
||||
Europa
|
12,5
|
||||
Américas e Austrália
|
11,5
|
||||
Total
|
24
|
O Brasil como destino
Para compreender a imigração italiana no Brasil, é necessário analisar
os aspectos do país durante o século XIX. Na primeira metade deste século, a Grã-Bretanha, superpotência da época, pressionou fortemente o Brasil para
acabar com o tráfico negreiro que
supria as necessidades de mão-de-obra com a importação de escravos da África. A Lei Eusébio de Queirós
proibiu o tráfico negreiro em 1850
e, a partir deste momento, começou a falta de mão-de-obra nas zonas em que se
expandia a cultura cafeeira. Isto foi limitadamente resolvido com a importação de
escravos da Região Nordeste.
Nesta época, surgiu no Oeste Paulista um grupo de fazendeiros que, premido pela falta de mão-de-obra escrava,
defendeu o uso da mão-de-obra livre nas plantações de café, opondo-se
politicamente aos fazendeiros do Vale do Paraíba, donos de grandes plantéis de escravos. A
nação brasileira passou então por um período de fermentação das ideias abolicionistas.
Novas leis, como a Lei do Ventre Livre (1871)
e a Lei dos Sexagenários (1885)
anunciavam o fim próximo da escravidão. Ao mesmo tempo, a população escrava
envelhecia durante a segunda metade do século XIX sem que a reprodução natural da população fosse
suficiente para suprir a necessidade de mão-de-obra nas lavouras que se
expandiam ou para colonizar as terras ainda inexploradas no sul do Brasil. É
comum afirmar-se erroneamente que a libertação dos escravos em 1888 desencadeou a falta de mão-de-obra nas
lavouras quando os escravos libertos saíram das fazendas para as grandes
cidades. Isto aconteceu em pequena escala, e somente no Vale do Paraíba onde a lavoura cafeeira estava em franca
decadência de produção. Enquanto isto, na então província de São Paulo, as
plantações de café prosperavam e necessitavam cada vez mais de
mão de obra em quantidade muito superior à existente.
Navio com
italianos no porto de Santos(1907).
Pouco antes, a Itália havia passado pelas guerras pela Unificação Italiana. Com o fim destas guerras, a economia
italiana se encontrava debilitada, com altas taxas de crescimento demográfico e
de desemprego. Os Estados Unidos (maior
receptor de imigrantes) passaram a criar barreiras para a entrada de
estrangeiros. Tais fatores levaram, a partir da década de 1870, ao início da
maciça imigração de italianos para o Brasil.
No final do século XIX e início do século XX, as ideias de darwinismo social e eugenia racial tiveram grande prestígio no pensamento
científico mundial. Na medida em estas ideias eram aceitas e divulgadas pela
comunidade científica nacional, o imaginário social e político brasileiro
passou a considerar que os brasileiros eram incapazes de desenvolver o país por
serem, em sua grande maioria, negros e mestiços. A política de imigração passou então a ser planejada
não apenas com o propósito de suprir a mão-de-obra necessária ou de colonizar
territórios pouco ocupados, mas também para "branquear" a população
brasileira. Neste projeto social, negros e mestiços iriam paulatinamente desaparecer da população
brasileira por meio da miscigenação com as populações de imigrantes europeus.
Neste contexto, o imigrante italiano era considerado um dos melhores,
pois além de ser branco, também era católico. Deste modo, sua assimilação seria fácil na sociedade
brasileira e ele colaboraria para o "branqueamento" da população em
geral.
Deve-se ressaltar não foi apenas o Brasil que implantou políticas de
imigração que privilegiavam os grupos de imigrantes conforme as características
raciais ou religiosas desejadas. Vários países do mundo preferiam até mesmo o
imigrante do norte da Europa em vez dos que vinham do sul.
A imigração italiana para o Brasil tornou-se significativa a partir da
década de 1870 e transformou-se num fenômeno de massa entre 1887 e 1902,
influenciando decisivamente no aumento da população do Brasil. Entre 1880 e
1924, entraram no Brasil mais de 3,6 milhões de imigrantes, dos quais 38% eram
italianos. Considerando-se a faixa de tempo entre 1880 e 1904, os italianos
representaram 57,4% dos imigrantes. Em um distante segundo lugar apareciam os
portugueses, seguidos dos espanhóis e dos alemães. O Brasil posicionou-se,
assim, como o terceiro maior país receptor de imigrantes italianos entre os
anos 1880 e a I Guerra Mundial, atrás
apenas dos Estados Unidos (5 milhões
de italianos entre 1875 e 1913) e da Argentina (2,4 milhões).
A imigração italiana para o Brasil atingiu seu ápice no final do século XIX. Porém, por volta de 1900,
aparecem na imprensa italiana notícias de péssimas condições de vida de
emigrantes italianos que não podiam abandonar as fazendas de café onde
trabalhavam, pois tinham dívidas principalmente relativas ao pagamento dos
custos de suas viagens. Isto faz com que, em 1902,
o governo da Itália emita o decreto Prinetti proibindo a imigração subsidiada de cidadãos italianos para o Brasil. O fluxo de imigrantes diminui
bruscamente já que, a partir de então, cada cidadão italiano que quisesse
emigrar para o Brasil deveria ter dinheiro para pagar a própria passagem.
Canção
dos imigrantes toscanos
"Itália
bela, mostra-te gentil
e os filhos teus não a abandonarão senão eles vão todos para o Brasil e não se lembram mais de voltar ainda aqui haveria trabalho sem ter que emigrar para a América o século presente está nos deixando e o novecentos se aproxima eles têm a fome pintada na cara e para saciá-los não existe a medicina a cada momento escutamos dizer: e vou para lá onde tem a colheita do café". Canção dos imigrantes (Final do século XIX) |
Uma família de imigrantes italianos.
|
Canção dos imigrantes vênetos
"América
América
lá se vive que é uma maravilha vamos ao Brasil com toda a família América América se ouve cantar vamos ao Brasil Brasil a povoar" Canção dos imigrantes (Final do século XIX).17 |
A
questão racial
A questão racial foi decisiva na política imigratória brasileira. O
imigrante ideal teria que ser agricultor e, mais do que isso, branco e que
emigrava com a família. Neste momento, imigrante virou
sinônimo de europeu, pois negros e mestiços foram automaticamente excluídos dos projetos de
colonização baseados na distribuição de terras. Nos contratos firmados por agenciadores,
os imigrantes eram selecionados de acordo com suas origens regionais (o que
indicava que a categoria genérica de "europeu" não era absoluta ou
exclusiva). Como exemplo, no decreto 5.663, de 1873, celebrado pelo governo
imperial com Joaquim Caetano Pinto Júnior, no topo da lista apareciam alemães e
austríacos, portugueses e espanhóis foram excluídos, mas incluía bascos e
italianos do Norte. Porém, a política imperial quase sempre não se prendia a
escolhas minuciosas da região de origem, sendo o europeu genérico o alvo
preferido da política imigrantista. Por muitas décadas os alemães permaneceram
no topo da preferência entre os imigrantes, por sua "índole" e seu
"pendor" agrícola. A situação se alterou no final do século XIX,
quando cresceu a corrente contrária à imigração alemã, devido à
formação de quistos germânicos no sul do Brasil, que não se assimilavam dentro
da sociedade brasileira, o que passou a ser considerado uma ameaça.
Recorrer à imigração
de trabalhadores africanos foi uma ideia prontamente descartada pois, para a
elite, isso representaria um reestabelecimento do tráfico negreiro e um aumento
da "africanização" do Brasil. O grande número de negros e mestiços,
majoritários na população brasileira, causava preocupação entre a elite. Chineses, indianos
e outros asiáticos
também foram excluídos uma vez que, ao lado dos africanos, eram considerados
pertencentes às "raças inferiores", em um momento em que as ideias de
eugenia
racial tinham grande prestígio no pensamento científico. O decreto 528, de 1890
foi explícito ao restringir a entrada no Brasil de "indígenas da Ásia e da
África".
O privilégio concedido aos europeus também não era irrestrito, uma vez
que criminosos, mendigos, vagabundos, portadores de doenças contagiosas,
inválidos, velhos, ciganos, ativistas políticos, refugiados, etc, eram listados
como "indesejáveis". Os alemães também passaram a figurar na lista
dos "indesejáveis", devido à sua tendência à não assimilação. Neste
momento, a questão da "latinidade" ganhou força, uma vez que o
governo pretendia formar um crisol de raças, que se miscigenaria, caldearia,
fundindo-se e assimilando imigrantes e descendentes, alcançando uma meta que
seria uma totalidade inequivocadamente brasileira. No pensamento da elite, se
formaria no Brasil um povo mestiço, mas onde deveriam predominar as
características da raça branca, diluindo a presença das "raças
inferiores" (negros e índios).
Assim, italianos, portugueses (e, às vezes, espanhóis), pelo fato de
serem povos de cultura latina, próxima à
matriz luso-brasileira, apareciam como os imigrantes preferenciais,
provavelmente com ênfase nos italianos, pois também havia um certo sentimento
antilusitano, inclusive nos meios intelectuais. Assim, a política migratória
brasileira privilegiou italianos e portugueses, considerados
"assimiláveis", tratou com reservas alemães e japoneses (menos
propensos à assimilação) e excluiu por completo africanos e asiáticos (a
restrição à migração de asiáticos só foi revogada em 1907, pouco antes da
chegada dos primeiros imigrantes japoneses).
A escolha em imigrar para o Brasil
Panfleto
estimulando a imigração para o Brasil. Lê-se "Na América. Terras no Brasil
para os italianos. Navios partindo toda a semana do porto de Gênova. Venham
construir seus sonhos com a família. Um país de oportunidades. Clima tropical e
abundância. Riquezas minerais. No Brasil vocês podem ter o seu castelo. O
governo dá terras e ferramentas para todos".
A política imigratória brasileira teve duas vertentes: uma era atrair imigrantes e fazer deles proprietários rurais e a outra focava em simplesmente obter braços para as lavouras de café. Em consequência, os imigrantes podiam optar entre rumar para os núcleos coloniais ou para as fazendas. Os núcleos coloniais apenas vigoraram nas regiões onde não havia plantações de café, uma vez que, nas regiões cafeeiras, as terras disponíveis à colonização eram escassas e marginais. Ademais, a formação de novos núcleos coloniais dependia da autorização do parlamento, e os representantes obstacularizavam o fluxo exagerado de imigrantes para as colônias, visando garantir o fluxo da mão de obra necessária para as fazendas de café. Isso, todavia, não impediu a formação de núcleos coloniais onde havia plantações de café, desde que aqueles não fizessem concorrência com estes.
Para atrair imigrantes, o governo efetuava contratos com empresas ou
particulares. O mais famoso foi o firmado entre o governo federal e a Companhia
Metropolitana, que pretendia trazer um milhão de imigrantes ao Brasil num
espaço de dez anos. Embora essa meta não tenha sido alcançada, não eram raros
os contratos que estipulavam a vinda de 50 ou 60 mil imigrantes. Em 1894, os
serviços de imigração foram transferidos do governo federal para os
estados-membros. Apenas os estados mais ricos, como São Paulo, puderam
prosseguir na política de imigração, em consequência. A passagem gratuita de
navio oferecida pelo governo brasileiro surtiu grande efeito na Itália. A
imigração subsidiada deu a oportunidade para que milhares de camponeses e
lavradores assalariados, que dificilmente conseguiriam dinheiro para pagar suas
próprias passagens, pudessem fazer a viagem migratória. A imigração
subvencionada constituiu, em São Paulo, 89% da imigração total entre 1891 e
1895. Embora o governo estipulasse que apenas agricultores aptos ao trabalho
deveriam ser recrutados para imigrarem para o Brasil, na prática os agentes e subagentes
contratados na Europa para atrair imigrantes recrutavam qualquer um. Isso
acarretava em litígios logo na chegada, uma vez que no meio dos jovens
camponeses também chegavam velhos, crianças de peito e mulheres em gravidez
avançada. Os problemas não paravam por aí, uma vez que era comum que imigrantes
fossem forçados a pagar a sua passagem, mesmo quando tinham direito à passagem
gratuita.
Os agentes de emigração foram os grandes responsáveis pela vinda em
massa de italianos para o Brasil. Em 1892, existiam na Itália 30 agências de
emigração e 5.172 subagentes que perambulavam pelo país persuadindo as pessoas
a irem para o Brasil. Em 1895, o número de agências havia crescido para 33 e o
de agentes para 7.169. Os agentes eram contratados pelas companhias de
imigração e eram conhecidos pela sua falta de honestidade. Passavam pelas
aldeias nos dias de feira ou mercado, vendendo uma ideia positiva do Brasil,
dizendo que era o país do ganho assegurado e onde a propriedade rural estava ao
alcance da mão. Os agentes focavam nas famílias miseráveis e indigentes, às
quais prometiam passagem gratuita e a possibilidade de, em poucos anos,
juntarem dinheiro para poder retornar à Itália e ali comprar um pedaço de
terra. A companhia de imigração La Veloce pagava entre 5 e 25 dólares para o agente que conseguisse convencer uma família a
imigrar para o Brasil.
A imprensa da época comparava os agentes aos traficantes de escravos. As
aldeias eram inundadas com panfletos e cartas falsificadas de emigrantes que já
tinham partido. Porém, muitas vezes essas estratégias não eram suficientes uma
vez que, mesmo premidos pela miséria e sendo persuadidos a imigrarem para um
país de "ganho assegurado", também era necessário que quem estivesse
acenando a possibilidade de emigração fosse uma pessoa que ocupasse um papel na
sociedade para oferecer um mínimo de garantias. Nestes casos, eram os próprios prefeitos e vigários e, sobretudo, os secretários
municipais e os mestres-escolas que estimulavam as pessoas a emigrar.
A viagem de navio
Depois de decidirem imigrar para o Brasil, quase sempre após terem sido
persuadidos pelos agentes e subagentes de imigração, a próxima etapa era a
viagem migratória. O primeiro desafio era chegar até o porto de embarque. No
caso do Norte, era o porto de Gênova e, no Sul, o porto de Nápoles. A ida até o
porto, que às vezes era feita a pé, inclusive no inverno, envolvia aldeias
inteiras. Antes de partir, vendiam os poucos bens que possuíam. Frequentemente
chegavam ao porto vários dias antes do embarque, por má-fé dos agentes,
mancomunados com taberneiros e estalajadeiros, que tratavam de abusar dos
preços.
Uma vez dentro do navio, os imigrantes tinham que enfrentar uma viagem
naval terrível, com duração entre 21-30 dias, amontoados no navio como
passageiros de terceira classe. Não eram raros os envenenamentos por comida
estragada, mortes por epidemias e ondas de furtos.
Em 1888, em dois navios que transportavam imigrantes para o Brasil, o Matteo
Bruzzo e o Carlo Raggio, 52 pessoas morreram de fome e, em 1899, no Frisna,
24 morreram por asfixia.
Ao chegarem ao porto brasileiro, se encantavam com o verde intenso da
natureza exuberante do país e estranhavam os homens e mulheres de pele escura
que perambulavam pelo porto, os quais os italianos nunca tinham visto em seu
país de origem. Encaminhados para as fazendas, muitos imigrantes tiveram que
enfrentar uma vida de semi-escravidão nas plantações de café, bem diferente dos
relatos de paraíso vendido pelos agentes que os persuadiram a abandonar a
Itália. Em consequência, um número elevado de imigrantes retornou para a Itália
ou re-emigrou para outros países. Entre 1882 e 1914, entraram no estado de São
Paulo 1.553.000 imigrantes e saíram 695.000, ou seja, 45% do total. Entre
aqueles que voltaram para a Itália, ficaram na lembrança histórias trágicas que
ainda hoje permanecem na memória dos filhos e netos desses imigrantes
retornados. Mas também ficou na lembrança memórias positivas do Brasil, das
plantações de café, das frutas tropicais que nunca mais iriam provar e, de
certo modo, um agradecimento à terra que os havia permitido viver por algum
tempo. Já aqueles que permaneceram no Brasil e ali reconstruíram suas vidas,
influenciaram na formação dessa nação em diversos aspectos e contribuíram para
o desenvolvimento do país social e economicamente.
A colonização Italiana no Sul
Plantação
da uva
em Caxias do Sul.
No Brasil, havia grande disponibilidade de terras e um grande vazio
demográfico, que causava preocupação no governo. Atrair imigrantes europeus
para ocupar essas regiões foi uma política que existia desde o início do século
XIX. Entre 1818 e 1824, foram feitas duas tentativas de colonização por
imigrantes, sendo elas Nova Friburgo, no estado do Rio de
Janeiro, com suíços, e São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, com alemães. Em 1867, as terras públicas
disponíveis à colonização mediam 503.965 hectares e em 1861 existiam 33
colônias habitadas por 33.970 estrangeiros. Quatorze anos depois, o número de
colônias crescera para 89, sendo 66 delas no Sul (de São Paulo ao Rio Grande do
Sul).
Esse modelo de colonização era bastante limitado, devido à falta de
disponibilidades financeiras para levar a cabo um projeto desse porte e à
desorganização das iniciativas que envolviam particulares, o Estado e as
províncias. Em decorrência, das 96 colônias criadas entre 1846 e 1860, 66
desapareceram sem deixar sinal. A primeira lei orgânica para tratar da
colonização data de 1867, integrada por sucessivos decretos nos anos
posteriores, até o abandono da política de colonização, no ano de 1914. Os
imigrantes recebiam diversos auxílios governamentais, como viagem paga entre o
porto do Rio de Janeiro até o núcleo colonial, recebimento de um lote de terra
para a família imigrante, que poderia ser pago em várias prestações, uma casa
provisória e auxílio para construir uma nova moradia.
Nessa época, foram poucas as colônias que conseguiram prosperar, com
exceção das colônias alemãs, mais bem
organizadas devido às iniciativas de particulares. O governo brasileiro já
assistia, com apreensão, à progressiva germanização das províncias sulinas,
haja vista a sua organização e a sua impermeabilidade em relação à população
brasileira. É nesse momento que, com a crise afetando as zonas rurais na
Itália, se incentivou a vinda de colonos italianos para a região. O Sul do
Brasil, nesse período, exercia um poder de atração de italianos, pois contava
com disponibilidade de terras, atraindo os que aspiravam se tornar
proprietários rurais. Ademais, as notícias de que o clima no Brasil meridional
era suficientemente semelhante ao italiano para assegurar o cultivo de produtos
aos quais estavam acostumados e tinham conhecimento contribuiu para a corrente
migratória italiana ter se concentrado quase que exclusivamente nos estados
sulinos, nesse primeiro período de imigração. É importante salientar que a
historiografia sempre deu destaque à questão do clima "temperado" do
sul como um fator de atração dos imigrantes para a região. Na realidade, a
questão climática teve um peso reduzido na escolha em imigrar para aquela
região. O que, de fato, contribuiu para esse modelo de colonização europeia ter
predominado no sul é que, desde o início, essa região foi a que mais
sistematicamente investiu nesse modelo de povoamento com pequenos proprietários
estrangeiros. Esse modelo de colonização também foi tentado em outras partes do
Brasil, mas os parcos recursos gastos e a falta de organização geraram colônias
que prontamente fracassaram.
Os imigrantes que se dirigiram para o Sul do Brasil eram quase todos do Norte da Itália. Isto porque a imigração de italianos do Sul da Itália para o Brasil só se intensificou a partir de
1895, quando a imigração italiana para o Sul do Brasil já estava em plena
decadência, pois o fluxo migratório estava se dirigindo maciçamente para o
estado de São Paulo. No Rio Grande do Sul, vênetos e lombardos corresponderam a
87% dos imigrantes. Em Santa Catarina, trentinos, vênetos e lombardos formavam
a maioria, além de um número reduzido de emilianos. No Paraná, no início da
imigração, os vênetos corresponderam a 90% dos imigrantes, caindo para 70% mais
tarde. Em 1908, dos 52 núcleos coloniais habitados por italianos no Paraná, 46
eram habitados por vênetos, 3 por meridionais, 1 por friulanos e 1 por
imigrantes de várias regiões.
Os italianos tiveram que ocupar lotes localizados no planalto gaúcho,
região coberta pela mata, sem vias de comunicação, tendo que desenvolver uma
agricultura de subsistência. Isto porque as terras mais férteis já estavam
ocupadas pelos alemães, estimados em número de 70 mil indivíduos, que gozavam
de certa prosperidade, devido à sua organização. A emigração italiana para a
região foi contínua entre 1875 e 1892, quando entrou em decadência. A colônia
que apresentava mais características italianas era Caxias do Sul, que no ano de
1898 já contava com 25 mil habitantes, quase todos italianos. Os colonos apresentavam
uma alta taxa de reprodução, com uma média de 8-10 filhos, provocando um
excedente populacional que tinha que buscar terras virgens em outras áreas.
Essas colônias italianas ficavam normalmente em regiões isoladas por
matas. Esse isolamento representou barreiras enormes ao seu desenvolvimento,
como para escoar a sua produção devido às estradas que foram precariamente
construídas e para encontrar mercado consumidor para seus produtos, além de
trazer problemas como a falta de acesso à saúde e à educação. Por outro lado,
esse isolamento permitiu a manutenção de usos e costumes italianos, onde foi
possível a "reprodução orgânica de um tipo de sociedade vêneta de fins do
século XIX, tradicionalista e católica". A influência italiana ficou
visível no panorama arquitetônico da região, onde até as casas de madeira
tinham telhado inclinado para facilitar o deslizamento de uma neve
que não viria mais. Mas a influência italiana foi além disso, sendo visível no
modelo de família patriarcal, na alimentação (pão, polenta, toucinho) e também na língua, sendo que o dialeto vêneto predominou na região por muitos anos e, ainda
hoje, empréstimos linguísticos vênetos são usados nas áreas de colonização
italiana.
Inicialmente, 95% dos italianos nos estados sulinos estavam dedicados à
agricultura. Isso se devia à uma carência de demanda em algumas áreas,
sobretudo a industrial, praticamente inexistente, e no artesanto urbano. Isso
fazia com que alguns operários migrassem para os países do Prata (Argentina e
Uruguai) em busca de outros campos de trabalho. O subproletariado que não
desejava viver do trabalho agrícola tinha que procurar as capitais, como Porto Alegre. Com o decorrer do tempo, tanto nas colônias como
nos centros urbanos, assistiu-se à uma diversificação das atividades e
italianos passaram a se dedicar também ao comércio. Em 1920, as fábricas
pertencentes a italianos eram apenas 227 no Rio Grande do Sul, 56 em Santa
Catarina e 61 no Paraná, mostrando que a acumulação de poupança não foi muito
satisfatória entre os imigrantes italianos no Sul.
Os italianos se espalharam por várias partes do Rio Grande do Sul, e
muitas outras colônias foram criadas por particulares, que vendiam as terras
aos italianos. Nessas terras, os imigrantes italianos começaram a cultivar uvas
e a produzir vinhos. Atualmente, essas áreas de colonização italiana produzem
os melhores vinhos do Brasil.
Em Santa Catarina, os colonos
que vieram do norte da Itália no final do século XIX fugindo da
pobreza se estabeleceram principalmente no sul do estado. Hoje seus
descendentes representam quase metade da população catarinense e ocupam posição
de destaque na economia através da vinicultura e da produção de grãos, queijos
e embutidos. O turismo rural encontra terreno fértil na região de Criciúma, Urussanga e Orleans, onde antigos casarões coloniais e cantinas típicas
dividem a atenção com obras de arte como o Paredão do Zé Diabo e o Museu ao Ar
Livre, que retrata a vida dos primeiros imigrantes.
Nas colônias do Sul do Brasil, os imigrantes italianos
puderam se agrupar no seu próprio grupo étnico, onde podiam falar seus dialetos
de origem e manter sua cultura e tradições. A imigração italiana para o Brasil
meridional foi muito importante para o desenvolvimento econômico, assim como
para a cultura e formação étnica da população.
Mão-de-obra italiana para o café no Sudeste
O Memorial do Imigrante,
antiga Hospedaria dos Imigrantes, em São Paulo.
Embora tenha sido a região Sul a pioneira na imigração italiana, foi a Região Sudeste aquela que recebeu a maioria dos imigrantes.
Isto se deve ao processo de expansão das lavouras de café em São Paulo (e, em menor medida, também em Minas Gerais). Com o fim do tráfico negreiro e o sucesso da
colonização italiana no Sul, o Governo Paulista passa a incentivar a imigração
italiana com destino aos cafezais. A imigração subsidiada de italianos começou
na década de 1880. Os
próprios donos das fazendas de café tratavam de atrair imigrantes italianos
para as suas propriedades. Os proprietários de terras pagavam a viagem e o
imigrante tinha que se propor a trabalhar nas fazendas para devolver o valor da
passagem paga.
Os imigrantes italianos, na maioria, imigravam para o Brasil em famílias
e eram chamados de colonos. O governo brasileiro preferia atrair
famílias inteiras para o Brasil. Nas plantações de café, todos trabalhavam:
homens, mulheres e até crianças. Os fazendeiros, acostumados a trabalhar com escravos africanos, passaram a lidar com
trabalhadores europeus livres e assalariados. Todavia, muitos italianos nas
fazendas de café foram submetidos a jornadas de trabalho excessivas como as
enfrentadas pelos afro-brasileiros e muitos eram tratados de
maneira semelhante à dos escravos. Essa situação gerou muitos conflitos entre
os imigrantes italianos e os fazendeiros brasileiros, causando rebeliões e
revoltas. As notícias de trabalho semi-escravo chegaram à Itália, e o governo
italiano passou a dificultar a imigração para o Brasil.
O estado de São Paulo absorveu a maioria dos imigrantes italianos que
vieram para o Brasil. Este estado foi o destino de 44% da imigração italiana
para o Brasil entre os anos de 1820 e 1888, de 67% entre 1889 e 1919, com
ênfase entre 1900 e 1909, quando atraiu 79%. O peso demográfico italiano no
estado foi enorme: em 1934, italianos e seus filhos representavam 50% da
população de São Paulo. O estado oferecia muitas vantagens para quem quisesse
imigrar: pagava 75.000 réis por adulto, a metade por meninos de 7 a 12 anos e
20% pelas crianças de 3 a 7. A Sociedade Promotora de Imigração foi criada com
o intuito de incentivar a imigração. Não era difícil atrair imigrantes: os
jornais paulistas publicavam anúncios convidando os estrangeiros já residentes
a chamar parentes para o Brasil, que teriam passagem gratuita. Na sede europeia
na Itália, somavam-se milhares de pedidos de pessoas dispostas a ir para o
Brasil. Em 1887, foi edificada a Hospedaria de Imigrantes
no bairro do Brás, onde os imigrantes permaneciam por no máximo oito dias.
Lá, eles eram visitados por fazendeiros que lhes ofereciam contratos de
trabalho. O contrato era estipulado de forma verbal, sem nenhuma garantia de
que fosse integralmente cumprido conforme o combinado. Uma vez aceito o acordo,
os imigrantes eram transportados de trem, custeado pelo estado, até a fazenda.
Ao chegarem à fazenda, os colonos se deparavam com as péssimas condições
que os aguardavam. As fazendas eram um mundo à parte, isoladas por horas, às
vezes dias, dos centros urbanos, sem acesso médico, distantes das igrejas,
raramente com acesso à escola, tinham que dormir em cima de palha,
em casas minúsculas, sem as mínimas condições de higiene. As condições de trabalho eram degradantes, com
frequentes abusos por parte do fazendeiro. Houve rebeliões dos imigrantes, em
alguns casos envolvendo colonos que chegavam a assassinar o fazendeiro (o caso
mais emblemático foi do fazendeiro Diogo Salles, irmão do presidente Campos Salles, que tentou estuprar a irmã do colono italiano
Angelo Longaretti e acabou morto por ele). Mas as revoltas eram exceções, pois
os camponeses italianos normalmente agiam de forma apática,
pois provinham eles próprios de uma sociedade que via a resignação como uma
virtude cristã. Ademais, havia o afluxo contínuo de imigrantes e os
trabalhadores descontentes eram prontamente substituídos por outros. Embora os
italianos estivessem habituados a levar uma vida de privações em seu país de
origem, a vida nas plantações restringia de tal forma a liberdade que se
tornava insuportável.
A fazenda era um mundo fechado e o fazendeiro era o senhor absoluto,
impondo leis próprias. Habituado a lidar com escravos, o tratamento despendido
aos imigrantes não era muito diferente. Os colonos eram vigiados e tinham seu
tempo controlado por capangas, com toques de sino marcando o início e o fim do
trabalho. Os abusos se verificavam sobretudo na violência física generalizada,
inclusive com uso de chicote, como no tempo da escravidão. O
fazendeiro raramente era punido pelas autoridades por seus abusos, o que
estimulava a manutenção do seu comportamento e frequentes abusos econômicos.
Dentre os quais, a aplicação de multas, confisco dos produtos dos colonos,
adulteração de pesos e medidas e retenção do salário. Aliás, o endividamento do
colono era uma estratégia usada para o manter preso à fazenda e impedir sua
saída. Neste caso, apenas restava a fuga como forma de escapar da plantação. De
fato, seria muito difícil romper com a mentalidade escravista de forma célere,
e isso só ocorreu anos mais tarde.
O Decreto Prinetti e o refluxo migratório
No período da grande imigração, companhias de navegação como a
Navigazione Generale Italiana, a Veloce, a Transporte Maritimes, a
Ligure-Brasiliana e o vetor Ottavio Zino obtiveram licença do governo italiano
para transportar imigrantes que tinham suas passagens pagas pelo governo de São
Paulo (imigração subsidiada). Houve uma troca do fluxo de escravos africanos
por uma aliciação de trabalhadores italianos, ávidos por enriquecimento rápido,
transformando companhias de navegação em aliciadoras promotoras de um novo
modelo de tráfego humano. A violência da escravidão foi substituída pela
mentira persuasiva de que o Brasil era o país do enriquecimento rápido. Por
muitos anos, o governo italiano não se preocupou com a emigração. Pelo
contrário, a via com bons olhos, pois naquele momento de depressão econômica
evitaria-se, com a migração, que a ordem interna fosse abalada com a
permanência daquela massa descontente de trabalhadores, mantendo o equilíbrio
social e o status quo intacto. Além dos mais, os emigrantes engordavam a
economia italiana por meio das remessas que enviavam para o país natal.
Todavia, em decorrência de um relatório sobre as condições de trabalho
nas fazendas brasileiras, a Itália assinou o Decreto Prinetti (que na realidade
foi uma Portaria) em 26 de março de 1902. O relatório denunciava as situações
vividas pelos imigrantes nas plantações cafeeiras, com ênfase no período
pós-abolição. Essa portaria proibiu a migração subsidiada de italianos para o
Brasil, mas não restringiu a migração espontânea, ou seja, os italianos que
quisessem imigrar para o Brasil teriam que comprar suas próprias passagens, e
não depender da passagem paga pelo governo brasileiro. São Paulo prontamente
sentiu os efeitos dessa decisão, com a brusca queda na migração italiana,
acarretando em dificuldades de se achar trabalhadores. Mesmo assim, a imigração
subsidiada continuou a existir no Brasil até 1927, beneficiando outros
imigrantes, como os japoneses. Para
agravar a situação, nos primeiros anos do século XX houve uma grande crise
cafeeira, que afetou a economia local, fazendo não apenas o fluxo migratório
cair, mas também acarretou na saída de milhares de imigrantes do Brasil.
O Brasil, a partir de então, deixou de ser um destino atraente para os
imigrantes da Itália. Em decorrência, entre 1903 e 1919 a imigração italiana,
que havia sido hegemônica em São Paulo nos anos anteriores, caiu para o
terceiro lugar, sendo superada pela imigração de espanhóis e portugueses. A
procedência regional também sofreu abalos: antes, predominaram os vênetos e os
lombardos, que passaram a perder importância frente aos italianos do Sul,
sobretudo calabreses e campânios.
Os italianos nas cidades brasileiras
Embora a imigração italiana no Brasil fosse quase que exclusivamente
rural, com o passar do tempo, muitos dos imigrantes começaram a sair das zonas
rurais. Nas fazendas de café, a situação de semi-escravidão culminou, em 1902,
num decreto do governo italiano proibindo a imigração subsidiada para o Brasil.
Muitos imigrantes voltaram para a Itália, enquanto muitos se instalaram nos
centros urbanos brasileiros. O imigrante italiano no meio urbano brasileiro foi
de extrema importância, participando ativamente no desenvolvimento do comércio e de atividades urbanas. Em 1901,
90% dos operários fabris de São Paulo eram italianos. Foram um dos
protagonistas no desenvolvimento dos maiores centros urbanos do Brasil.
Ao lado de brasileiros e de outros imigrantes, os italianos trabalharam
ativamente nas fábricas que se multiplicavam pelo País. Os salários eram muito
baixos, o que forçava os imigrantes a viverem amontoados em cortiços, podendo viver em uma única casa diversas famílias.
Surgem então, em São Paulo, bairros como o Brás, a Moóca e o Bixiga, ainda hoje ligados ao passado
operário italiano. O trabalho não era exclusivo dos homens: crianças e mulheres
italianas formavam parte significativa dos trabalhadores. Com o passar do
tempo, o setor terciário das cidades brasileiras cresceu e muitos imigrantes
italianos deixaram as indústrias para trabalhar como artesãos autônomos,
pequenos comerciantes, motoristas de ônibus e táxi, vendedores de frutas e
vegetais, sapateiros, garçons de restaurante.20 Surgiram então pessoas que se destacaram. Exemplos
notáveis foram Francesco Matarazzo,
criador do maior complexo industrial da América Latina do início do século XX, tendo sido um dos marcos da modernização no Brasil
e Rodolfo Crespi, que construiu um dos maiores grupos
industriais do Brasil na mesma época. Desta forma, membros da comunidade
italiana passaram a compor a elite paulista. A maioria dos primeiros grandes
industriais de São Paulo vinham da colônia italiana.
Regiões de origem
Imigração
italiana para o Brasil (1876-1920)
|
||||
Região
de Origem
|
Número
de Imigrantes
|
Região
de Origem
|
Número
de Imigrantes
|
|
365.710
|
44.390
|
|||
166.080
|
40.336
|
|||
113.155
|
34.833
|
|||
105.973
|
25.074
|
|||
93.020
|
15.982
|
|||
81.056
|
11.818
|
|||
59.877
|
9.328
|
|||
52.888
|
6.113
|
|||
Total :
1.243.633
|
A imigração italiana no Brasil ficou marcada por ter vindo, sobretudo,
do Norte da Itália. A grande corrente migratória veio do Vêneto, no Nordeste italiano, região outrora com grandes
problemas nas zonas rurais. Foi notória, porém, a presença de pessoas originárias
do Centro e Sul da Itália, sobretudo no início do século XX, nas plantações de café paulistas.
Os italianos do Norte emigravam preferencialmente para outros países da
Europa. O Brasil e a Argentina foram os únicos países fora da Europa que
conseguiram atrair uma migração significativa oriunda do Norte da Itália. Os
italianos do Sul, por sua vez, preferiam a imigração transoceânica, sendo os
Estados Unidos o destino principal.
Os vênetos predominaram entre os imigrantes italianos no Brasil,
enquanto os toscanos eram os mais numerosos dentre aqueles oriundos do Centro
da Itália. Entre os do Sul, destacavam-se os campânios, seguidos dos calabreses
e abruzenhos. De fato, o Brasil recebeu imigrantes de quase todas as regiões da
Itália. Apenas quatro regiões não contribuíram com praticamente nenhuma
imigração para o Brasil: Liguria, Úmbria, Lacio e Sardenha.
As regiões de origem dos imigrantes variaram no decorrer do tempo. Entre
1878 e 1886, praticamente somente chegaram vênetos e lombardos e meridionais ao
Brasil. Entre 1887 e 1895 ficou nítida a predominância dos italianos do Norte.
A partir de 1893-95 cresceu a participação dos italianos do Sul, que passaram a
predominar a partir de 1898. O Brasil foi o destino principal da imigração
transoceânica dos habitantes da Emilia-Romagna e da Toscana, entre os anos de 1887 e 1902. Também recebeu 80% da
imigração transoceânica oriunda do Vêneto e Friul (mas apenas 20% da
sua imigração global).
Os vênetos eram pequenos proprietários de terra na Itália e viam na
imigração para o Brasil a possibilidade de se tornarem grandes fazendeiros. Os
imigrantes do Sul da Itália, por sua vez, eram braccianti, gente muito
pobre que trabalhava em terras alheias. Ademais, os vênetos são mais claros que
a maioria dos italianos e, em contrapartida, os meridionais são mais morenos. O
governo brasileiro incentivava a vinda de europeus para o Brasil, dentre outros
motivos, para "branquear" a população brasileira.
Os italianos que foram para o Brasil podem ser classificados em três
grupos distintos: os meridionais, os setentrionais e os pequenos proprietários
vênetos. Os meridionais vieram sobretudo das regiões de Campânia e da Calábria,
ao sul da Itália, e emigravam preferencialmente sem família. Privilegiavam as
ocupações urbanas (o que não quer dizer que não tenham, também, se dedicado à
agricultura). Os setentrionais provinham das regiões ao norte da Itália e eram
os trabalhadores braçais sem terra que foram trabalhar ao lado dos escravos e
ex-escravos nas plantações de café. Por fim, os proprietários vênetos foram
aqueles encaminhados para os núcleos coloniais no interior do Brasil.
Na época da grande imigração, havia uma notável diferenciação interna
entre o Norte e o Sul da Península Itálica. A Itália meridional continuava
agrária, atrasada e miserável, contrastando com algumas regiões do Norte, que
entravam num processo de desenvolvimento e industrialização. Tais diferenças
econômicas contribuíram para a formação de estereótipos negativos em relação
aos italianos do Sul, que eram vistos pelos do Norte como violentos, pouco
civilizados e ignorantes. Esses conflitos internos foram trazidos pelos
imigrantes para o Brasil, mas não se perpetuaram no tempo, pois os brasileiros
enxergavam todos como sendo italianos, sem fazer essas diferenciações o que,
com o tempo, contribuiu para enfraquecer esses sentimentos regionalistas.
Muitos fazendeiros brasileiros tinham uma inclinação em preferir
contratar imigrantes do Norte da Itália, pois estes tinham fama de serem mais
fáceis de lidar que os italianos do Sul, temidos por sua
"agressividade". Somado a isso, os setentrionais emigravam com a
intenção de adquirir terras e se tornarem pequenos agricultores, enquanto os
meridionais tinham grande aversão em servir os fazendeiros, evitando ao máximo
rumar para as zonas rurais. Mas as regiões de procedência dos imigrantes não
dependiam somente dos desejos dos fazendeiros, pois as áreas de expulsão
demográfica na Itália variaram no decorrer do tempo. Se, por um longo período,
o Vêneto foi a região italiana que mais forneceu imigrantes para o Brasil, no
final do século XIX já havia sido superado pela região de Campânia.
Os setentrionais
Os colonos italianos,
sobretudo os do norte da Itália, satisfazem melhor aos proprietários.
Contentam-se com pouco, são muito econômicos e mais fáceis de dirigir que os
colonos alemães, que parecem ter aversão pela cultura do café.
- Delden Laèrne, historiador.
O Vêneto constituiu, por um longo período, a região que mais expulsou
imigrantes em direção ao Brasil, principalmente no período entre 1887 e 1895.
Neste interregno de apenas oito anos, desembarcaram nos portos brasileiros
246.168 pessoas do Vêneto e do Friul, perfazendo 50% de todos os italianos que
lá chegaram.
Colonos
expõem seus produtos em Caxias do Sul.
As famílias vênetas eram constituídas, em média, de 12 a 15 pessoas, que
viviam em torno de um pequeno núcleo do qual eram proprietários ou trabalhavam
na forma de meeiros em terras de terceiros. Essencialmente agrícola, o Vêneto
era uma das regiões mais pobres e atrasadas de toda a Itália. Até 1885, os
vênetos que foram para o Brasil não eram camponeses destituídos de qualquer
capital, mas sobretudo viviam como meeiros, pequenos proprietários e
arrendatários. Só emigravam quando as suas propriedades já não ofereciam a
quantidade de gêneros suficientes à sua subsistência.
Os vênetos e os lombardos eram os preferidos dos fazendeiros
brasileiros, pois eram valorizados por sua parcimônia, frugalidade e
docilidade. Em alguns contratos de introdução de imigrantes, aqueles
provenientes da Sicília, da Romanha e das Marcas eram explicitamente excluídos,
pois eram considerados rebeldes. A historiadora Zuleika Alvim discorda dessa
teoria. Para ela, não foi o caráter "dócil e manso" dos vênetos que
impressionava os fazendeiros brasileiros, até porque os vênetos "não eram
tão dóceis assim". A região vêneta foi a fornecedora de mão de obra
predileta para as fazendas de café de São Paulo porque estava afundada numa
enorme crise, agravando a miséria dominante.
Os vênetos rumaram tanto para os núcleos coloniais do Sul do Brasil
quanto para as fazendas de café. A cidade não era o seu objetivo e, quando nela
terminavam, era por total falta de opção, quando a proletarização se mostrava a
única alternativa. Os setentrionais imigravam preferencialmente com a família,
trazendo esposa e filhos, o que demonstrava a sua intenção, a priori, de
se fixar em definitivo no Brasil.
Os meridionais
Saudades de Nápoles (1895). Pintura de Bertha Worms. A obra retrata um menino italiano engraxate, figura bastante comum nas ruas de São Paulo na
época.
Após 1895, a imigração setentrional, sobretudo a vêneta, caiu e foi
superada pela meridional. O Sul da Itália tinha características diferentes, uma
vez que apresentava resíduos de feudalismo, uma agricultura pobre, com técnicas rudimentares,
sem nenhuma mecanização. As terras, em geral, eram monopolizadas por grandes
proprietários rurais, divididas em pequenos pedaços, dificultando o sustento e
incentivando a emigração. No século XIX, a derrubada das áreas florestais no
Sul da Itália provocou uma brusca mudança climática. Com a erosão do solo, eram
frequentes as inundações e os deslizamentos. O período de seca durava
aproximadamente 6 meses, seguido de outro semestre com chuvas constantes. Em
decorrência da devastação ecológica, houve a propagação da malária nas terras baixas, empurrando a população para as
colinas altas, longe das planícies mais férteis. Isso obrigava o agricultor a
ter que se deslocar por longas distâncias diariamente, inibindo o sucesso das
pequenas propriedades.
As faltas de perspectivas econômicas empurravam muitas pessoas para o
mundo do crime. No período entre 1890 e 1897, época em que o nível salarial era
baixíssimo na Sicília, o banditismo tornou-se um meio de
vida para muitas pessoas. Muitos camponeses tinham que ir para o trabalho
carregando armas de fogo para se protegerem de eventuais ataques. Na Basilicata e na Calábria os bandidos eram, muitas vezes,
protegidos pela polícia e pelos senhores de terra, o que contribuiu para a
perpetuação do crime na região. Entre 1880 e 1886, a média anual de homicídios
na Calábria era de 33,6 homicídios por 100 mil habitantes. O banditismo
diminuiu na região graças à grande imigração de jovens do sexo masculino, os
mais propensos a cair no mundo do crime, para os países das Américas (o que
também propiciou a migração do banditismo italiano para as Américas, sobretudo
para Nova Iorque e Chicago e outras cidades menores
americanas, onde encontraram um ambiente propício à propagação das máfias). No Brasil, a atuação de criminosos italianos também
existiu, havendo uma predominância de meridionais envolvidos. Como exemplo,
pode ser citada a quadrilha de Francisco Mangano, que aterrorizou o município
de São Carlos, no interior de São Paulo, entre 1895 e 1897. A quadrilha,
formada por imigrantes calabreses, promovia assaltos a pessoas, bancos,
arrombamentos de casas e lojas, incêndios, tentativas de extorsão, roubos a
trens, entre outros. Porém, o envolvimento de italianos no mundo do crime no
Brasil foi excepcional, pois não havia um ambiente favorável à sua atuação, ao
contrário do que ocorreu em algumas cidades dos Estados Unidos, onde eles eram
inclusive mancomunados com a polícia e as elites locais.
A emigração meridional se concentrou nos países das Américas, sobretudo nos Estados Unidos, seguidos da Argentina e do Brasil. Em muitos casos, era mais barato
imigrar para o continente americano do que para outros países da Europa. Os
italianos do Sul se concentraram no estado de São Paulo. Predominava a
emigração de homens que partiam sozinhos, com a intenção de trabalhar
temporariamente no Brasil e retornar para a Itália. Os calabreses que emigravam
para o Brasil provinham sobretudo da província de Catanzaro.
Cerca de 70% eram homens, 80% eram adultos e somente 20% chegavam acompanhados
da família. A maioria exercia ocupações rurais na Calábria: pequenos
proprietários, trabalhadores rurais contratados ou diaristas.
Para os italianos do Sul, as zonas rurais remetiam à miséria e ao
desemprego que viviam na Itália. O sonho de se tornarem proprietários rurais,
tão presente entre os imigrantes vênetos que foram para o Brasil, não era
compartilhado pelos meridionais. Por isso, ao chegarem ao Brasil, evitavam ao
máximo ter que se empregar como trabalhadores rurais, preferindo rumar para as
cidades ou se empregar como camaradas nas fazendas de café, onde exerciam
serviços como de carreteiro e pedreiro. Nas ruas de São Paulo e de outros
centros urbanos, os meridionais se destacavam como comerciantes ambulantes,
engraxates, carregadores e cocheiros. Em São Paulo, um observador relatou a
presença de "numerosos moleques italianos, rotos e descalços, que vendem
os jornais da cidade e do Rio de Janeiro, importunando os transeuntes com suas
ofertas e seus gritos de malandrinhos da rua".
Os italianos nos estados brasileiros
Passaporte
raro de uma família de sardos que imigrou para o Brasil, em 1896, no Vapor
América, que atracaram no Porto do Rio de Janeiro, com destino ao Estado de
Minas Gerais - Família Scarpa: Giovanni Battista Scarpa, Maria Luigia Canu e
suas filhas, Antonietta Scarpa e Maria Scarpa, provenientes da cidade de Tissi,
Província de Sassari, Sardenha.
Destinos principais da imigração
Apenas seis estados brasileiros concentraram a quase totalidade da
imigração italiana no Brasil. Eles foram, em ordem de importância, São Paulo,
Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina e Paraná. O
estado de São Paulo foi, de longe, aquele que mais recebeu imigrantes no
Brasil. Dos cerca de 1,5 milhão de italianos que imigraram para o Brasil entre
os anos de 1875 e 1935, 1,2 milhão deles foram para São Paulo, 100 mil para o
Rio Grande do Sul, 60 mil para Minas Gerais, 25 mil para o Espírito Santo, 25
mil para Santa Catarina e 20 mil para o Paraná.
São Paulo e Minas Gerais tiveram uma política imigratória muito
semelhante: atrair italianos para substituírem os escravos como mão de obra nas
fazendas de café. Os outros estados, por outro lado, atraíam imigrantes visando
convertê-los em pequenos proprietários agrícolas.
O estado do Rio de Janeiro e, sobretudo, a sua capital, também foi um
destino relevante de imigrantes italianos. Mas estes vinham, sobretudo após o
ano de 1900, não diretamente da Itália, mas de outros estados brasileiros,
atraídos pelas oportunidades de empregos urbanos.
Para as outras regiões do Brasil, a imigração italiana foi bastante
exígua. Foram feitas tentativas de colonização italiana tanto no Norte como no
Nordeste do Brasil, mas todas fracassaram e não tiveram continuidade.
Rio Grande do Sul
Parte da
réplica da antiga Caxias do Sul, no parque de exposições da Festa da Uva, em Caxias do Sul, Brasil.
O estado do Rio Grande do Sul recebeu
a primeira leva de imigrantes italianos a chegar ao Brasil. Os primeiros
imigrantes desembarcaram em 1875, para substituírem os colonos alemães que, a
cada ano, chegavam em menor quantidade. Os colonos italianos foram atraídos
para a região para trabalharem como pequenos agricultores e lhes foram
reservadas terras selvagens na encosta da Serra Gaúcha.
Na região foram criadas as primeiras três colônias italianas: Conde
D’Eu, Dona Isabel e Campo dos Bugres, atualmente as cidades de Garibaldi, Bento Gonçalves
e Caxias do Sul, respectivamente. Com o tempo, os italianos
passaram a subir as serras e a colonizá-las. Com o esgotamento de terras na
região, esses colonos passaram a migrar para várias regiões do Rio Grande. A
base da economia na região italiana do Rio Grande foi, e continua a ser, a vinicultura.
No centro do estado foi criada a Quarta Colônia
de Imigração Italiana, o primeiro reduto de italianos fora da Serra
Gaúcha e que originou municípios como Silveira Martins, Ivorá, Nova Palma,Faxinal do Soturno, Dona Francisca e São João do Polêsine.
Nesse último, está a localidade de Vale Vêneto, nome dado para fazer homenagem a tal região italiana.
Outras colônias italianas foram criadas e deram origens a cidades como
Caxias do Sul, Farroupilha, Bento Gonçalves, Garibaldi, Flores da Cunha, Antônio Prado, Veranópolis, Nova Prata, Encantado, Nova Bréscia, Coqueiro Baixo, Guaporé, Lagoa Vermelha, Soledade, Cruz Alta, Jaguari, Santiago, São Sepé, Caçapava do Sul e Cachoeira do Sul. Essas são as principais colônias italianas
do estado. Estima-se que imigraram para o Rio Grande 100 mil italianos, entre
1875 e 1910. Em 1900, já viviam no estado 300 mil italianos e descendentes.
A língua italiana também é
de ensino obrigatório nas escolas de Antônio Prado.
Santa Catarina
Casa de
pedra em Nova Veneza, marco
da colonização italiana.
Cerca de 95% dos italianos que chegaram ao estado de Santa Catarina eram
do norte da Itália, dos atuais estados do Vêneto, Lombardia, Friul-Veneza Júlia e Trentino-Alto Ádige.
Porém, os primeiros imigrantes italianos que chegaram ao estado, em 1836, eram
oriundos da Sardenha, fundando a colônia de Nova Itália (atual São João Batista).33 Esses imigrantes pioneiros chegaram em número
reduzido e pouco influenciaram na demografia do estado. Foi mais tarde, a
partir de 1875, que passou a ser assentado no estado número maior de imigrantes
italianos. Foram criadas, assim, as primeiras colônias italianas do estado: Rio dos Cedros, Rodeio, Ascurra e Apiúna, todas estas no entorno da colônia alemã de Blumenau, servindo assim, os italianos, como a ponta de lança
deste núcleo germânico. Neste mesmo ano, imigrantes do Tirol Italiano fundaram Nova Trento, e em 1876 foi fundado Porto Franco (hoje Botuverá). Os italianos instalados nestas primeiras colônias
provinham majoritariamente da Lombardia e do Tirol Italiano, o qual
pertencia na época à Áustria.
Diversas outras colônias foram criadas nos anos seguintes, sendo o sul
de Santa Catarina o principal foco de colonização italiana do estado. Nesta
região foram fundadas Azambuja em 1877, Urussanga em 1878, Criciúma em 1880, a colônia mista de Grão-Pará em 1882, o núcleo Presidente Rocha (hoje Treze de Maio) em 1887, os núcleos de Nova Veneza, Nova Belluno (hoje Siderópolis) e Nova Treviso (hoje Treviso) em 1891, e Acioli de Vasconcelos (hoje Cocal do Sul) em 1892. No sul do estado os imigrantes
provinham principalmente do Vêneto, e, em menor número, da Lombardia e de Friul-Veneza Júlia. Os
imigrantes se dedicaram principalmente ao desenvolvimento da Agricultura e à
mineração do carvão, sendo eles imprescindíveis na formação desta região. Os
eventos que mais caracterizam essa colonização no sul do estado são as festas
típicas, como a festa do vinho e o Ritorno
alle origine, ambos no município de Urussanga.
A chegada de Italianos ao estado terminou em 1895, quando um número já
reduzido de colonos chegaram para colonizar a comunidade de Rio Jordão, no sul
do estado. Principalmente pela guerra civil que estourou no país com a
Revolução federalista e pelo contrato da república que deixava a imigração
subsidiada a cargo dos estados, os italianos pararam de adentrar aos portos
catarinenses.
A partir de 1910, milhares de gaúchos migraram para Santa Catarina, entre eles, milhares de
descendentes de italianos. Esses colonos ítalo-brasileiros
colonizaram grande parte do Oeste catarinense.
Muito da cultura ainda é preservada nos antigos focos de colonização,
principalmente na culinária, e na linguagem.
Paraná
Igreja
Matriz Nossa Senhora do Rosário, em Colombo, Paraná. Obra iniciada em 1898,
em estilo romano, sendo uma cópia fiel das igrejas italianas.
Os primeiros italianos a imigrar para o Paraná foram os vênetos, a partir de 1875,
alocados em colônias próximas à Paranaguá, nas regiões de Morretes e Antonina. A Colônia Alexandra e
posteriormente a Colônia Nova Itália tiveram vários problemas, sendo que
seus moradores foram posteriormente remanejados para regiões mais próximas da
capital.
Em 1900, viviam no estado do Paraná mais de trinta mil italianos, espalhados por catorze
colônias etnicamente italianas e outras vinte mistas. No início, a maior parte
dos imigrantes trabalhou como colonos autônomos porém, com o desenvolvimento do
café, passaram a compor a mão-de-obra da região. As maiores
colônias prosperaram na Região Metropolitana de Curitiba, sendo o município de Colombo (localizado na Grande Curitiba) a maior colônia italiana do Paraná. A Colônia
Alfredo Chaves (que posteriormente se tornaria a cidade de Colombo) foi uma
das quatro onde se concentraram os primeiros italianos que chegaram ao estado.
As outras são a Senador Dantas (que deu origem ao bairro curitibano Água
Verde), a Santa Felicidade
(atual pólo gastronômico da capital paranaense) e a Colônia de Santa Maria do Tirol,
localizada no município de Piraquara (na Grande Curitiba). A
influência italiana se faz presente em todas as regiões do estado (como no norte do estado,
com o vocábulo terra roxa, oriundo da
confusão da língua italiana para a cor vermelha - "terra rossa").
Em Curitiba chegaram a partir de 1872,
estabelecendo-se como agricultores em vários núcleos coloniais da região, que
posteriormente deram origem aos atuais bairros de Pilarzinho, Água Verde, Umbará e Santa Felicidade (tradicional bairro de cultura e gastronomia
italiana da capital paranaense), por exemplo. Com o passar do tempo adotaram
outras atividades, incluindo industriais e comerciais.
Fato inédito no Brasil, a Colônia Cecília foi a
primeira experiência anarquista no país; fundada em 1890
no atual município de Palmeira por um grupo de
libertários mobilizados pelo italiano Giovanni Rossi, os colonos plantaram mais de oitenta alqueires
de terra - em área que lhes fora cedida pelo Imperador Pedro II, pouco antes da proclamação da República
- e construíram mais de dez quilômetros de estrada, numa época na qual
inexistiam máquinas, tratores ou guindastes de transporte de terras. Nos quatro
anos de existência da colônia, sua população chegou a atingir cerca de 250
pessoas. O experimento da Colônia Cecília terminou por vários motivos, tanto
econômicos como sócio-culturais.
Outras cidades receberam imigrantes italianos: além de municípios da Microrregião de Paranaguá
(na Serra do Mar e litoral) e a capital, cidades da Grande Curitiba (como São José dos Pinhais, Araucária, Campo Largo, Piraquara, Cerro Azul e Colombo), assim como do interior receberam significativo
número de imigrantes.
São Paulo
Imigrantes
posando para fotografia no pátio central da Hospedaria dos Imigrantes,
ca. 1890.
Até 1920, o estado de São Paulo havia recebido aproximadamente 70% dos
imigrantes italianos que vieram para o Brasil, representando 9% da sua
população total, pelo fato de as fazendas de café terem se concentrado nessa
região e de esse estado ter investido grande quantia de dinheiro subsidiando a
passagem dos imigrantes. Até o ano de 1920, deram entrada nesse estado
1.078.437 italianos.
São Paulo recebeu imigrantes de diversas regiões da Itália. Nos
registros paroquiais de São Carlos, cidade produtora de café no interior de São
Paulo, para o período compreendido entre 1880 e 1914, foi-se registrado que,
dentre os italianos que ali se casaram, 29% dos homens e 31% das mulheres eram
oriundos do Norte da Itália, sendo o Vêneto a região mais bem representada, com
20% dos homens e 22% das mulheres, seguido da Lombardia com 5% dos homens e 6% das
mulheres. Os italianos do Sul também eram bastante numerosos, correspondendo a
20% dos homens e 15% das mulheres de nacionalidade italiana. Calábria, com 7%
dos homens e 5% das mulheres e Campânia, com 6% dos homens e 5% das mulheres
eram as regiões sulistas que mais mandaram imigrantes para São Carlos.
Em São Paulo, assim como no resto do Brasil, havia a tendência dos
imigrantes do Norte da Itália rumarem para a zona rural, enquanto os do Sul
preferiam se dedicar às ocupações urbanas. Isso explica o fato de, na cidade de
São Paulo, os meridionais terem dominado bairros inteiros, como foi o caso do Bixiga,
do Brás e da Mooca, habitados especialmente por imigrantes
oriundos da Calábria e de Campânia.
Em 2013, viviam em São Paulo aproximadamente quinze milhões de italianos
e descendentes, representando cerca de 34% da população do estado.
Núcleos Coloniais
Embora pouco estudada, houve também em São Paulo, em menores proporções,
uma política de fixação dos imigrantes na terra, parecida com a ocorrida no
Sul, a partir da venda de lotes nos chamados Núcleos Coloniais. Alguns destes
núcleos que se destacaram na compra de lotes pelos italianos são os de São
Caetano (São Caetano do Sul), Quiririm (Taubaté), Barão de Jundiaí (Jundiaí),
Sabaúna (Mogi das Cruzes), Piaguí (Guaratinguetá), Cascalho (Cordeirópolis),
Canas (Canas), Pariquera-Açú (Pariquera-Açú), Antônio Prado (Ribeirão Preto),
entre outros.
O núcleo de São Caetano, na cidade de São Caetano do Sul, foi
instalado em 1877 numa antiga fazenda de beneditinos, próximo às linhas da
estrada de ferro Santos-Jundiaí. Foi formado, inicialmente, por 28 famílias da
região de Vitório-Vêneto.
O de Quiririm foi formado em 1890 por famílias do Vêneto em uma região
formada por várzeas, no município de Taubaté. Em 1892, de acordo com o relatório do engenheiro
Fernando Dupré ao secretário Jorge Tibiriçá, era composto por 424 pessoas,
sendo 69 famílias italianas, num total de 193 colonos. Os italianos se
dedicavam principalmente ao plantio do arroz nas várzeas, atividade que muitos
já exerciam na terra natal, também encorajados pelo governo como alternativa à
cultura do café, já em decadência no município. Na colônia funcionavam algumas
associações mantidas pela comunidade italiana da cidade, mas o núcleo também
contou com uma associação própria, a Societá Beneficente Unione de Quiririm,
organizada pelo colono Manoel Rho. Os colonos também formaram seu próprio clube
de futebol, o Quiririm Sport Club.
O núcleo de Canas foi o primeiro de caráter oficial no Vale do Paraíba,
à época localizado entre Lorena e Cachoeira. Formado em 1885
por 309 pessoas, sendo 112 italianos, dedicava-se à produção de cana-de-açúcar para
o Engenho Central de Lorena. Fica localizado, atualmente, no município de Canas.
Em Guaratinguetá, no ano de 1892, foi
implantado o núcleo do Piaguí, por iniciativa do então deputado Rodrigues Alves. Os primeiros colonos formavam 91 famílias,
sendo 33 italianas. Os colonos produziam, entre outras coisas, feijão, milho,
batata doce e cana-de-açúcar.
No sul do estado, em 1858, formou-se o núcleo de Pariquera-Açu, na cidade homônima. Embora de origem antiga,
esta colónia só passou a receber imigrantes de forma considerável a partir da
última década do século XIX. Segundo o Relatório da Secretaria de
Agricultura de São Paulo para o ano de 1900, o núcleo contava com 1.771
colonos, sendo 390 italianos. Eles se dedicavam ao plantio agrícola, sobretudo
de produtos como aguardente, milho, batata doce, batata inglesa e arroz.
Em Mogi das Cruzes, no ano de
1889, uma família de tiroleses formou o núcleo de Sabaúna. Em 1900, o núcleo já contava com 1.337 pessoas, sendo
os italianos, depois dos espanhóis, o segundo maior contingente de
estrangeiros, contabilizando 112 colonos. Assim como a maioria dos núcleos
coloniais, os colonos dedicavam-se a uma variedade de cultivos, como milho,
arroz e batata doce.
Embora os italianos fossem, em sua maioria, trabalhar nas fazendas de
café da cidade de Ribeirão Preto, houve a
implantação, em 1887, do núcleo Antônio Prado, o único na região. Mesmo tendo
durado pouco (em 1893, o núcleo foi emancipado, sendo incorporado ao
município), foi nele que se formaram alguns importantes bairros do município,
como o Ipiranga e os Campos Elísios. Os italianos eram metade dos colonos
requerendo seus lotes, sendo 96 de 183 pessoas. Dedicavam-se ao plantio de
milho, arroz, feijão e também criavam animais.
Na capital
O Edifício Itália, no centro de São Paulo, um dos símbolos
da imigração italiana na cidade.
Cidade de São Paulo
|
||
Ano
|
Italianos
|
Porcentagem da
população da cidade
|
5.717
|
13%
|
|
45.457
|
35%
|
|
75.000
|
31%
|
|
130.000
|
33%
|
|
187.540
|
37%
|
Ouve-se falar o italiano mais em São Paulo do que em Turim, em Milão e
em Nápoles, porque entre nós se falam os dialetos e em São Paulo todos os
dialetos se fundem sob o influxo dos vênetos e toscanos, que são em maioria (Gina Lombroso, viajante italiana
em São Paulo no início do século XX).
(...) a impressão de espanto de um mineiro ao conhecer São Paulo em
1902:' Os meus ouvidos e os meus olhos guardaram cenas inesquecivéis. Não sei
se a Itália o seria menos em São Paulo. No bonde, no teatro, na rua, na igreja,
fala-se mais o idioma de Dante que o de Camões. Os maiores e mais numerosos
comerciantes e industriais eram italianos'. Sousa Pinto, um jornalista
português que esteve na Cidade na mesma época, não conseguiu se fazer entender
por vários chocheiros de tílburi, todos falando dialetos peninsulares e
gesticulando à napolitana. Escritas em italiano eram também as tabuletas de
vários edifícios. 'Encontramo-nos a cogitar se por um estranho fenômeno de
letargia em vez de descer em São Paulo teríamos ido parar à Cidade de Vesúvio'
(...) (Ernani da Silva Bruno. História
e tradições da cidade de São Paulo).
Minas Gerais
Minas Gerais recebeu o terceiro maior fluxo de imigrantes
italianos que veio para o Brasil, atrás somente dos estados de São Paulo e do
Rio Grande do Sul. Cerca de 60 mil italianos se dirigiram para esse estado
durante o período da imigração. De forma bem semelhante ao estado de São Paulo,
os italianos também foram atraídos para Minas Gerais com o objetivo de aumentar
a força de trabalho nas lavouras de café. Mas os resultados da política de
imigração em Minas foram bem menos significativos, uma vez que o estado
obrigava os imigrantes e os próprios fazendeiros a pagarem parte da passagem de
navio, enquanto o estado de São Paulo cobria todos os gastos. Por fim, em 1898,
uma grave crise financeira atingiu o estado, que suspendeu a imigração
subsidiada.
Minas passou a incentivar a vinda de italianos sobretudo a partir do ano
de 1887. Todavia, foi só a partir de 1894 que o estado fez contratos que
aumentaram o fluxo de imigrantes. Em 1895, entraram no estado 6.422 italianos,
número que saltou para 18.999 em 1896, decrescendo para 17.303 em 1897. A
partir de então, o número de imigrantes chegando ao estado caiu drasticamente
(2.111 em 1898 e míseros 41 imigrantes em 1901).
Muitos aportavam no Rio de Janeiro, ficando hospedados na Hospedaria de
imigrantes da Ilha das Flores por alguns dias, mas já vinham
contratados pelo governo da província de Minas Gerais
e depois, com a República, estado de Minas Gerais.
Após seu registro na Ilha das Flores, embarcavam em trens que os levavam até Petrópolis e de lá seguiam até Juiz de Fora pela recém inaugurada Estrada União e Indústria.
Chegando em Juiz de Fora, hospedavam-se na Hospedaria Horta Barbosa,
a maior hospedaria do estado, que funcionava como ponto de acolhida dos
imigrantes. Tinha capacidade para 600 pessoas, mas era comum ficarem alojadas
cerca de quatro vezes esta capacidade, durante a "quarentena",
período que os imigrantes tinham para se organizar e se submeter aos controles
de saúde. Durante este período, existiam relatos de sujeira, promiscuidade e
falta de higiene. Lá aguardavam a chegada dos fazendeiros que faziam a seleção
dos braços mais fortes para trabalhar nas suas propriedades. A localização da
hospedaria era estratégica, já que Juiz de Fora era na época, o mais importante
centro de produção de café de Minas Gerais, além de estar muito próxima do Rio
de Janeiro.
Os italianos que foram para Minas provinham de várias regiões da
Península. Os registros de imigrantes que foram para o município de Leopoldina mostram que
eles provinham de quatorze regiões diferentes do norte, centro e sul da Itália.
Minas Gerais foi o único estado brasileiro que recebeu número significativo de
imigrantes da ilha da Sardenha, região italiana que pouco
contribuiu com a imigração para o Brasil. Isso foi resultado de uma persistente
propaganda para atrair imigrantes da Sardenha, embora a maioria tenha
regressado para a Itália no prazo de dois anos. Minas Gerais também foi uma
meta imigratória de muitos italianos da região da Emilia-Romagna, também fruto de uma propaganda agressiva que
se deu na região, visando atrair mão de obra para as lavouras de café mineiras,
sobretudo após a abolição da escravatura,
em 1888.
Entrada
de italianos em Minas Gerais
|
|||||||||
1894
|
1895
|
1896
|
1897
|
1898
|
1899
|
1900
|
1901
|
||
4.410
|
6.422
|
18.999
|
17.303
|
2.111
|
650
|
21
|
41
|
Rio de Janeiro
Ao contrário do que sucedeu no restante do Brasil, no Rio de Janeiro os imigrantes italianos eram majoritariamente
urbanos, trabalhando principalmente na indústria e no comércio. Em 1900 viviam no estado 35 mil italianos, a maioria
na própria cidade do Rio de Janeiro,
e o restante nas colheitas de café.
Atualmente, vivem no Rio de Janeiro 600 mil italianos e descendentes,
representando cerca de 4% da população do estado.
Os italianos que foram para o Rio de Janeiro se diferenciavam pois eram
sobretudo meridionais, oriundos especialmente das Províncias de Cosenza, Potenza e Salerno e, em número
menor, também de Nápoles, Caserta e Reggio Calábria.
Isto porque os italianos do Sul preferiam se dedicar às ocupações urbanas,
sendo que a então capital do Brasil oferecia uma série de profissões
alternativas.
Espírito Santo
O Espírito Santo abriga uma
das maiores colônias italianas do Brasil. Os imigrantes foram atraídos para o
Estado a fim de ocupar inicialmente a região das serras. Os imigrantes foram
obrigados a enfrentar a mata virgem e foram abandonados pelo governo à própria
sorte. A situação de miséria vivida por muitos colonos fez com que, em 1895, o
governo italiano proibisse a emigração de seus cidadãos para o Espírito Santo.
Regiões de
origem dos italianos entrados no Espírito Santo (1812-1900)
|
|
Região
|
Número de imigrantes
|
Vêneto
|
8.671
|
Lombardia
|
4.392
|
Trentino-Alto Adige
|
3.043
|
Emilia-Romanha
|
2.282
|
Piemonte
|
1.195
|
Friuli-Venezia Giulia
|
854
|
De outras regiões
|
1.686
|
Não consta
|
10.777
|
Total
|
32.900
|
No Espírito Santo foi-se usado o mesmo modelo de colonização do sul, mas
sem os mesmos resultados. Até 1891, não emigravam mais de 200 italianos
anualmente para esse estado. O fluxo cresceu nos anos seguintes, sendo
registrada a entrada de 476 italianos em 1892, número que saltou para 2.406 em
1893. Esses italianos vinham se empregar em obras públicas e, quando estas
foram terminando, alguns ficaram na capital, enquanto que a maioria se empregou
nas fazendas. A companhia de imigração La Veloce instituiu uma linha
direta Gênova-Vitória, com navio partindo mensalmente. Isso garantiu um fluxo
apreciável de imigrantes, tanto que em 1894 chegaram 3.215 italianos e, em
1895, mais 4.575 pessoas. Com esses imigrantes foi-se tentada a colonização da
região do Rio Doce, mas com resultados desastrosos. Deu-se um surto de cólera no sul do estado, o que fez o governo italiano
suspender temporariamente as operações de embarque em direção a Vitória, por
meio do decreto de 20 de julho de 1895. Em decorrência das dificuldades
financeiras do estado, a imigração no Espírito Santo praticamente acabou a
partir de 1896. O número de italianos no estado, estimados em 20 mil pessoas em
1895, ficou estagnado até a primeira década do século XX, vindo a cair
progressivamente a partir de então.
Entre 1812 e 1900, entraram no estado do Espírito Santo 43.929 imigrantes,
dos quais 32.900 eram italianos, ou seja, 75% do total. Após o ano de 1900,
pouquíssimos italianos ainda entraram no estado, somente 121 indivíduos. Cerca
de 93% dos imigrantes italianos que foram para o estado provinham de regiões do
Norte da Itália. Cerca de 40% eram provenientes da região do Vêneto, 20% da Lombardia, 14% do Trentino-Alto Adige, 10%
da Emília-Romanha, 5% do Piemonte, 4% do Friuli-Venezia Giulia, 2%
das Marcas e 2% de Abruzzo, 1% da Toscana e 1% de Campânia e outro porcento de outras regiões.
Do Vêneto, as províncias que mais mandaram imigrantes para o estado
foram Treviso (31%) e Verona (28%). Já os
imigrantes lombardos vieram de diversas províncias, mas sobretudo de Mântua (24%) e Cremona e Bérgamo com 20% cada. Por
outro lado, os colonos oriundos do Trentino-Alto Adige vieram quase que
exclusivamente da província de Trento (96,2%), em
especial das comunas de Levico Terme e frações (17,40%) e de Novaledo (11,78%). Os imigrantes vindos da Emília-Romanha
também provinham de diversas províncias, com destaque para Bolonha (24,10%), Módena (19,36%) e Parma (17,58%).
De maneira geral, as cinco províncias italianas que mais forneceram
imigrantes para o Espírito Santo foram: Trento (2.801 imigrantes), Treviso
(2.615), Verona (2.325), Vicenza (1.060) e Mântua
(1.033). 94,81% dos imigrantes embarcaram no porto de Gênova, no Norte da Itália; 4,51% no porto de Le Havre, na França, enquanto que o resto embarcou no
porto de Buenos Aires (Argentina), de Nápoles (Sul da Itália) e de Marselha (França). 68% dos imigrantes vieram diretamente da
Europa, 31% fizeram escala no porto do Rio de Janeiro e 1% veio de Buenos Aires.
Algumas fontes afirmam que 60% da população do Espírito Santo é formada
por descendentes de italianos. A historiadora Maria Cristina Dadalto critica
essa informação que, segundo ela, é um "mito". Não existe nenhuma
pesquisa que comprove esse dado, mas "uma profícua produção literária
produzida sobre a imigração italiana no estado ajudou a construir e a
fortalecer este mito".
Centro-Oeste do Brasil
Praticamente não houve imigração italiana para a região Centro-Oeste do Brasil.
A maior parte das pessoas de origem italiana da região são migrantes oriundos
do Sul do Brasil. A partir da década de 1970, a falta de oportunidades no interior do Sul
fez com que milhares de sulistas migrassem para o Centro-Oeste, em especial
para o Mato Grosso do Sul. Entre
esses migrantes, figuravam milhares de ítalo-brasileiros.
Atualmente, vivem na região Centro-Oeste 400 mil italianos e descendentes,
representando cerca de 4% da população da região.
Norte e Nordeste do Brasil
O Norte e o Nordeste do Brasil também tentaram atrair imigrantes
italianos, mas sem grande sucesso. Entre 1898 e 1902, foi publicada em Gênova
uma revista quinzenal, a L'Amazzonia, que tecia elogios sobre os estados
do Pará e do Amazonas, com o intuito de
persuadir italianos para lá imigrarem. Mas contra o Norte e Nordeste pesavam a
pobreza local e a dificuldade de adaptação dos imigrantes ao clima da região.
Mesmo assim, entre 1891 e 1899, foram feitas quatro tentativas de colonização
envolvendo camponeses italianos. A primeira, na Bahia, fracassou imediatamente
e a colônia, de imigrantes provenientes da Emília-Romagna e das Marcas, logo se
dissolveu. A outra tentativa, no estado de Pernambuco, também não deu frutos,
pois das 40 famílias italianas trazidas para a região de Suassuma, 38
solicitaram e foram transferidas para São Paulo às custas do governo federal,
alguns meses após a chegada. As duas famílias que restaram voltaram para a
Itália, em 1898.
O Piauí também tentou implantar um núcleo italiano, oferecendo
ao governo da Itália a possibilidade de fazer investimentos econômicos no
estado. Assim, em 1895, chegaram 40 famílias italianas mas, novamente, a
tentativa não deu certo, pois 28 famílias se negaram a se instalar nos lotes e
as outras 12 foram repatriadas em 1898. Nessa mesma época, na Paraíba, houve pequenos núcleos italianos esparsos que
desempenhavam atividades artesanais e comerciais em diversas cidades – além de João Pessoa e Campina Grande –, entre as quais Areia,
Mamanguape, Pilar, Bananeiras e Solânea. Boa parte desse núcleo preferiu se fixar de vez no
estado, onde tiveram uma influência socioeconômica bastante relevante.
O estado do Pará foi aquele que mais insistentemente tentou implantar
núcleos italianos no seu território. A primeira tentativa data de 1899 e o
estado oferecia aos imigrantes terra de 25 hectares, ferramentas, salários
durante três dias da semana para desmatar a área, além de alimentação gratuita
nos primeiros seis meses. Porém, após alguns meses, das doze famílias
assentadas, nove desistiram. Outras duas tentativas foram feitas no mesmo ano
de 1899, sem nenhum sucesso. Não era apenas o clima quente da região que
acarretava no fracasso das colônias, mas o próprio despreparo dos italianos ao
terem que lidar com cultivos que desconheciam (algodão, fumo, açúcar, cacau),
produtos que só davam lucro quando produzidos em grande escala, com base num
comércio que já deveria estar anteriormente estabelecido. Por essas razões, a
imigração italiana para o Norte e Nordeste não foi agrícola, mas temporária,
espontânea e essencialmente urbana. Durante o auge da exploração da borracha no
final do século XIX, houve um certo fluxo de imigração italiana para a região
amazônica. A movimentação econômica atraiu um subproletariado italiano oriundo
sobretudo de outros estados brasileiros, que se dedicava principalmente ao
comércio ambulante ao longo do rio Amazonas ou se ocupava nos misteres urbanos (engraxate,
sapateiro, carregador etc).12
Em Pernambuco havia uma pequena comunidade italiana ao longo do litoral
ou na capital, dedicando-se a atividades urbanas. Eram quase todos meridionais,
das províncias de Cosenza, Potenza e Salerno. A Bahia
concentrava a maior comunidade italiana da região, principalmente do Sul da
Itália. Em 1884 não viviam mais que 200 ou 300 italianos na Bahia. Em 1908,
viviam em Salvador 500 italianos, quase todos de Laino Borgo, cidade da região da Calábria. No final do século XIX, em toda a Bahia viviam entre
2.500 e 3.000 italianos.
A imigração italiana do Nordeste teve um padrão, que pode
compreender quatro fases: a pré-colonial, a colonial, a imperial.
Na fase pré-colonial, o território nordestino era para os europeus
apenas uma massa de terra dentro do Brasil,
eles toleraram os povos indígenas da região e o que lhe eram de direito,
fazendo apenas o avistamento da costa, para num futuro próximo enganá-los
através do escambo e logo depois tentar escravizá-los. Nessa fase a
entrada de italianos no Nordeste já era considerada como
importante, devido à sua presença em várias expedições exploradoras, no que lhe
renderam experiências no Mediterrâneo, e acabando por ficar na Península Ibérica à
procura da oportunidade de participar de outras expedições marítimas, a fim de
achar riquezas e de aumentar os seus negócios, fazendo eles partirem para o Nordeste do Brasil. Entre
os navegadores, o mais famoso a pisar em terras nordestinas foi o florentino Américo Vespúcio, que por
suas cartas, acabou por dar seu nome para ao continente "descoberto"
por Cristóvão Colombo.
Na fase colonial, entre 1535 a 1822,
a atuação da imigração foi diferente, tendo em vista que os territórios já não
eram os mesmos, pois os portugueses para realizar totalmente a
conquista do país, se fixaram no território, colocaram a baixo as nações indígenas e reorganizaram o lugar em função de uma economia de
exportação de riquezas, nessa fase os indígenas já lutavam contra os franceses, ingleses e holandeses, que também queriam as terras. Assim os reis de Portugal e da Espanha (durante o domínio espanhol de Nápoles) criaram uma guerra contra os holandeses entre 1624 a 1654
(na época da Nova Holanda), utilizando, forças
militares italianas vinda de Nápoles. Ainda nessa fase foram numerosos
os sacerdotes italianos enviados ao país, para trabalharem no processo de evangelização dos povos indígenas. Dois jesuítas italianos, Andreoni e Benci, se destacaram por haver
escrito livros sobre o Brasil, no século XVIII.
Outros religiosos vindo para o Nordeste Brasileiro, são
os capuchinhos, que foram desbravadores dos sertões. Além dos religiosos e das
forças militares, muitos costureiros, alfaiates, sapateiros, funileiros, caldeireiros, mecânicos e etc, se fixaram tanto nas capitais como no
interior do Nordeste, a fim de trabalhar.
Na fase imperial, as coisas também foram diferentes, houve uma
preocupação com a ocupação de posições consideradas importantes para o governo
brasileiro e com o desejo de "embranquecer" a população. Por isto, o
governo passou a desenvolver uma política de colonização, com mais intensidade no sul
do país, não só com os italianos, como com outras nacionalidades
europeias. Eles se instalaram no país e passaram a se mobilizar por outras
províncias do Império.
Na fase do Brasil republicano, o Nordeste continuou a receber italianos, que vieram por causa do grande crescimento e da
modernização da agroindústria canavieira, do desenvolvimento da indústria
têxtil, do crescimento da cultura do cacau e do lançamento, no mercado externo,
de produtos extrativos.
Após a Segunda Guerra Mundial,
houve novas experiências, como a de implantação de uma colônia de agricultores
em Jaguaquara e Itiruçu, na Bahia, o que provocou modificações nos usos e
costumes dessas cidades.
Em 1837 chega à Bahia um grupo de 62 exilados políticos oriundos da
península italiana, que foram presos devido às agitações políticas que ocorriam
no período que antecedeu à unificação da Itália. Estes exilados
sensibilizaram-se e aderiram ao movimento revolucionário que ocorria em Salvador, a Sabinada. Alguns foram presos, outros retornaram para a Itália
e houve aqueles que mudaram para o Rio de Janeiro. Este envolvimento político
dos imigrantes fez com que uma nova leva de exilados, oriundos da região de Nápoles, fosse cancelada. Em 1950, alguns rumaram para Itiruçu, fundando a colônia Bateia.
O declínio da imigração italiana
Casa de
pedra e madeira do fim do século XIX em Caxias do Sul, influenciada pela arquitetura italiana
As contínuas notícias de trabalho semi-escravo e condições indignas nas
fazendas de café do Brasil fizeram com que a imigração de italianos para o
Brasil caísse, e se desviasse para os Estados Unidos e Argentina. Em 1902, a Itália aprova o Decreto Prinetti, proibindo a imigração subsidiada para o
Brasil, devido aos relatos de trabalho semi-escravo nas fazendas de café de São
Paulo.
A imigração italiana no Brasil continuou grande até a década de 1920,
quando o ditador Benito Mussolini, com seu
governo nacionalista, passou a controlar a emigração italiana. Após a Segunda Guerra Mundial e a
declaração de guerra do Brasil contra os países do eixo, a vinda
de italianos para o Brasil entrou em decadência. Paralelamente, o país recebeu
ajudas financeiras através do Plano Marshall, que obrigou a permanência de trabalhadores
para reconstruir a Itália.
No Brasil, com o excesso de mão de obra, o então presidente Getúlio Vargas aprova, através da promulgação da Constituição
Brasileira de 1934, a Lei de Cotas de Imigração, que dificultava a entrada de
estrangeiros no país (§s 6º e 7º do artigo 121 da Constituição de 1934), tendo
por finalidade "promover o amparo da produção", a "proteção
social do trabalhador brasileiro" e proteger os "interesses econômicos
do País". Limitava a entrada de imigrantes a "dois por cento sobre o
número total dos respectivos nacionais fixados no Brasil durante os últimos
cinquenta anos". Essa medida restritiva foi resultado de um debate da
Assembleia Nacional Constituinte e da repercussão provocada pelas emendas sobre
imigração e colonização. Não foi uma decisão direta do governo Vargas. Além
disso, a explosão de uma polêmica de caráter nacional alimentou a proliferação
de discursos que serviram de base para as medidas repressivas e restritivas
posteriores em relação às populações imigrantes. É preciso compreender o
significado da aprovação das cotas a partir dos personagens que comandaram essa
discussão nos debates parlamentares, o impacto que essas propostas provocaram
na imprensa e nas relações diplomáticas, e o contínuo empenho do governo Vargas
em lidar com a questão ao longo dos anos.
A Assembleia Nacional Constituinte foi instalada no final de 1933, e
diversos membros apresentaram emendas e propostas, manifestando suas posições
sobre as políticas relacionadas à imigração. Temas como trabalho e povoamento
suscitaram a elaboração de discursos e debates que abordavam desde a
miscigenação e a assimilação, até propostas de proteção ao trabalhador
nacional. Por ocasião da sessão de instalação da Assembleia, Getúlio Vargas
discursou a respeito dos assuntos que seriam tratados na elaboração da Carta
Magna. Essa fala inaugural já apresentava indícios das polêmicas que marcaram a
questão imigratória. Por um lado, Vargas defendia que o Brasil ainda constituía
um país de imigração devido à necessidade de povoar seu vasto território e pela
necessidade de braços “numerosos e adestrados” para o cultivo da terra. Por
outro lado, procurava ressaltar que a orientação dada à política imigratória
até então não poderia mais continuar, isto é, com a livre entrada de
imigrantes.
Pós-guerra:
entrada de italianos no Brasil
|
|
Ano
|
nº
de imigrantes
|
1945-1949
|
15.312
|
1950-1954
|
59.785
|
1955-1959
|
31.263
|
Total
|
106.360
|
Alguns anos antes, em dezembro de 1930, Vargas já havia assinado o
Decreto nº 19.482, limitando a entrada de imigrantes "não
qualificados" no país.
Nos quinze anos que se sucederam à II Guerra Mundial, entraram no Brasil 106.360 italianos,
encerrando assim o grande fenômeno migratório.
Língua
Hoje em dia, quase todos os ítalo-brasileiros falam o português como língua
materna. A maioria dos imigrantes italianos que vieram para o Brasil não sabiam
falar a língua italiana culta. O italiano padrão que hoje conhecemos
nada mais é que o dialeto toscano, que foi alçado à condição de língua oficial
da Itália. Este dialeto foi arbitrariamente escolhido como sendo o idioma
principal do Reino da Itália, devido ao prestígio cultural da Toscana e,
sobretudo, de Florença (da mesma maneira que o francês vem da língua falada em Paris).
A maioria dos imigrantes italianos chegaram ao Brasil na segunda metade do
século XIX, época em que o analfabetismo era dominante na Itália. A
maioria dos italianos (com a exceção óbvia dos toscanos) falavam exclusivamente
outras línguas e dialetos regionais. A língua italiana só se difundiu na Itália
a partir do século XX, com a alfabetização em massa da população, um processo
relativamente recente (até a década de 1950, a maioria da população italiana
ainda se comunicava em dialeto). Os imigrantes, quando tinham conhecimento da
língua italiana, se limitava a um "italiano popular", típico dos
estratos baixos da sociedade italiana, no qual mesclavam italiano com seu
dialeto regional.
Portanto, os imigrantes italianos trouxeram para o Brasil uma variedade
de dialetos, além do italiano popular de nível baixo que tinham conhecimento.
No novo ambiente, tiveram que absorver a língua portuguesa, pois era o instrumento
de comunicação com os brasileiros, sendo importante diferenciar se essa
aprendizagem ocorreu de forma controlada ou de forma passiva. No primeiro caso,
a inserção na nova sociedade e o bem-estar econômico aconteceram de forma
harmônica, conservando a cultura e a língua de origem. No segundo caso, a busca
por uma adaptação ao novo ambiente levou à uma alienação da pessoa, que queria
se inserir naquela sociedade considerada superior, acarretando numa negação do
dialeto e do italiano.
Muitas vezes, no primeiro contato com a língua portuguesa, os imigrantes
de primeira geração, em razão de fatores como a idade já avançada, casamentos
mononacionais ou baixo grau de socialização com os nativos, se contentavam com
um conhecimento apenas razoável do português, delegando aos filhos a função de
se tornarem falantes nativos. Esses filhos, frequentemente, eram educados em
dialeto ou no italiano popular, caso os pais falassem dialetos distintos. O
português, nestes casos, era a terceira língua a ser aprendida. É nesse
contexto que uma ou outra língua passou a ser usada, dependendo do ambiente e
com quem se estava falando, formando vários graus de bilinguismo. Um italiano
bilíngue usava o português para se comunicar com um brasileiro, mas usava o
italiano para se comunicar com seus conterrâneos bilíngues. A língua a ser
usada dependia, portanto, de quem fosse o interlocutor. Mas essa estrutura era ainda
mais complexa, pois dois falantes italianos poderiam alternar entre dialeto e
italiano com o português, podendo até mesmo misturar essas línguas dentro de
uma mesma frase.
O italiano (neste caso, os dialetos) influenciou o português do Brasil
nas regiões onde houve maior concentração de imigrantes, como foi o caso da
cidade de São Paulo ou do nordeste do Rio Grande do Sul. No caso de São Paulo,
a convivência entre o português e o italiano criou um "dialeto" com
peculiaridades que o distingue dos outros falares brasileiros. O português
falado em São Paulo é "muito mais aberto e menos nasalizado em confronto
com o português do Rio de Janeiro, por exemplo".Na cidade de São Paulo, a diversidade dos falares dos imigrantes
resultou numa maneira de falar bastante peculiar, que se difere
substancialmente do falar caipira, que
predominava na região antes da chegada dos italianos e é ainda generalizado no
interior do estado. O novo falar se forjou da mescla do calabrês, do napolitano, do vêneto, do português e ainda com o
caipira. Atualmente, a influência italiana no português falado em São Paulo não
é tão grande quanto no passado, embora o sotaque paulistano continue marcado
pelo dialeto ítalo-brasileiro que predominava na cidade no início do século XX. É de se notar que a influência italiana no falar
paulistano se generalizou bastante, ao ponto de englobar os habitantes da
cidade que nem ao menos possuíam ascendência italiana.
A interferência do italiano também foi detectada em falantes de Chapecó, em Santa Catarina. Os encontros vocálicos nasalizados de finais
de palavra são substituídos, como a palavra "mão" sendo pronunciada
[mon], a lateralização de /l/ em palavras como [sal], que no português do
Brasil se pronuncia [saw] e na troca da vibrante múltipla pela simples em
contextos intervocálicos, como "carro" sendo pronunciado [karo]. Em
muitos casos, os falantes nem ao menos sabiam falar o dialeto italiano, mas a
interferência do italiano no português persistiu, pois as suas características
fonéticas foram passadas e ainda permanecem de geração em geração.
Na década de 1930, o governo brasileiro iniciou uma campanha de nacionalização
que restringiu o uso de idiomas estrangeiros. Na época da II Guerra Mundial, o italiano foi proibido de ser usado
publicamente. Todos deveriam falar em português, sabendo ou não esse idioma.
Isso causou um grande estigma na comunidade de origem italiana, principalmente
no nordeste do Rio Grande do Sul. Falar dialeto ou falar português com sotaque
italiano passou a ser motivo de vergonha e de chacota. Essas pessoas passaram a
ser estigmatizadas por "falarem errado", por serem "não
urbanas", "não cultas", "não instruídas", "não
brasileiras". Isso contribuiu bastante para que o idioma italiano fosse
pouco desenvolvido entre os descendentes de italianos. Mais recentemente, esse
estigma vem sendo superado.
Embora os imigrantes tenham vindo de diferentes partes da Itália, o
dialeto italiano que mais se difundiu no Brasil foi o vêneto, pois foi do
Vêneto que veio a maior corrente migratória italiana (principalmente no sul do
Brasil, onde eles foram a maioria). O dialeto talian
(com raiz no vêneto), é bastante difundido nas zonas vinícolas do Rio Grande do Sul. Nas zonas rurais marcadas pelo
bilinguismo, mesmo entre a população monolingue em português, o sotaque
italiano é bastante característico.
Dados estatísticos
Estrangeiros e
brasileiros naturalizados que falavam preferencialmente a língua-mãe (censo
de 1940)
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Nacionalidade
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Falam
preferencialmente a língua materna
|
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Japoneses
|
84,71%
|
||||
Alemães
|
57,72%
|
||||
Russos
|
52,78%
|
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Poloneses
|
47,75%
|
||||
Austríacos
|
42,18%
|
||||
Espanhóis
|
20,57%
|
||||
Italianos
|
16,19%
|
O censo de 1940 analisou as línguas faladas pela população brasileira e
a difusão dos falantes da "língua italiana" no Brasil (embora, na
maior parte dos casos, tratava-se de falantes de dialetos). Esta pesquisa
mostrou que, na década de 1940, a língua portuguesa já se impunha como o idioma
dominante nos lares das famílias de origem italiana no Brasil. De acordo com
esse censo, havia no país naquele ano 1 260 931 brasileiros nascidos
de pai italiano. Destes, somente 115 596 declararam que não falavam o
português habitualmente no lar, ou seja, apenas cerca de 10% dos filhos de pai
italiano nascidos no Brasil não falavam o português em casa. Situação bem
diferente foi verificada entre os alemães: dos 159 809 brasileiros
nascidos de pai alemão, 79 088, ou seja, a metade, declarou não falar o
português no lar. O censo de 1940 revelou que, embora a imigração alemã tenha
sido bem menos numerosa que a italiana, o idioma alemão era mais falado no
Brasil que o italiano. Naquele ano, 644 458 pessoas declararam que falavam
o alemão em casa, contra 458 054 que falavam o italiano. O Rio Grande do
Sul concentrava o maior número de falantes de "italiano" (sobretudo
dialetos) no Brasil. Mas, mesmo lá, embora a presença de imigrantes italianos
tenha sido mais numerosa e recente que a de alemães, os falantes de alemão eram
mais numerosos. No censo de 1940, 393 934 pessoas do Rio Grande do Sul
(11,86% da população do estado) declararam falar alemão como língua materna. Em
comparação, 295 995 apontaram o italiano (8,91% da população local). No
censo de 1950, o número de gaúchos que declararam falar o italiano caiu para
190 376. No estado de São Paulo, que concentrava a maior população
italiana do Brasil, no censo de 1940, apenas 28 910 italianos natos
disseram falar o italiano em casa (somente 13,6% de toda a população italiana
daquele estado).
Os dados mostram que, entre os imigrantes no Brasil, italianos e
espanhóis foram aqueles que mais rapidamente adotaram o português como língua,
e japoneses e alemães foram aqueles que mais resistiram. A assimilação
linguística, então, variava consideravelmente de um grupo ou nacionalidade para
outro, pesando a questão da identidade e da similaridade de idiomas. Ademais,
tinha influência a força do ambiente (nas regiões onde os imigrantes ficaram
reunidos em grupos isolados, a língua materna pode sobreviver por gerações,
enquanto que nas regiões onde houve maior fusão entre os imigrantes e os
brasileiros, a língua-mãe foi rapidamente suplantada pelo português).
Também segundo o censo de 1940, viviam no Brasil 285 124 pessoas
nascidas na Itália. Porém, mesmo entre os próprios imigrantes o português já
tinha uma hegemonia, pois somente 16% deles falavam preferencialmente o
"italiano" (comparado a 84,1% dos imigrantes japoneses que preferiam
utilizar a língua japonesa). A maioria dos falantes de "italiano" no
Brasil não eram os imigrantes, mas brasileiros natos, descendentes de italianos
de segunda e terceira geração, que preservaram os dialetos, concentrados nas colônias
do Rio Grande do Sul. Embora a comunidade italiana tenha se concentrado no
estado de São Paulo, o uso dos dialetos italianos não vingou nesse estado. Isto
porque, em São Paulo e em outros lugares do Brasil, havia o contato diário dos
imigrantes com a população brasileira, formando redes de amizade, havendo
interesses comuns e casamentos mistos. Nessas áreas a manutenção do falar
italiano foi menos forte e durável. Nas colônias, por outro lado, a resistência
à assimilação linguística foi mais forte, uma vez que ali foi possível que
certas nacionalidades ficassem isoladas ou relativamente independentes do resto
da população, sendo a assimilação bem mais lenta e gradual, permitindo a
manutenção do dialeto italiano por várias gerações. Assim, segundo o demógrafo
Giorgio Mortara, com base no censo de 1940, o italiano era falado
preferencialmente por 54,26% dos italianos natos que viviam no Rio Grande do
Sul, mas apenas por 12,90% dos que viviam em São Paulo.
O censo de 1950 mostrou que, dos 458 mil falantes de italiano no Brasil,
64,62% viviam no Rio Grande do Sul, 20,87% em Santa Catarina e 9,99% em São
Paulo, embora estivesse neste último estado a maior concentração demográfica de
descendentes de italianos.
Os censos mais recentes não analisaram a questão dos idiomas falados no
Brasil e os dados disponíveis são todos baseados em estimativas.
Pessoas que
usavam o italiano no lar, por gerações (censo de 1940)
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Gerações
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Número de
falantes
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Primeira (imigrantes)
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53.000
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||||
Segunda (filhos)
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120.000
|
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Terceira e seguintes (netos, bisnetos etc)
|
285.000
|
||||
Total
|
458.000
|
O talian
O talian é a segunda língua mais falada do Brasil, após o
português. O isolamento das colônias do sul permitiu a manutenção da fala
dialetal italiana, sobretudo vêneta, com destaque para o norte do Rio Grande do
Sul. Ali nasceu um koiné oriundo da convivência de diversos dialetos
italianos, mas com uma predominância vêneta que serviu como língua franca para
a comunicação dos falantes de diferentes formas dialetais. Para o Rio Grande do
Sul houve um fluxo majoritariamente vêneto e lombardo e, na primeira fase, que
durou de 1875 a 1910, os imigrantes preservaram seus dialetos regionais vênetos
e lombardos, além de falares minoritários trentinos e friulanos. O segundo
período inicia-se a partir de 1910, com a construção da estrada de ferro que
liga Caxias do Sul a Porto Alegre. O isolamento foi rompido, aliado ao
incremento comercial e industrial. Em consequência, os dialetos menos
representativos numericamente foram extintos, ao mesmo tempo que os dialetos
lombardos e vênetos se interinfluenciaram, com a predominância dos últimos,
surgindo uma fala comum, um koiné, chamado de talian.
Na década de 1930 e durante a II Guerra Mundial, a campanha de
nacionalização instituiu o aprendizado obrigatório do português e proibiu o uso
da fala dialetal italiana. Os italianos eram considerados a "quinta
coluna" e houve grande repressão policial nas colônias contra o uso do
dialeto. Pessoas foram presas e até espancadas pela polícia ao serem pegas
falando dialeto nas ruas. No mesmo período, formava-se um novo grupo de
descendentes de italianos, mais urbanos e enriquecidos, que menosprezavam o
dialeto e davam preferência ao português, enxergando o falante de talian como
um colono grosso e rural, inferiorizando-o socialmente. Todos esses fatores
levaram a criação de um estigma de ser falante de talian e os pais muitas vezes
optavam por não transmitir a língua a seus filhos, para evitar que estes fossem
estigmatizados ou motivo de chacota nas escolas por não falarem bem o português
ou por falá-lo com uma fonética italiana. O êxodo rural também contribuiu para
o declínio no uso da fala dialetal, pois nos centros urbanos a língua
portuguesa era dominante e as gerações nascidas no meio urbano não adquirem o
talian como língua materna.
O uso do dialeto vai se perdendo ao longo das gerações. A primeira e a
segunda gerações nascidas no Brasil costumam falar o dialeto, mas a partir da
terceira já começa a haver a perda gradual do uso, por meio do bilinguismo com
o português. Na quarta geração o dialeto é apenas uma memória familiar e na
quinta desaparece a memória também.
Atualmente, não se sabe quantas pessoas falam o talian no Brasil, mas há
quem estime em 500 mil o número de seus falantes. Nos últimos anos, os governos
regionais tem tentado revitalizar o dialeto. Em 2009, o talian foi reconhecido
como Patrimônio Histórico e Cultural do Rio Grande do Sul e o próprio estigma
de ser falante dessa língua vem dando lugar a um orgulho.
O talian absorveu, e continua a absorver, diversas influências da língua
portuguesa. Hoje, parte significativa do seu vocabulário tem origem no
português, se distanciando parcialmente do dialeto vêneto atualmente falado na
Itália. Todavia, apesar dos brasileirismos presentes no talian, ele é
ainda muito próximo ao dialeto vêneto usado na Itália, sendo ambas as
variedades linguísticas inteligíveis.
Exemplos da
influência do português no talian
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Palavra no
talian
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Palavra no
vêneto original
|
Palavra no
italiano padrão
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Palavra em
português
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Bolo
|
Torta
|
Torta, dolce
|
Bolo
|
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Caro, auto
|
Macchina, auto
|
Macchina, auto
|
Carro
|
||
Coraçon
|
Cor, core
|
Cuore
|
Coração
|
||
Galignero
|
Punaro ou punèr
|
Pollaio
|
Galinheiro
|
||
Garafa
|
Botiglia
|
Bottiglia
|
Garrafa
|
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Inton, alora
|
Alora
|
Allora
|
Então
|
||
Praia
|
Spiaia
|
Spiaggia
|
Praia
|
||
Sapatero, scarpèr
|
Caleghèr ou scaporlin
|
Calzolaio
|
Sapateiro
|
||
Sià, scià
|
Tè
|
Tè
|
Chá
|
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Simarón, Scimarón
|
-
|
-
|
Chimarrão
|
||
Sorasco, chorasco
|
-
|
-
|
Churrasco
|
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Verón
|
Istá
|
Estate
|
Verão
|
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Como non!
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Certo! Certamente! Sicuramente!
|
Certo! Certamente! Sicuramente!
|
Como não!
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Além de os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul possuírem o Talian
como patrimônio linguístico aprovado oficialmente no estado, e o município de Serafina Corrêa também ter oficializado o Talian no serviço
público, outros municípios do país oficializaram o ensino da língua italiana
propriamente dita nas escolas. São eles:
Municípios brasileiros que oficializaram o ensino
da língua italiana
Municípios em que o ensino da língua italiana é
obrigatório
Espírito Santo
Paraná
- Francisco Beltrão
- Rio Grande do Sul
- Antônio Prado
- Santa Catarina
Municípios em que o ensino da língua italiana é
facultativo em todas as escolas públicas
São Paulo
Municípios brasileiros que possuem língua
co-oficial talian (ou dialeto vêneto)
- Serafina Corrêa, RS
- Estados brasileiros em que o talian possui status de patrimônio linguístico
A influência italiana no Brasil e seus descendentes
Santuário
de Nossa Senhora de Caravaggio,
em Farroupilha.
A imigração italiana para o Brasil foi um dos maiores fenômenos
imigratórios já ocorridos. A medida que o número de imigrantes e seus
descendentes ia crescendo, o Brasil modificava os seus costumes, assim como os
imigrantes modificam os seus. É de notar que a influência italiana no Brasil
não ocorreu de forma uniforme: enquanto no Sul/Sudeste do País a comunidade
italiana era forte e, em certas localidades, chegaram a representar a maioria
da população, noutras regiões do País a presença italiana foi quase nula.
Das inúmeras contribuições dos italianos para o Brasil e à sua cultura,
destacam-se:
- Introdução de elementos tipicamente italianos no catolicismo de algumas regiões do Brasil (festas, santos de devoção, práticas religiosas).
- Diversos pratos que foram incorporados à alimentação brasileira, como o hábito de comer panetone no Natal e comer pizza e espaguete frequentemente (principalmente no Sudeste), além da popular polenta frita.
- O sotaque dos brasileiros (principalmente na cidade de São Paulo, o sotaque paulistano), na Serra gaúcha, no sul catarinense e no interior do Espírito Santo.
- A introdução de novas técnicas agrícolas (Minas Gerais, São Paulo e no Sul).
- A criação do time Palestra Itália em 1914 com o intuito de aproximar e unificar os imigrantes italianos que viviam na cidade de São Paulo. Mas por ocasião da segunda guerra mundial, o time foi forçado a mudar o seu nome para Sociedade Esportiva Palmeiras sob pena do clube perder todo o seu patrimônio físico. Isso por imposição da ditadura Vargas após declarar guerra contra a Itália, sendo criminalizado no Brasil qualquer manifestação cultural italiana.
A imigração italiana no Brasil também serviu de inspiração para várias
obras artísticas, televisivas e cinematográficas, como as telenovelas Terra Nostra e Esperança, e o filme O Quatrilho, que concorreu ao Oscar de melhor filme
estrangeiro.
Assimilação e identidade
Católico e latino, o imigrante italiano se assimilou no Brasil mais
facilmente que alemães e japoneses, por exemplo. O quase desaparecimento dos dialetos italianos no Brasil é um exemplo dessa rápida
assimilação.
É evidente, porém, as diferenças entre o grupo de italianos que se
concentrou em colônias (no Sul) e os trabalhadores do café (Sudeste). Nas
colônias, o imigrante se manteve por cerca de três gerações praticamente
isolado com outros italianos nas zonas rurais sulistas. No Sudeste do Brasil,
por outro lado, o italiano mais facilmente se integrava entre a população
local.
Ao longo das décadas, os italianos e seus descendentes passaram por três
etapas de identificação étnica no Brasil. No início, tinham uma identidade italiana
fraca, identificando-se mais com a sua região de origem na Itália. Com o passar
do tempo, foram transfigurando-se em italianos "genéricos",
abandonando ou amenizando o regionalismo. Por fim, a identidade italiana foi
sendo substituída pela brasileira, ficando cada vez mais débeis as ligações com
a Itália e a cultura italiana.
Os italianos que chegaram ao Brasil em finais do século XIX não traziam
uma identidade italiana definida. A Itália, enquanto Estado nacional, apenas se
unificou em 1870. Antes disso, a Península Itálica era um amontoado de pequenos
Estados independentes ou dominados por potências estrangeiras. A construção de
uma identidade italiana se deu bem mais tarde, num processo bastante custoso
com reflexos até os dias atuais. Não foi à toa que Camilo Benso, conde de Cavour,
um dos mentores da Unificação da Itália, afirmou: “Nós fizemos
a Itália: agora temos que fazer os italianos”. Eram "vênetos",
"calabreses", "sicilianos" ou "lombardos", antes
de serem "italianos". E, mesmo dentro desses grupos regionais, havia
diversas outras subdivisões.
Os imigrantes que partiam da Itália tinham como noção identitária de
pertencimento o seu vilarejo de nascimento e moradia. Falavam dialetos
distintos, veneravam santos diferentes, alimentavam-se e casavam-se
distintamente. Na Itália, existiam rivalidades entre as localidades e a
estranheza já começava dentro do navio, ao colocar em contato italianos de
diversas regiões que falavam dialetos variados, muitos dos quais
incompreensíveis entre si. Uma vez em solo brasileiro, os imigrantes tentavam
remarcar essas diferenças, criando redes de solidariedades calcadas no
regionalismo. Mesmo nas colônias mais homogêneas do sul do Brasil, onde quase
todos os imigrantes eram do Norte da Itália, as compras dos lotes
eram organizadas de forma que friulanos ficassem concentrados de um lado,
vênetos de outro, mantovanos de outro etc. A relação entre vênetos e friulanos,
em particular, não era das mais amistosas nas colônias sulistas, embora ambos
os grupos tenham vindo da mesma área do Norte da Itália. Em São Paulo, a
comunidade era muito mais heterogênea, vez que continha italianos do sul, do
centro e do norte da Itália. Os italianos do Norte, da então chamada "Alta
Itália", frequentemente olhavam com desdém os do Sul, região mais pobre da
Itália e com altas taxas de criminalidade, atribuindo-lhes estereótipos
negativos. No início do século XX, em São Carlos, no interior de São Paulo,
chamar alguém de "calabrês" era considerado um insulto, denotando que
o preconceito que os italianos do Norte tinham contra os da Calábria e de outras regiões do Sul foi transportado para o
Brasil.
A noção de ser italiano apenas surgiu mais tarde, após a imigração para
o Brasil, visando fazer uma diferenciação entre eles próprios, os
"italianos" e os "outros", os "brasileiros" ou
"negri" (o termo "negro" designava os brasileiros, nem
sempre com uma referência à cor da pele). Dessa forma, o sentimento de ser
italiano consolidou-se mais prematuramente nas comunidades italianas no
exterior do que na própria Itália, onde apenas se consolidaria anos mais tarde.
Da colônia para fora, os imigrantes eram "italianos" mas,
internamente, as divisões regionais ainda se perpetuaram. Os imigrantes
procuravam se agrupar com italianos que vinham da sua mesma região de origem na
Península.
Com a ascensão do fascismo na Itália, a busca por uma
"identidade italiana" (italianità) tornou-se uma questão
política, com a adesão de muitos italianos e descendentes ao fascismo. A Igreja
Católica teve papel fundamental na formação da identidade italiana, pois o
catolicismo e a italianidade estavam estreitamente ligados, pois nos espaços de
ensino e lazer as escolas religiosas e as festas a santos padroeiros sempre
tiveram grande destaque.
O Estado Novo (1937-1945),
comandado por Getúlio Vargas, iniciou
uma campanha de nacionalização
que afetou a vida dos italianos e seus descendentes. Depois, durante a II Guerra Mundial, quando o Brasil declarou guerra aos países
do eixo (Alemanha, Itália e Japão), as medidas se tornaram mais pesadas. Ser
italiano passou a ser sinônimo de "perigo". Os dialetos italianos
foram proibidos de ser falados publicamente, as associações italianas foram
fechadas, o comércio e residência de italianos foram invadidos, e bens de
imigrantes foram confiscados. Nas colônias italianas do sul, muitos
descendentes de italianos tiveram que esconder características que remetessem
às suas origens, alguns desenvolveram sentimento de vergonha, principalmente os
jovens que frequentavam escolas para aprender corretamente a língua portuguesa
e eliminar qualquer vestígio que denunciasse as suas origens. Ser colono passou
a ser algo negativo, associado ao "atrasado", "rude",
"da roça". Ser brasileiro passou a ser algo positivo, uma necessidade
de sobrevivência social e econômica. Porém, na intimidade, muitos descendentes
continuaram a falar seus dialetos, mantiveram suas formas tradicionais de
vestimenta e de alimentação, mas sempre receosos da ação policial que os
reprimia. A vontade de fazer a italianidade ser algo positivo continuava a
existir, e o "brasileiro" continuou a ser considerado o outro que
contrastava, por ser considerado menos trabalhador e religioso e sem os mesmos
compromissos em relação à família.
A partir da década de 1970, durante as
comemorações do centenário da imigração, assistiu-se a um movimento inverso. Se
antes as origens italianas eram, muitas vezes, motivo de vergonha, recriou-se a
italianidade, fazendo dela um atributo positivo. Muitos descendentes de
italianos, já bem posicionados socialmente, criaram um novo discurso acerca da
italianidade, positivando-a. Buscaram qualidades na saga dos imigrantes, no seu
pioneirismo empreendedor e civilizador, aliado a um "padrão moral
italiano", tido como trabalhador, religioso, focado na família. Desde
então, proliferaram a criação de circolos italianos que passaram a
agregar a comunidade de origem italiana, recriando a própria visão dos
descendentes de si mesmos. Os aspectos negativos, se uma vez existiram,
passaram a ser omitidos ou reinterpretados sob uma nova ótica social.
Segundo Angelo Trento, de maneira geral, os italianos não tiveram
grandes problemas em se assimilar no Brasil. Segundo ele, com a exceção de
alguns casos isolados de atritos entre italianos e brasileiros, houve uma
rapidez na assimilação dos italianos em relação ao novo ambiente, aliada à
facilidade com a qual os brasileiros acolheram e fizeram próprios alguns
hábitos e costumes trazidos pelos imigrantes. Outros autores, contudo, mostram
que integração do italiano no Brasil não foi tão pacífica. Essa assimilação
aconteceu mais rápido em São Paulo do que nos estados sulinos, devido ao
isolamento característico das colônias que predominaram no sul, permitindo a
manutenção de grupos homogêneos e de uma estrutura patriarcal que dava
preferência aos casamentos entre italianos. A elite brasileira, embora
considerasse o imigrante europeu superior, tendia a relacionar-se entre si e
admitia estrangeiro com hesitação, quando este tinha acumulado alguma fortuna
ou títulos de distinção que lhe proporcionara prestígio. Samuel H. Lowrie
estimou que 40% da elite de São Paulo tenha se misturado com imigrantes no
decorrer de três gerações, o que mostra que a infiltração do elemento estrangeiro
na elite paulista não foi nada desprezível. Nas classes baixas brasileiras,
onde não havia barreiras econômicas impedindo a convivência, a infiltração do
elemento estrangeiro foi, por consequência, bem mais intensa.
Contrastavam o jus sanguinis italiano e o jus soli brasileiro. Os filhos de italianos tinham, portanto,
uma dupla nacionalidade mas, vivendo e trabalhando no país em que haviam
nascido, acabavam privilegiando a nacionalidade que era sentida como única e
verdadeira. Esse rápido processo de assimilação, todavia, não significou a
perda automática da identidade italiana, que ainda continuava a se manifestar
de diversas maneiras, seja na língua, na religião ou na culinária.
Conflitos étnicos
Em São Paulo
Em sua obra publicada na década de 1970, Angelo Trento sustentava que,
com a exceção de alguns conflitos pontuais, os brasileiros receberam os
imigrantes italianos de braços abertos. Estudos mais recentes, contudo, refutam
essa ideia. A década de 1890 foi o período em que mais entraram imigrantes
italianos no Brasil e a imigração representou uma verdadeira
"avalanche". Em poucos anos, em muitos municípios de São Paulo os
estrangeiros já eram mais numerosos que os próprios brasileiros. Essa mudança
demográfica não aconteceu de forma pacífica, vez que as elites locais
costumavam culpar os italianos pelo aumento da criminalidade e da desordem nas
cidades. Os nacionalistas, representados pelo jacobinos, viam a chegada dessa massa de estrangeiros como uma
ameaça à soberania nacional. O povo brasileiro, por sua vez, se incomodava com
a presença estrangeira, vendo os italianos como concorrentes no mercado de
trabalho.
Representação
do ataque dos brasileiros ao teatro São José, que resultou na morte de dez
italianos e em 48 feridos.
Em suas memórias, publicadas em 1997, Andrea Pozzobon, que imigrou para
o Brasil em 1885, escreveu que ele e outros imigrantes, ao desembarcarem no
porto de Santos, foram recebidos de forma humilhante pelos brasileiros:
"(...)continuamente a ‘negrada’ nos apupava com os pouco honrosos nomes
de carcamanos, gringos, ladrões, filhos da... e outras boas companhias".Em
sua tese de mestrado, Rovina Melina Roberto mostrou que a interação entre
italianos e brasileiros foi bastante conflituosa, especialmente na década de
1890. Embora a insatisfação quanto à presença de estrangeiros no país existisse
desde o início da imigração, a situação piorou com os incidentes de Santos, de
1892. Em 13 de junho deste ano, após desentendimentos com a polícia, o capitão
do navio italiano Pietro-Ten foi preso e supostamente mal-tratado no
cárcere, vindo a falecer. Em 20 de junho, também em Santos, houve uma briga
entre a tripulação italiana do vapor Mentana e a guarda brasileira.
Estes incidentes causaram revolta na colônia italiana, alimentados por versões
diferentes dos fatos contadas pela imprensa brasileira e pelos jornais da
colônia italiana, cada parte imputando a culpa para o outro. Se, por um lado,
os jornais da colônia e o próprio cônsul italiano instigavam os italianos a se
revoltarem, por outro lado os jornais brasileiros e os republicanos jacobinos escancaravam a sua aversão aos estrangeiros.
A situação se agravou com a "Questão dos Protocolos
Ítalo-Brasileiros", quando o governo da Itália passou a pressionar o
Brasil para que este indenizasse os imigrantes italianos pelos danos sofridos
durante a Revolução Federalista e
outros movimentos armados. Isto causou revolta e protestos entre os
brasileiros, que se opunham à aprovação dessa indenização. Os protocolos foram
assinados em dezembro de 1895 e fevereiro de 1896 porém, devido à agitação
popular, só foram ratificados em dezembro deste ano, sendo sancionados pelo
Congresso brasileiro, liberando o pagamento das indenizações. Os referidos
incidentes desencadearam em confrontos nas ruas entre brasileiros e italianos,
com bandeiras da Itália sendo queimadas, tiros disparados, casas invadidas e
transeuntes agredidos. Em agosto de 1896, a Itália chegou a considerar o envio
da esquadra militar Atlântico e iniciar um conflito armado contra o
Brasil, o que não veio a acontecer, embora ambos os países tenham rompido
relações diplomáticas. Nesses anos de tensões, os republicanos jacobinos
tiveram papel fundamental no fomento do sentimento anti-italiano, vez que eram
nativistas e viam os estrangeiros como inimigos da pátria e do trabalhador
nacional. No Rio de Janeiro, os imigrantes portugueses
eram o principal alvo da ira dos jacobinos, enquanto que em São Paulo, por ser
o grupo mais numeroso, o ódio recaía sobre os italianos, embora também
atingisse qualquer outro estrangeiro. Em São Paulo, o grupo dos jacobinos era
composto por militares, advogados e profissionais de todo o gênero, inclusive
ex-escravos.
Havia uma dualidade de visões no Brasil. Enquanto o governo brasileiro,
sobretudo a classe política proprietária de fazendas de café, vendia a ideia de
que era necessário usar o dinheiro público para atrair imigrantes europeus,
considerados melhores que os trabalhadores nacionais, inclusive racialmente,
muitos brasileiros não percebiam a necessidade disso. Mesmo em momentos de
crise, em que faltava emprego para os brasileiros, assistia-se à entrada maciça
de imigrantes, estimulada pelo próprio governo do Brasil. Tal fato criou
ressentimentos e incentivou a ação nativista violenta contra os imigrantes
italianos em São Paulo, que eram vistos pelos brasileiros como competidores no
mercado de trabalho.
O sentimento anti-italiano era menos evidente na zona rural, vez que as
áreas agrícolas eram enormes e era fácil encontrar emprego. Contudo, nas
cidades, a competição se mostrava mais acirrada e a antipatia aos italianos e a
todos os estrangeiros se refletiam em
manifestações violentas contra a sua presença. As pesquisas mostram que, de
fato, a chegada de tantos imigrantes empurrou o trabalhador brasileiro para as
profissões menos desejáveis e rentáveis, tanto na zona urbana quanto na rural,
enquanto os imigrantes foram, paulatinamente, ocupando diversas categorias
profissionais. A imigração em massa foi particularmente prejudicial para os negros, que não conseguiam mais negociar com os empregadores,
limitando o crescimento do seu salário. Na cidade de São Paulo, em 1893, os
brasileiros se ocupavam sobretudo do trabalho doméstico e agrícola, ao passo
que todas as outras profissões já estavam dominadas por imigrantes, sobretudo
as artes (85,5% de estrangeiros), transportes e outros (81%), manufatura
(78,8%) e comércio (71,6%). A mesma pesquisa demográfica mostrou que já havia
uma marginalização territorial no espaço urbano de São Paulo em 1893, sendo que
os brasileiros, sobretudo os caboclos, negros e pardos,
estavam mais concentrados nos subúrbios, nas áreas periféricas e menos
industrializadas, enquanto os brancos, em sua maioria imigrantes,
concentravam-se nas áreas centrais.
O ano de 1896 representou o auge nos conflitos entre nacionais e
imigrantes, havendo uma verdadeira "caça aos italianos" na cidade de
São Paulo. As fontes relatam que os paulistas atacaram as casas dos imigrantes
durante todo o período de discussão dos Protocolos Ítalo-Brasileiros
(1892-1896). Em agosto de 1896, brasileiros exaltados invadiram o Teatro São
José no momento em que se apresentava uma companhia italiana, agredindo os
atores e os espectadores. Depois, rumaram para bairros habitados por italianos
em São Paulo, assim como para a redação do jornal da colônia italiana, Fanfulla,
com o objetivo de destruir tudo. Nesse conflito morreram 10 italianos e 48
ficaram feridos. Após 1897, a agressividade dos jacobinos contra imigrantes
enfraqueceu, ao mesmo tempo em que o discurso imigrantista passou a predominar,
já não havendo praticamente nenhuma voz política se opondo à presença do
imigrante italiano no Brasil. Em consequência, os anos em que houve oposição à
presença de imigrantes foram apagados da historiografia, na medida em que se
reconstruía a História sob a perspectiva assimilacionista e colocava o imigrante
italiano, em São Paulo, como aquele que teria trazido o progresso, o trabalho e
a civilização. A violência contra o italiano continuou a existir e a
receptividade da sociedade brasileira não melhorou, mas esses conflitos foram
silenciados por meio de um discurso político homogêneo.
Conflitos
com afro-brasileiros
A relação dos
imigrantes italianos com brasileiros negros (e com pardos, mulatos, mestiços
e caboclos)
foi ambígua. Embora há registros de uma convivência pautada na colaboração,
amizade e intimidade entre italianos e negros, também há comprovação histórica
de que haviam inúmeros conflitos e violência permeando essa relação
interracial. Com base num estudo histórico realizado em São Carlos (interior de São Paulo) constatou-se
que a violência física entre italianos e negros advinha, geralmente, de
conflitos simbólicos. De um lado, os negros queriam afirmar a sua igualdade
perante os italianos e, por outro lado, estes tentavam afirmar a sua
superioridade. Ao contrário do que muitas vezes se propagou, os negros não
abandonaram as plantações de café com a abolição da escravatura. No Estado de
São Paulo, a grande maioria permaneceu no meio rural, trabalhando como feitores
ou encarregados dos serviços na cafeicultura. Eventualmente os negros
brasileiros trabalharam lado a lado com os imigrantes. Em alguns casos, pretos
e mulatos tinham posição de autoridade sobre italianos, como administradores de
fazenda ou diretores de colonos, além do fato de que 20% dos soldados esquartelados
de São Carlos eram negros.
A maneira como os
fazendeiros tratavam os imigrantes remetia à condição escravista e, mesmo nos
centros urbanos, italianos recebiam tratamento parecido por parte da polícia,
que os espancava e roubava. Ao mesmo tempo, a ideologia racial predominante no
Brasil afirmava a superioridade racial dos europeus sobre os negros. Essa
ambiguidade levava a tensões, uma vez que os italianos, ao verem sua própria
condição tão próxima a dos negros, mesmo antes de aprender o discurso racial
brasileiro, sentiam a importância de manter as distinções de cor em relação aos
negros, mestiços e caboclos, com os quais não queriam se confundir. Os negros,
por outro lado, não admitiam ser subordinados ou rebaixados devido à sua cor de
pele. Era uma luta, portanto, pelo "capital simbólico", ou seja, o
capital de respeito ou importância social. Nos inquéritos policiais de São
Carlos, havia duas vezes mais negros sendo agredidos por brasileiros brancos do
que o inverso e quase três vezes mais negros sendo agredidos por italianos do
que o oposto. Os imigrantes italianos eram verdadeiros substituidores de
escravos e, ao perceberem que sua situação social estava "perigosamente"
perto da dos negros, os italianos sentiam as reivindicações por respeito e
igualdade no trato como ameaça à sua identidade e honra. Assim, as análises dos
inquéritos policiais de São Carlos sugeram que os italianos, ao verem como os
brasileiros brancos tratavam os pretos, mulatos e caboclos, aprenderam que
estes podiam ser ameaçados, agredidos ou mortos, caso ousassem contradizer,
desacatar ou desrespeitar os "brancos."
Esses conflitos,
opondo imigrantes italianos de um lado e pretos, mulatos e caboclos do outro,
fortaleceram a formação de uma "identidade branca", que contribuiu
para amenizar as fronteiras que existiam entre os próprios imigrantes europeus.
Os imigrantes italianos chegavam ao Brasil com resquícios do forte regionalismo
então existente na Itália, onde a identidade italiana ainda era bastante débil,
haja vista tratar-se a Itália de um Estado recém-unificado. As interações
sociais vividas no Brasil, todavia, acabaram diluindo e enfraquecendo o
regionalismo e fortalecendo a identidade italiana e branca. Segundo Denys
Cruche, "a construção das identidades se faz no interior de contextos
sociais, que determinam a posição do agente e por isso mesmo orientam suas
representações e escolhas". O fato de os brasileiros desconhecerem a
grande variação regional que existia na Itália, tratando todos os imigrantes
como meros "italianos", contribuiu para redefinir a identidade
italiana dessas pessoas. Assim, ao entrar em contato com outras nacionalidades
e criando fronteiras étnicas, o imigrante italiano reconstruiu a visão que tinha
de si mesmo, assumindo uma identidade nacional que nem ao menos possuía antes
do ato imigratório.
Na região sul
No sul do Brasil, os conflitos mais violentos envolveram imigrantes
italianos e os povos indígenas. Embora o
governo brasileiro afirmasse que estava trazendo imigrantes europeus para
ocupar "vazios demográficos", na verdade essas terras eram ocupadas
pelos índios. No sul de Santa Catarina, a medida que os italianos foram
ocupando a região e desmatando a vegetação, se depararam com os xoclengues, que da floresta retiravam seu sustento. Em
represália à invasão de suas terras, os índios passaram a atacar as colônias
italianas, fato que foi usado pelos imigrantes para criar a ideia de que os
índios eram incapazes de conviver com a civilização, justificando seu
aniquilamento. Em consequência, recorreram à figura do bugreiro, geralmente
brasileiros ou mesmo imigrantes mais destemidos que perseguiam os indígenas e
promoviam verdadeiras chacinas, a fim de garantir a posse da terra por parte
dos imigrantes. Os massacres também ocorreram no Rio Grande do Sul, mas lá os
índios eram da etnia kaingang.
A relação dos italianos com os brasileiros ou luso-brasileiros locais
também teve atritos, vez que os brasileiros muitas vezes achincalhavam ou mesmo
mal-tratavam os imigrantes, pois achavam que tinham mais direitos em virtude da
sua brasilidade. O imigrante Lorenzoni registrou que, em 1884, os imigrantes da
Colônia Dona Isabel eram hostilizados pelo diretor Júlio da Silva Oliveira, que
os chamava depreciativamente de "gringos". Lorenzoni chamava de
jacobinos "os poucos brasileiros, moradores na colônia, que só viam em
qualquer imigrante italiano um elemento de desordem e um parasita". A
aversão dos brasileiros do sul, sobretudo os pobres, em relação aos italianos
advinha do rancor pelo fato do governo brasileiro ter facilitado o acesso à
terra para os imigrantes, enquanto os nacionais permaneciam excluídos desse
processo ou eram expulsos da terra caso não possuíssem título de propriedade.
Os italianos que foram morar nas regiões sulinas ocupadas por imigrantes alemães
vivenciaram um choque cultural. Em Blumenau, fundada por alemães em 1850, os italianos começaram
a chegar 25 anos depois e eram, em sua maioria, do Tirol do Sul, região
de transição entre a Itália e os Estados de língua alemã. Portanto, as rixas,
que já existiam entre esses dois povos há vários séculos na Europa, foram
transportadas para o Brasil. Embora o fundador da cidade, o dr. Hermann Blumenau, pretendesse uma colônia formada apenas por
alemães, na década de 1870, cada vez menos imigrantes chegavam da Alemanha, o
que acarretou em falta de trabalhadores. Assim, mesmo a contragosto, o dr.
Blumenau decidiu atrair italianos para a sua colônia. Os atritos logo
apareceram, pois os italianos eram quase todos católicos, enquanto muitos dos
alemães de Blumenau eram luteranos. Além do mais, os italianos
foram assentados em lotes periféricos e montanhosos, enquanto os alemães
ocupavam as melhores terras. Em uma correspondência, o dr. Blumenau chamava os
italianos de "incorrigíveis vagabundos", enquanto em outra,
para o presidente da província, escreveu: "são especialmente a
malfadada imigração tyrolez e italiana, suas constantes travessuras, impertinentes
e exageradas exigências, ameaças e até delitos e crimes, que não nos deixam, e
especialmente a mim, descanso de espírito". O modo como os italianos
incorporavam o trabalho na vida cotidiana era muito diferente do modo alemão, o
que fazia com que eles fossem tachados de vagabundos e preguiçosos ou mesmo
bêbados, já que o hábito de tomar vinho foi substituído pela cachaça. Assim, os alemães culpavam os italianos pelo atraso
de todas as obras públicas da colônia.
A animosidade entre italianos e alemães se perpetuou no sul, com maior
ou menor intensidade, ao longo do tempo. Porém, com a política de
nacionalização de Getúlio Vargas durante a II Guerra Mundial, tanto italianos
como alemães foram vítimas da agressividade do exército brasileiro e obrigados
a falar português e a se assimilar na sociedade brasileira. Em consequência,
com a extinção progressiva das duas culturas, as rixas também foram sendo
esquecidas. Inclusive, desde as comemorações do centenário da imigração em
Blumenau, em 1975, os italianos foram colocados, ao lado dos alemães, como o
elemento "civilizador" da região, fazendo surgir a ideia de que as
cidades foram erguidas graças ao trabalho conjunto das duas etnias. Assim, os
conflitos do passado foram apagados ou pelo menos tornaram-se desconhecidos do
grande público.
No sul do Brasil as diferenças "étnicas" também foram
remarcadas como um elemento de diferenciação. Se durante a II Guerra Mundial ser italiano era algo negativo, após o
conflito houve uma reelaboração do conceito, apontando o italiano como o
"civilizador". A cultura assume um significado classificatório,
implicando a noção de superioridade e inferioridade, formando hierarquia de
etnias. Os pretos eram chamados de brasileiros, trazendo uma visão pejorativa e
racista em favor de uma superioridade italiana. Azevedo, em 1952, observou que,
em Caxias do Sul, havia uma linha de cor bastante nítida que
separava os "brancos" dos "morenos". Uma linha, embora mais
tênue, também separava os descendentes de italianos dos "brasileiros"
originários de outras partes do Rio Grande do Sul e descendentes de portugueses.
Para muitos descendentes de italianos, a reivindicação de uma identidade
"ítalo-gaúcha" atualmente os fazem acreditar que isso lhes agrega
valor e contribui para uma diferenciação social. "Ser ítalo-gaúcho é mais
valorizado do que ser simplesmente, brasileiro". O historiador Stanley
Fish denomina esse fenômeno de "multiculturalismo de boutique" e que,
segundo Stuart Hall, "celebra a diferença sem fazer diferença". A
ascendência italiana passa a ser tida como um diferencial, que permite o acesso
à cidadania italiana, trabalho no exterior, bolsas de estudos etc. Vitalina
Maria Frosi, num trabalho sobre o uso de dialetos italianos no Rio Grande do
Sul, afirma que "o uso da fala dialetal italiana é, muitas vezes,
artificial na boca de falantes urbanos". Para ela, muitas vezes o uso da
língua italiana, no sul do Brasil, não tem a função de comunicação e de
transmissão de cultura, pois assume a função "instrumental para demarcar
um espaço próprio, uma identidade cultural local, um perfil de determinado grupo
humano ítalo-brasileiro regional".
Casamentos e padrões de miscigenação
Pesquisas apontam que, no início da imigração, havia uma grande resistência
dos italianos de se casarem com brasileiros. Havia, inclusive, a tendência
nítida de italianos se casarem com imigrantes que vinham da sua mesma região de
origem na Itália. Analisando os casamentos de italianos no município de São Carlos, interior de
São Paulo, entre 1880 e 1899, os dados mostram que 80% dos homens e 91% das
mulheres oriundos do Norte da Itália se casaram com imigrantes oriundos da
mesma região italiana. 88% dos homens e 71% das mulheres oriundos do Sul da
Itália contraíram matrimônio com pessoas vindas daquela mesma região, enquanto
que 23% dos homens e 61% das mulheres do Centro da Itália se uniram a italianos
também vindos do Centro (as taxas de endogamia para os italianos do Centro foi
mais baixa pois o número de imigrantes oriundos daquela região era menor,
portanto tinham maior dificuldade de encontrar companheiros da mesma região, o
que os levava a casar com italianos de outras regiões). Os italianos mais
endogâmicos eram os vênetos: de 1880 a 1914, em São Carlos, 76,4% dos homens
vênetos se casaram com mulheres vênetas, enquanto que 65,3% das mulheres do Vêneto se uniram a homens daquela região. Em seguida vieram os
calabreses: 53,1% dos homens calabreses se uniram a mulheres calabresas,
enquanto que 77,3% das mulheres da Calábria casaram com homens daquela região. Os menos
endogâmicos eram os lombardos, pois estes acabavam se casando sobretudo com
vênetos, os mais numerosos naquela região. Isto mostra que os imigrantes
italianos tinham uma alta taxa de endogamia, preferindo casar com outros italianos, inclusive
optando por se unir a italianos que provinham da sua mesma região de origem na
Itália. A Itália era um Estado recém-unificado, e os italianos não tinham uma
consciência nacional definida, e o que imperava na época era o regionalismo.
Essa mentalidade foi trazida para o Brasil pelos imigrantes, influenciando seus
padrões de casamento. Conflitos, animosidades e preconceitos entre italianos de
diferentes regiões foram igualmente transportados e vivenciados pelos italianos
no Brasil. Com o passar do tempo, porém, essa perspectiva regionalista foi
sendo suavizada pois, uma vez no Brasil, italianos de diferentes regiões eram
tratados pelos brasileiros como sendo iguais, pois essas diferenças regionais
eram desconhecidas pelos brasileiros. O contato com a sociedade brasileira fez
crescer não apenas as taxas de casamento entre italianos de diferentes regiões,
mas a própria união entre italianos e brasileiros ou com imigrantes não
italianos.
A partir de 1910 verifica-se uma mudança no quadro, pois aumenta o
número de casamentos entre italianos e brasileiras. Mas essa mudança deve ser
analisada com cautela, pois na maior parte dos casos a cônjuge definida como
"brasileira" era filha de italianos. Qualquer pessoa nascida no
Brasil era definida como brasileira, independente de ser filha de estrangeiros.
A partir da segunda década do século XX, há grande número de jovens
brasileiras, filhas de italianos, em idade de se casar, que se uniam a homens
italianos. Isto caracterizava uma "endogamia oculta" pois, apesar de
serem brasileiras de nacionalidade, no plano étnico-cultural as cônjuges eram
italianas.
Para os imigrantes, a escolha do cônjuge estava fortemente influenciada
pelas condições de trabalho a que estavam submetidos. O colonato era um sistema
baseado na força de trabalho familiar, e a sobrevivência ou mobilidade social
passavam pelo matrimônio, daí a preferência por cônjuges italianos já inseridos
naquele sistema de trabalho e com perspectivas semelhantes. Os italianos, nesse
contexto social, eram compelidos pelos seus próprios familiares e por membros
da comunidade a casarem entre si, dando origem a "famílias de
produção", que se formavam em torno do trabalho. Eram, portanto, famílias
numerosas, com vários filhos que ajudavam no trabalho e no aumento da produção.
Este modelo de família numerosa, dedicada à produção, era o desejado pelo
governo brasileiro, que incentivava a imigração de famílias inteiras para o
Brasil, ao invés de indivíduos isolados. Em decorrência, visando aumentar a
capacidade produtiva, casais formados por dois cônjuges italianos tendiam a ter
uma extensa prole, com uma média de dez a treze filhos. Em contrapartida,
casais mistos, nos quais um cônjuge era italiano e o outro brasileiro, tendiam
a ter número bem menor de filhos, não mais que quatro.
Se para os italianos o casamento com um outro italiano de uma região
diferente da sua já apresentava uma barreira, o casamento com brasileiros tinha
barreiras maiores, e ainda mais intensas eram se se tratava de um pretendente negro,
mulato ou caboclo, pois os estigmas de cor
existentes na sociedade brasileira também foram incorporados pelos imigrantes.
Para muitos italianos, a imigração para o Brasil era algo passageiro, portanto,
o casamento com não italianos atrapalharia os planos de retorno para a Itália.
Em relação aos homens italianos, havia a resistência das mães italianas de
aceitarem noras brasileiras, pois na cultura italiana a nora teria que se
submeter às ordens da mãe do noivo, enquanto que as brasileiras preferiam morar
sozinhas com o marido, quebrando o costume italiano. Porém, era mais fácil
aceitar uma nora brasileira, pois esta passaria, mesmo que forçosamente, a conviver
no meio italiano e a se submeter à sogra. Porém, quando a filha italiana se
casava com um brasileiro, se afastava da família, sofrendo maior risco de
"abrasileiramento". A família italiana era patriarcal e, segundo a legislação brasileira da época, os
filhos menores de idade tinham de ter permissão do pai para se casarem. Os pais
italianos muitas vezes negavam permitir o casamento de seus filhos com
brasileiros ou com imigrantes não italianos, não apenas pelos fatores já
apresentados, mas também porque havia preconceito e racismo por parte de alguns italianos em
relação a casamento de seus filhos com brasileiros ou com imigrantes de outras
nacionalidades. Também seriam significativas as uniões informais entre homens italianos e mulheres
brasileiras. O Brasil tinha uma longa tradição de uniões informais,
frequentemente toleradas pela Igreja, desde que envolvessem indivíduos
passíveis de se casar. As uniões consensuais eram convenientes para o homem
italiano, pois poderiam ser desfeitas, deixando em aberto a possibilidade de
retorno à Itália. Também refletiam a relutância de alguns italianos em assumir
casamento com mulheres brasileiras, refletindo um preconceito de cor, pois
parte dessas brasileiras amasiadas com italianos eram pardas
ou negras. Na época, um membro do Comissário
Geral de Emigração (CGE) escreveu, em tom preconceituoso, que "A
degradação não para nem diante da distinção de raça: não são incomuns os
casamentos de italianos com negras e, o que é pior, de mulheres italianas com
negros".
Em alguns casos extremos, casais de noivos interétnicos tinham que fugir
de casa e manter relações sexuais, o que fazia o juiz
suprir a necessidade da permissão do pai para realizar o casamento. Essas fugas
também serviam para compelir o pai a aceitar a união, pois na época a perda da virgindade da filha antes do casamento maculava a honra da
família, fato que poderia ser contornado com o casamento.
Com o passar dos anos, as taxas de endogamia entre os italianos cai.
Embora boa parte seja efeito da denominada "endogamia oculta"
(italianos se casando com filhos de italianos nascidos no Brasil), ela não é
apenas explicada por isso, pois houve de fato um crescimento notável de
casamentos e uniões envolvendo cônjuges de origem italiana com cônjuges sem
origem italiana. A miscigenação entre italianos e brasileiros ocorreu sobretudo
entre homens italianos e mulheres brasileiras, por diferentes fatores. Os pais
brasileiros raramente se opunham ao casamento de suas filhas com homens
italianos, enquanto que os pais italianos frequentemente se opunham à união de
suas filhas com homens brasileiros. Havia uma discrepância entre o número de
homens e mulheres italianos, sendo os homens mais numerosos, portanto, as
mulheres italianas tinham grande disponibilidade de homens italianos para se
casarem, mas os homens tinham um número mais limitado de noivas compatriotas
disponíveis, aumentando as uniões com brasileiras. As mulheres italianas
chegavam ao Brasil acompanhadas de seus pais e se casavam, na maior parte dos
casos, quando ainda eram menores de idade, tendo que ter a permissão do pai
para realizar o casamento, e este dava preferência para genros italianos. Os
homens, por sua vez, muitas vezes chegavam ao Brasil sozinhos, desacompanhados
de seus pais, e tinham maior liberdade em escolher suas companheiras. Os
casamentos interétnicos entre italianos e brasileiros contribuíram para a
integração da comunidade ítalo-brasileira no Brasil e no seu
"abrasileiramento". Em um levantamento entre estudantes do Oeste
Paulista, dos sobrenomes de 224 alunos, 108 (48%) tinham sobrenomes italianos e
desses, 61 (56%) também tinham sobrenomes não italianos.
A segunda geração de imigrantes, ou seja, os filhos de italianos já
nascidos no Brasil apresentavam índices de assimilação mais extremos, devido ao
elevado número de casamentos com a juventude brasileira. Esse fenômeno era mais
acentuado nas áreas urbanas do que nas rurais e mais nas fazendas do que nas
colônias. Mas, mesmo nas últimas, esse fenômeno não era pequeno, como observou
o cônsul da Itália em Santa Catarina: "Os casamentos entre um italiano e
uma brasileira, entre uma italiana e um brasileiro são comuníssimos, e seriam
ainda mais frequentes se a maior parte dos italianos não vivesse segregada na
roça". Com o passar dos anos e a suspensão da emigração, até nos núcleos
coloniais os casamentos foram perdendo seu caráter de mononacionalidade que
prevalecia na origem.
A comunidade hoje
População
italiana no Brasil
|
|
Ano
|
População
|
1920
|
558.405
|
1940
|
325.283
|
1950
|
242.279
|
1970
|
152.801
|
A população de imigrantes italianos no Brasil a partir das primeiras
décadas do século XX, entrou em franco declínio. As
causas foram a aprovação pelo governo italiano do Decreto Prinetti em 1902, proibindo a imigração subsidiada
para o Brasil, o controle brasileiro de imigração com o Decreto nº 19.482 de
dezembro de 1930 e a Lei de Cotas de Imigração, pelo governo Vargas (incluída na Constituição de 1934). Também foi
um fator importante, o controle pelo governo nacionalista de Mussolini da saída dos cidadãos italianos para outros países.
As últimas grandes levas de imigrantes chegaram na década de 1950. O número de
italianos residentes no Brasil, que ultrapassava meio milhão de pessoas em
1920, caiu para pouco mais de 150 mil em 1970.
Com o passar dos anos, a maioria dos descendentes de italianos foi
perdendo o vínculo com a Itália e a cultura italiana. Segundo o demógrafo
Miguel Angel García, em 2003 a população com origem italiana no Brasil poderia
ser dividida em quatro grupos de acordo com seus vínculos com a cultura
italiana. O primeiro grupo, com cerca de 80 mil pessoas, era composto por
pessoas que nasceram na Itália e imigraram para o Brasil, seguido por um grupo
de um milhão e meio de pessoas conscientes das suas origens italianas. Em torno
deles, havia um estrato de dois ou três milhões de brasileiros que sabem que
têm antepassados italianos, mas sem dar maior importância ao fato. Por fim, ele
afirmou que havia um número impreciso de pessoas, talvez de 10 a 12 milhões de
brasileiros, que têm algum antepassado italiano sem sabê-lo ou sem considerar
que isso seja importante. Segundo García, não se pode considerar seriamente que
sejam "italianos" ou "ítalo-brasileiros" os 18 ou 23
milhões de brasileiros que têm um ou mais antepassados italianos, vez que a
"área cultural italiana" no Brasil, ou seja, as regiões com
influência em potencial das associações comunitárias, não superam dois ou três
milhões de pessoas, e com grandes diferenças internas.
Presidente Dilma Rousseff e membros da comunidade ítalo-brasileira durante a
Festa da Uva, em Caxias do Sul.
No ano de 2003, segundo a Aire (l’Anagrafe degli italiani residenti
all’estero) havia no Brasil 162.225 cidadãos italianos e, segundo os Anagrafi
consolari del Ministero degli Esteri, há 284.136 cidadãos italianos no
País. A maioria destes são cidadãos ítalo-brasileiros, visto que a Itália
garante a cidadania italiana para os descendentes, salvo algumas exceções, e o
Brasil permite a dupla-nacionalidade de
seus cidadãos. De acordo com as leis italianas, não há diferença jurídica entre
um italiano nascido na Itália ou no estrangeiro. Em São Paulo estão inscritos
no Consulado 154.546 cidadãos italianos, no Rio de Janeiro 38.736, em Porto
Alegre 37.278, em Curitiba 30.987 e em Belo Horizonte 13.769. O Brasil possui,
de acordo com diferentes fontes, a oitava ou a sexta maior população de
cidadãos italianos no mundo.
Quando se toma por base o número de brasileiros descendentes de italianos,
o Brasil possui a maior população italiana fora da Itália. Não se sabe o número
exato, visto que os censos nacionais não questionam a ancestralidade do povo
brasileiro. Segundo estimativa da embaixada italiana no Brasil, em 2013 viviam
cerca de 30 milhões de descendentes de imigrantes italianos, representando
cerca de 15% da população brasileira.
Os italianos e descendentes não formam um grupo étnico à parte da
população brasileira, mas integrante e enraizado dentro da sociedade
brasileira. Seus descendentes figuram nos mais diversos setores da sociedade do
País. Por exemplo, numa pesquisa de 2001, das 10.641 empresas industriais do
Rio Grande do Sul, 42% estavam nas mãos de brasileiros de origem italiana.
Certas localidades do Brasil meridional e do Sudeste têm uma clara maioria de
brasileiros de origem italiana. Tal fato é mais evidente em localidades rurais
do Sul do Brasil, tomando por exemplo municípios como Nova Veneza, que foi
colonizada por italianos. Mesmo nas grandes metrópoles, a presença da coletividade italiana é
significativa: por exemplo em Belo Horizonte, com 2,5 milhões de moradores, 30% era
descendente em 2007.
Nas eleições italianas de 2006, os eleitores italianos que estavam fora
de seu país, puderam participar. No Brasil, 62.599 cidadãos italianos votaram
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