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Os chamados "fundadores" da República (da esquerda para a
direita): José Miguel Carrera,Bernardo O'Higgins, José de San Martín e Diego Portales em pintura de 1854 de
Otto Grashof
A história do Chile divide-se
comumente em doze períodos históricos que cobrem o intervalo de tempo
compreendido entre o começo do povoamento humano no atual território até à atualidade.
O período
pré-hispânico corresponde ao povoamento inicial do atual território chileno
pelas várias etnias ameríndias, que se estende desde cerca
de 14 800 a.C. até a chegada dos espanhóis. A partir
de 1492, a exploração
europeia nas Américas começou. Fernão de Magalhães e sua
expedição foram os primeiros europeus a
chegar ao Chile. Eles chegaram pelo sul, através do estreito que hoje leva seu nome, em 1520.
Em seguida, Diego de Almagro comandou
uma expedição ao Vale do Aconcágua e ao
norte do atual território chileno em 1536.
O terceiro
período corresponde à conquista espanhola, que durou de 1536 a 1598, com
a Guerra de Arauco, durante a qual os espanhóis
ficaram prestes a ser exterminados pelos Mapuches. O período
colonial cobre mais de dois séculos (1598-1808), tendo sido um período marcado
pela criação das instituições coloniais.
Em seguida,
o período da Independência decorreu
entre a deposição do governador espanhol em 1818 ao exílio do
libertador Bernardo O'Higgins em
1823. Ele foi marcado por várias batalhas contra
os monarquistas, que conseguiram reconquistar rapidamente o país, e por
problemas no novo governo. Uma vez que a independência do país foi atingida,
seguiu-se um período de organização do Estado chileno
entre 1823 e 1830, que viu três líderes vitoriosos e duas constituições.
Entre 1831 e
1861, ocorreu o período da República Conservadora. Ele foi marcado pela entrada
em vigor daConstituição de 1833 estabelecida
por Diego Portales, com um governo forte e centralizado. Apesar de algumas
tentativas de subversão, a
estabilidade institucional foi mantida e o país experimentou a prosperidadeeconômica.
O oitavo
período, conhecido como a República Liberal (1861-1891), foi caracterizado por
uma maior estabilidade política, permitindo uma ampliação do território
nacional tanto ao sul como ao norte.
Na guerra civil de 1891, começou
a República parlamentar, que durou
até a promulgação da Constituição de 1925. O Congresso Nacional passou
a dominar a política e o presidente se tornou uma figura sem praticamente
nenhuma autoridade. O país tornou-se urbanizado e os
primeiros sindicatos foram
criados.
O período da
República Presidencialista, da Constituição de 1925 até o golpe de Estado de 1973, marcou uma
mudança nas instituições do país. Três partidos passaram a dominar a
política: o Partido
Radical, o Partido Democrata Cristão do Chile e
os Partido Socialista do Chile.
Muitas empresas
públicas foram criadas neste período. Seu final foi marcada pelo triunfo
das ideias deesquerda e socialistas.
Após o Golpe
de Estado de 11 de Setembro de 1973 que derrubou o presidente democraticamente eleito Salvador Allende, um regime militar ditatorial tomou
o poder com uma junta liderada
pelo general Augusto Pinochet. Dezenas de
milhares de apoiantes da oposição foram presos, torturados ou
mortos, inclusive no exterior, enquanto outros foram deportados ou
condenados ao exílio. Com a
ajuda dos Chicago Boys, Pinochet seguiu uma política econômica liberal, e uma novaconstituição foi
aprovada em 1980.
De acordo
com a teoria da passagem do Homem pelo Estreito de Bering através
da ponte de Beríngia, durante a última glaciação conhecida
com o nome de Würm pelos europeus e Wisconsin pelos americanos,
o Chile –
localizado na parte mais meridional da América do Sul e na
zona ocidental da
mesma, sobre o oceano
Pacífico– foi a última região da América a ser
ocupada.
A glaciação
Wurm-Wisconsin durou cerca de cinquenta mil anos. Segundo os cientistas, a Ponte Terrestre de Bering teve
condições de ser transitada durante quatro mil anos na primeira fase e quinze
mil anos na segunda. A partir de então, o homem foi andando para o sul, até
chegar ao atual território chileno.
O território
atual do Chile, o menos
povoado de todo o continente americano, foi
habitado por diversos grupos indígenas antes da chegada espanhola. No início,
os indígenas estavam organizados em grupos tribaisnômades, evoluindo
logo após sua chegada para sociedades aldeãs sedentárias.
Os restos arqueológicos mais
antigos do país foram encontrados em Monte Verde, próximo a Puerto Montt e
datam de cerca de 14 800 a.C. Alguns restos encontrados na cova
Fell, um sítio arqueológico na Terra do Fogo (região
mais austral do
país), indicam que a presença humana remonta a cerca de 7 000 a.C..
As mudanças
climáticas do 6º milênio antes de Cristo alteraram drasticamente os costumes
dos paleoindígenas chilenos que tiveram que se adaptar a um novo contratempo: a
formação do deserto de Atacama,
ocasionando o desaparecimento de muitas espécies, e ooceano
Pacífico delimitando as atuais costas marítimas. Estes indígenas tiveram
que se adaptar a um climamuito mais
quente do que estavam acostumados, motivo pelo qual muitos se deslocaram do
norte para o litoral e o vale central. Assim, se formaram os principais grupos
indígenos chilenos: atacamenhos e aimarás na
porção mais setentrional; diaguitas um pouco mais ao sul; os changos na costa
setentrional; a grande família dos mapuches no
vale central até o seno de Reloncaví e os tehuelches, chonos, alacalufes, onas
e yámanas na Patagônia.
De alguns
milhares de paleoíndios existentes em VII a. C., a população aumentou até cerca
de 1 200 000 indígenas no século XV. Durante
o século
XV, a cultura dos povos indígenas foi influenciada pela expansão do império Inca sobre
o norte do atual território chileno, iniciando com o Sapa (Imperador) Inca Pachacútec, e foi
culminada sob a direção dos Sapas Incas Túpac Yupanqui e Huayna Capac. Estes
últimos avançaram até o sul subjugando a povos aimaras, atacamenses, diaguitas
e picunches; não conseguindo derrotar as tribos mapuches, estabeleceram
finalmente a fronteira meridional do Império Inca ao
norte do rio
Maule.
Entretanto,
na Ilha de
Páscoa foi desenvolvida uma cultura com características polinésias muito
avançadas, apesar de seu isolamento. A antigo povo Rapa Nui desenvolveu
um sistema de escrita que agora desapareceu e construiu enormes esculturas
conhecidas como Moais. No
entanto, aproximadamente entre os séculos XVI e XVIII, houve uma crise que
levaria a uma guerra civil, que iria acabar com a maioria os vestígios da dita
civilização.
Descobrimento
O primeiro
europeu a reconhecer o território chileno foi o português Fernão de Magalhães, na sua
tentativa de circunavegação do planeta sob as ordens de Carlos I, Rei da Espanha.
Após zarpar
de Sanlúcar de Barrameda em 26 de Setembro de 1519, e de
reconhecer grande parte do litoral brasileiro e argentino, Magalhães descobriu
oestreito que
liga o Pacífico ao
oceano Atlântico, em 1 de Novembro de 1520, data que a
historiografia chilena considera como a do descobrimento do território do país.
Em um primeiro momento, Magalhães nomeou o local de Estreito de Todos os
Santos, tendo posteriormente levado o seu nome.
Diego de Almagro, pioneiro na exploração espanhola do território
chileno.
O primeiro
explorador de grande parte do território chileno foi Diego de Almagro, sócio
de Francisco Pizarro na
conquista do Peru. As
disputas que teve com Pizarro pela divisão das riquezas do destruído império Incalevaram-no a
se aventurar nas terras do sul. Almagro partiu de Cusco em
julho de 1535. Muitos
historiadores acreditam que uma das razões da viagem de Almagro eram
os rumores da existência de um reino muito mais rico que o Inca ao sul, o qual
poderia haver surgido de forma intencionada como forma de debilitar as
investidas conquistadoras e assim permitir uma rebelião nativa.
Após
percorrer o caminho do Inca (cruzando territórios correspondentes às
atuais Bolívia e
norte daArgentina), Almagro
realizou a travessia da cordilheira dos Andes com
terríveis resultados: grande parte de sua comitiva morreu durante a travessia
devido à hipotermia. Após mais
de nove meses, Almagro finalmente chegou ao vale de Copiapó, em 21 de março de 1536.
Almagro
organizou o reconhecimento de sua governança denominada Nova Toledo (como havia
sido chamado o território cedido ao conquistador por parte do monarca
espanhol), sem encontrar as riquezas que tanto buscava. Um enfrentamento em
Reinohuelén entre os indígenas e uma das patrulhas é considerado a primeira
batalha da denominada Guerra de Arauco.
Decepcionado e cansado da desastrosa viagem decide voltar ao Peru, em 1536,
tomando a rota de Arequipa até
Cuzco, onde se rebela contra Pizarro.
Dominação Espanhola
A Conquista
Em 1540, Pedro de Valdivia levou
a cabo uma segunda expedição, com a qual se iniciou o período da conquista. Ao
contrário de Diego de Almagro, tomou a
rota do Deserto de Atacama.
Ao chegar
ao vale de Copiapó, torna
solene possessão do território, em nome do rei da Espanha e a
nomeia Nova Extremadura, em homenagem à sua terra natal. Renova a marcha até o vale
do Aconcágua, onde o
cacique Michimalongo tentou o deter sem êxito. Em poucos meses Valdívia foi
proclamado pelo cabildo como
Governador e Capitão Geral da Nova Extremadura. Inicialmente rechaçou a ideia,
porém aceita o cargo em 11 de junho de 1541.
Nesta
primeira etapa lutou contra os indígenas do norte do país, tentando consolidar
a dominação espanhola naqueles territórios; quando dispôs de mais tropas
iniciou a ocupação dos territórios situados mais ao sul. Também iniciou a
fundação de outras cidades: La Serena (1544), Concepción (1550), La Imperial (1552),Valdivia (1552), Villarrica e Los Confines (1553).
Em 1553, o
país parecia definitivamente pacificado, mas os mapuches, dirigidos por Lautaro
e Caupolicániniciaram
uma insurreição, e Valdívia perdeu a vida em um dos combates. O novo
governador, García Hurtado de Mendoza y
Manríquez (1557), posterior
vice-rei do Peru (1589-1596),
reconstruiu as cidades destruídas, mas não teve sucesso em vencer a resistência
dos indígenas.
Cabe
destacar que, em 1557, desembarcou, no Chile, junto com o novo governador, seu
amigo de infância, o poeta-soldado Alonso de Ercilla y Zúniga, que, inspirado
em toda essa sangrenta epopeia, viria a ser o autor da primeira grande poesia
épica americana: "La Araucana", onde retrata o heroísmo e tenacidade
dos mapuches (araucanos) na defesa de suas terras, e "apresenta" o
próprio Chile ao mundo, em verso heroico.
"La
Araucana" viria ser reconhecida por Miguel de Cervantes, no imortal
"Dom
Quixote", como uma das maiores obras escritas em verso heroico castelhano.
No governo
de Rodrigo de Quiroga, em 16 de dezembro de 1575, um terremoto acompanhado
de um tsunamiassolou a
região sul, destruindo as cidades de La Imperial, Villarrica, Valdivia e Castro. Estudos
recentes calculam, a partir de descrições do fenômeno e danos produzidos, uma
magnitude perto de 8,5 graus naescala Richter.
Em 1598, os mapuches se
revoltam novamente e se produz o "desastre de Curalaba", que
quase acaba com a tentativa de colonização do
Chile. As cidades ao sul do rio Biobío são
destruídas, exceto Castro. Após sucessivos combates da Guerra do Arauco, se
estabelece uma fronteira tácita entre a colônia espanhola e as terras sob
dominação mapuche no rio
Biobío, de onde se iniciaram depois perigosas revoltas.
A Colônia
Finalizada a
etapa de Conquista, inicia-se um período que durará mais de dois séculos,
durante os quais se ampliaria e consolidaria a dominação espanhola no
território, apenas resistida pelos mapuches.
O Reino do
Chile constituía administrativamente uma capitania-geral com capital em Santiago. O controle
efetivo do território embarcado por esta se reduzia ao Vale Central até o rio Biobío. À frente
da capitania se encontrava o governador e o capitão geral, assessorado pela
Real Audiência, presidida pelo mesmo governador. A Audiência, além de servir de
órgão de consulta do governador, tinha também as funções de tribunal de
apelações do reino.
Como
toda capitania-geral, Chile era
uma região especial de administração, mas com base no sistema de controle
recíproco de autoridades, o rei Felipe II sujeitou
ao governador a vigilância do vice-rei do Peru, ao
expressar em uma cédula real de 1589 que
deveria "guardar, cumprir e
executar suas ordens, e o avisar de tudo que ali se oferecesse de consideração".
A partir de tal norma, os vice-reis entenderam que a relação entre ambos era de
efetiva dependência, além de, em alguns casos, a relação do governador ser
direta com o rei e em outras passar pelo vice-rei entre a capitania e o
vice-reinado. Por exemplo, mediante cédulas reais, só se autorizou a vice-reis
intervirem no Chile em caso de "alvoroço
e tumulto"; facultou-se aos vice-reis colocar em prática táticas
militares na Guerra de Arauco(defensiva)
e, depois, ordenou-se diretamente ao governador do Chile implantá-las
(ofensiva). Também se autorizou aos vice-reis remover o governador e,
posteriormente, se negou a eles tal atribuição.
Em respeito
a recursos militares e abastecimento comercial, a capitania dependeu do
vice-reinado. A administração de justiça da capitania era autônoma do
vice-reinado, exceto a Inquisição que
correspondia a um delegado de Lima e os
juízos de comércio, que dependeram do consulado de Lima até 1795. No
Governo a relação foi flutuante, dependendo do período, as instruções que
enviava o rei e inclusive as personalidades das respectivas autoridades
(vice-reis e governadores), nunca havendo uma anexação formal da capitania ao
vice-reinado. Além disso, em certos períodos, por questões estratégicas de
segurança do Vice-reinado – por
exemplo, diante de ameaças de corsários – os
vice-reis interviam diretamente no governo do Chile, inclusive por própria
iniciativa. Mesmo assim, alguns governadores se acostumaram a consultar ou
pedir conselhos sobre temas urgentes ao vice-rei, devido à grande distância que
os separava do rei, na Espanha. Finalmente, em 1798, por conta
de uma disputa entre o vice-rei O'Higgins e o
governador Avilés, o rei Carlos IIIdeclarou que o Chile era
independente do vice-reinado, "como
sempre deveria ter sido entendido".
A Guerra do Arauco tenderia,
ao longo do período da Colônia, diversas etapas de alta
beligerância e outras mais pacíficas: guerra ofensiva, guerra defensiva e
parlamentos. Além disso, os governadores espanhóis tiveram que enfrentar,
durante a segunda metade do século XVII, a
repetidas incursões de corsários ingleses. Para a sustentação do exército se
estabeleceu, em 1600, o Real
Situado, uma subvenção da coroa paga com cargo ao tesouro do vice-reinado do
Peru.
A situação
geográfica do Chile, apertado entre as principais rotas terrestres e marítimas,
foi um dos inconvenientes maiores com o qual lidou a colonização do país. Isto,
somado ao constante estado de guerra em que se encontrava a capitania,
converteram o Chile em uma das regiões mais pobres do império Espanholna América. Os
intercâmbios com o Peru foram a base da atividade comercial da capitania;
posteriormente, ainda que legalmente proibido, se estabeleceu um comércio
regular com Buenos
Aires.
O século XVII foi
caracterizado economicamente como o século do sebo, pois este artigo, junto ao
couro e o charque, se converteu no principal produto de exportação para o Peru,
o que permitia a obtenção de importantes dividendos a uma economia precária, de
escassa capacidade de produção em diversas áreas ao gado. O século seguinte,
XVIII, foi chamado de século do trigo, já que
neste século se formou uma nova estrutura social agrária, que permitiu um amplo
desenvolvimento da agricultura e uma importante quantidade de exportações deste
cereal ao vice-reinado. De fato, em 1687 o
Chile se converteu no "celeiro do
Peru", pois nesta data o país foi assolado por uma praga que afetou
grande parte dos vales cultiváveis. Também se desenvolveu a mineração, com
exploração deouro, prata e cobre.
Ainda que
existisse um sistema de monopólio, o contrabando se
tornou ativo e de forma ostensiva durante o século XVIII, com a
chegada de navios procedentes da França, Estados Unidos e Inglaterra. Apenas o
estabelecimento da liberdade de comércio com a Espanha, em 1778, permitiu
um intercâmbio mais contínuo com a metrópole.
Durante esse
período, ocorreram vários terremotos de
grande magnitude. Entre
outros, o ocorrido em 13 de maio de 1647, que
destruiu grande parte da cidade de Santiago; o de 15 de março de 1657, que
danificou completamente Concepción e gerou um tsunami; e o de 8
de julho de 1730, que voltou
a danificar seriamente Santiago e Valparaíso.
A Independência do Chile
No ano
de 1808, o Império
Espanhol vivia um crescente estado de agitação. Chegaram ao Chile as notícias
dainvasão napoleônica na
Espanha, e o cativeiro de Fernando VII na
época em que havia assumido García Carrasco como
governador do Chile. Depois de um tumultuado caso de contrabando, renunciou
em 1810. O militar
mais antigo do Chile nesta época era Mateo de Toro y Zambrano, que
assumiu interinamente o mandato. Ao mesmo tempo, havia se propagado
fortemente entre os criollos o
movimento juntista – trocar o governo espanhol por uma junta de notáveis que
conservaria o governo enquanto durasse o cativeiro do Rei.
O governador
Mateo de Toro y Zambrano aceita a convocatória em um cabildo para
decidir o estabelecimento de uma junta de governo. Assim,
em 18 de
setembro de 1810, se forma a Primeira Junta Nacional de Governo, ficando
Mateo como presidente e dando início ao período denominado Pátria Velha. Em pouco tempo se
convocam e se elegem os membros do Primeiro Congresso Nacional – tendo uma
ampla maioria o movimento dos moderados, que propunham uma maior autonomia, sem
chegar à completa separação do Império Espanhol, enquanto os exaltados, que
pregavam a independência absoluta e instantânea, ficaram com a minoria.
A priori, o
governo transitório estabelecido se manteve sem intenções de obter
independência. Porém, com o correr dos meses, tomou outros rumos, especialmente
com a ascensão ao poder de José Miguel Carrera. São
editados os primeiros textos constitucionais e leis próprias, e são criadas
novas instituições, como o Instituto Nacional do Chile, a
Biblioteca Nacional e o primeiro jornal chileno,
a Aurora de Chile. Por vez, inicia a Guerra da Independência contra
as tropas reais.
As tropas
enviadas pelo vice-rei do Peru, José Fernando de Abascal y Sousa, junto aos
apoiadores da Coroa que habitavam o território, finalmente derrotam as tropas
patriotas na Batalha de Rancagua, em 2 de outubro de 1814, dando
início à Reconquista Espanhola. Neste momento se restauram as instituições
coloniais, com os governos de Mariano Osorio e Casimiro Marcó del Pont.
Com o Desastre de Rancagua, a maioria
dos líderes independentistas teve que fugir para Mendoza, na Argentina. Ali foi
formado o Exército dos Andes, a cargo dogeneral argentino José de San Martín, do qual
participava Bernardo O'Higgins, líder das
milícias chilenas. Este Exército Libertador, que inicialmente contava com 4.000
homens e 1.200 militantes da tropa de auxílio para condução de mantimentos e
munições, cruzou a Cordilheira dos Andes e
em 12 de
fevereiro de 1817derrota as
tropas reais na Batalha de Chacabuco, dando início à Pátria Nova.
O'Higgins foi nomeado Diretor
Supremo e, em 12 de fevereiro de 1818, primeiro
aniversário da Batalha de Chacabuco, declara
formalmente a independência do Chile, que se confirmaria com a vitória do
exército chileno na Batalha de Maipú, em 5 de abril do
mesmo ano.
Sob seu
governo realizaram-se diversas obras de infra-estrutura, organizou-se a
Esquadra Libertadora que se dirige até o Peru, realizou-se a captura da cidade
de Valdivia, que ainda se encontrava nas
mãos dos espanhóis, por parte do almirante Thomas Cochrane e se
promulgam duas cartas fundamentais, a Constituição de 1818 e a Constituição
de 1822; O'Higgins,
porém, ganha a antipatia do povo devido ao seu autoritarismo, suas tentativas
de se manter no poder indefinidamente e a ordem de morte, por influência da
Logia Lautarina, a Carrera e a Manuel Rodríguez. Para evitar uma guerra civil,
O'Higgins renuncia em 28 de janeiro de 1823, e em julho
do mesmo ano se exila no Peru.
A Organização da República
Com a
renúncia de Bernardo O'Higgins, o país
entrou em um longo período de instabilidade política, que durou uma década. O
general Ramón
Freire, que se assume como Diretor Supremo sendo assessorado por Mariano Egaña, dedica-se
a acabar com o último foco de resistência colonial em Chiloé, mas a
constante desordem política em que se encontra o país é um grave obstáculo ao
seu governo. Como forma de solucionar o problema, é redigida a ConstituiçãoMoralista
de 1823 –
porém sua complexidade gera um grande rechaço na população que, somado à crise
econômica imperante, provoca a caída do governo Freire.
Em um
ambiente dominado pelas disputas entre políticos, Manuel Blanco Encalada é
eleito como primeiro Presidente do Chile. Seu curto
governo esteve marcado pelo domínio do grupo federalista e a promulgação das
Leis Federais de 1828. Mas
novamente essa legislação é rechaçada e provoca o caos no país. Blanco Encalada
renuncia e se estabelece uma sucessão de presidentes de curto período de
governo.
Em
1828, Francisco Antonio Pinto consegue
aprovar a Constituição de 1828, de linha liberal. Nas eleições, Pinto é
reeleito, mas o acusam de fraude eleitoral.
Além disso, o Congresso Nacional designa como vice-presidente Francisco Ramón Vicuña, cargo que
deveria ser efetivado por eleição popular.
Isto provocou o levante do exército, no comando de José Joaquín Prieto, que
controla rapidamente o sul do Chile, dando início à Revolução de 1829.
Pinto e
Vicuña renunciam aos cargos para evitar uma guerra civil, mas já é demasiado
tarde. A união entre conservadores, produtores de tabaco e partidários de
O'Higgins, com a Batalha de Ochagavía, produz a queda do regime liberal e se
instaura um governo revolucionário sob comando de José Tomás Ovalle.
Finalmente, a batalha de Lircay outorga a vitória definitiva dos
revolucionários e o fim do regime liberal.
República Conservadora
Após a
vitória na Revolução de 1829, José Joaquín Prieto assumiu
como Presidente da República em 1831. Com ele, o
poder de Diego Portales aumentou
de tal forma que este último se converteu no homem mais importante do país.
Seguindo
a ideologia de
Portales, de caráter autoritário - "governo
obedecido, forte, centralizador, respeitado e respeitável, impessoal, superior
aos partidos e a os prestígios pessoais" -, é promulgada a
Constituição chilena de 1833, que
entrega fortes poderes ao Presidente da República, eleito por sufrágio
censitário por um período de 5 anos e reelegível por outros 5. Isso permite que
o país acabe com o período de anarquia dos
últimos anos, estabelecendo um período de estabilidade (só abalado
momentaneamente pelas revoluções posteriores de 1851 e 1861), enraizado
nas bases institucionais em que se desenvolveram os regimes posteriores, e
começando a se recuperar da crise econômica.
O
descobrimento de cobre em Chañarcillo e a venda de trigo para
mercados externos começaram a outorgar riqueza ao país. Além disso, a
rivalidade dos portosde Valparaíso e de Callao no Peru pelo
domínio do Pacífico se agravou
com a criação da Confederação Peru-Boliviana de Andrés de Santa Cruz. Portales,
um dos mais ferrenhos inimigos desta confederação, foi um dos promotores da
guerra contra a união de Peru e Bolívia. Em sua
posição de Ministro da
Guerra, conseguiu que o Congresso chileno declarasse guerra contra a
confederação em 28 de setembro de 1836. Grande
parte do povo e do exército não estava convencida da ida à guerra; porém o
assassinato de Portales, em 6 de junho de 1837, foi o
alicerce necessário para a participação da população na guerra e a vitória
na batalha de Yungay, a mando do
general Manuel Bulnes, em 20 de janeiro de 1839.
Em 1841, Bulnes é
eleito como sucessor de Prieto. Durante este período, a economia do Chile segue
em crescimento. Inaugura-se a Universidade do Chile e
começa uma ascensão da cultura com a Sociedade Literária de 1842 de José Victorino Lastarria e Francisco Bilbao, entre
outros. Também se deu início a um período conhecido como Época de Expansão, com
o estabelecimento de uma colônia no Estreito de Magalhães. Ao fim de
seu mandato uma tentativa revolucionária para evitar a ascensão de Manuel Montt foi
aplacada pela Batalha de Loncomilla, em 8 de dezembro de 1851.
Junto ao seu
ministro, Antonio Varas, Montt
seguiu a linha de seu predecessor: construção de estradas de ferro, pontes e
estradas; elaborou-se o Código Civil de Andrés Bello e inicia-se a colonização
do sul do Chile, através da imigração alemã
nas regiões de Valdivia e Llanquihue, coroada
pela fundação de Puerto Montt.
Porém a
estabilidade do regime conservador começou a ruir. A Questão do Sacristão deu
origem a um conflito entre a igreja
católica e o Estado, deixando Montt em uma encruzilhada. Diante desta
situação, muitos conservadores se afastam do Presidente e se unem aos
opositores do governo, dando origem à fusão Liberal-Conservadora. Antonio
Varas, representando o Partido Nacional, finalmente é derrotado pela Fusão
Liberal Conservadora, em 1851.
República Liberal
José Joaquín Pérez assume
como presidente em 1861, como
candidato da unidade e assim acaba o período chamado Época dos Decênios -
devido à duração dos mandatos dos presidentes Prieto, Bulnes, Montt e Pérez.
Uma das
primeiras situações conflitantes no seu governo foi a Guerra contra a Espanha. O
reino europeu havia ocupado as Ilhas Chinca, sob
jurisdição do Perucomo forma
de pagamento por antigas dívidas contraídas durante a Guerra da Independência, logo após
a batalha de Ayacucho (1824) e
reconhecida na capitulação que se acordou após a batalha. Anos depois os
detentores dos bônus, tanto peruanos quanto espanhóis, pressionaram para que a
dívida fosse efetivada, o que motivou a presença na costa ocidental da América do Sul da
Expedição Científica - denominação utilizada para uma forte esquadra de guerra
espanhola. O pretexto da toma das ilhas foi um incidente na fazenda Malambo,
que teve como resultado um espanhol morto e o Tratado Vivanco-Pareja, repudiado
pelo povo peruano e que foi considerado como uma afronta à independência
americana. O Chile se
alia com o Peru, e finalmente no combate naval de Abtao os espanhóis são
derrotados pela esquadra aliada, não sem antes bombardear o porto de Valparaíso, em 21 de março de 1866 e se
livrarem do combate de Dois de Maio, em 2 de maio do
mesmo ano, em El
Callao.
O período de
expansão iniciado durante o governo de Montt foi continuado. No norte do Chile
começa a inversão e
exploração de minerais (salitre e cobre) na zona
de Antofagasta, sob
administração boliviana. Ao mesmo tempo, o francês Orélie Antoine de Tounens
declarou a independência do reino da Araucania e Patagônia. Ainda que
este estado nunca tenha se instalado de fato, gera-se no país uma ideia de
controlar finalmente a região de dominação indígena. Em1865, uma lei
interpretativa da Constituição estabelece a liberdade de cultos e em 1867 começa
a regir o Código de Comércio.
Em 1871, assume
como presidente Federico Errázuriz Zañartu. Durante
seu governo acaba a fusão Liberal-conservadora e se cria a Aliança Liberal, ao
se unirem liberais com o Partido Radical. Durante o regime liberal,
realizam-se diversas modificações na constituição de 1933: reduz-se o
quórum das sessões das câmaras do Congresso, limitam-se as faculdades
presidenciais e se flexibiliza a acusação aos ministros por parte do Congresso,
que começa a ter mais atribuições. Além disso começam a se tratar as "questões teológicas" ou
relacionadas com a Igreja. O Código Penal é aprovado em 1874 e a
Lei de Organização e Atribuições dos Tribunais (1975), que
suprime o foro eclesiástico e os recursos de força.
Em 1879, os atritos
diplomáticos entre Chile e Bolívia, pela
administração da fronteira norte do país e dos interesses chilenos nas minas de
salitre, provocam o desembarque militar em Antofagasta em 14 de fevereiro, dando
início à Guerra do Pacífico, o maior
conflito bélico da história do país.
Após a
conquista do território de Antofagasta, o Chile rapidamente se enfrenta no mar
com o Peru, aliado da Bolívia, e acaba com a conquista dos territórios deTarapacá, Arica e Tacna, em meados
de 1880. A Bolívia
se retira da guerra em maio deste ano e o Chile consegue entrar em Lima com
a Batalha de Miraflores, em 15 de janeiro de 1881. A guerra
finalmente acaba com a Batalha de Huamachuco, em 10 de julho de 1883, com a
firmação do Tratado de Ancón em 20 de outubro de
1883.
A vitória
chilena sobre os países aliados permite a expansão do território nacional
anexando Tarapacá, Arica e Tacna pelo tratado de Ancón e Antofagasta. Paralelamente,
a zona de Auracania havia sofrido um
processo de lenta incorporação através da construção de fortes, instalação de
colonizadores, tropas militares e a realização de parlamentos, resultando na
Pacificação da Auracania em 1881. Em 1888 é
também incorporada a Ilha de Páscoa. Por
outro lado, o Chile renuncia ao território da Patagônia Oriental
e da Puna de
Atacama e os cede à Argentina com o
tratado de 1881.
Os novos
territórios incorporados provocaram um explosivo auge econômico no país,
derivado principalmente da mineração do salitre,
recuperando-se assim da crise econômica dos anos 1870. Diversas
empresas europeias, principalmente britânicas, instalaram-se no extremo norte
do país explorando nitratos. A riqueza
produzida pelo "ouro branco"
sustentava cerca de 75% dos ingressos fiscais e a totalidade da economia
nacional.
Entre 1883
e 1884,
aprovaram-se diversas leis que apontavam para a laicização do
Estado: lei de cemitérios laicos; lei do matrimônio civil; lei do registro civil.
José Manuel Balmaceda foi
eleito presidente em 1886.
Aproveitando-se dos diversos dividendos da exploração do salitre, o governo de
Balmacena caracterizou-se pela modernização completa do sistema econômico,
educacional e sanitário, e a construção de grandes obras civis, como estradas
de ferro ao longo de todo o país e o viaduto do Malleco. Durante seu governo,
tratou de unificar liberais em torno de sua figura, mas a divisão se
aprofundou, impossibilitando o desenvolvimento normal de sua gestão. Era comum
que o congresso acusasse constitucionalmente aos ministros, paralisando o
desenvolvimento normal do governo de Balmaceda. Além disso, somou, como
inimigos, os líderes conservadores, a aristocracia e os
empresários do salitre.
A forte
oposição a Balmaceda se concretizou quando o congresso não aprovou a Lei de
Proposições de 1891. Balmaceda
declarou, em 1 de
janeiro, que esta lei entraria em vigência e que o congresso não se reuniria
até o mês de março daquele ano. No mesmo dia, o Congresso considerou ilegítima
a atitude do Presidente e declarou a sua destituição. A Marinha chilena
se uniu aos parlamentares, enquanto o exército declarou sua lealdade ao
primeiro mandatário, dando início àGuerra Civil de 1891.
Em 12 de abril, foi
declarado um governo paralelo em Iquique, liderado
por Ramón Luco e o almiranto Jorge Montt.[44] Rapidamente,
as tropas congressistas derrotaram no norte os balmacedistas. Com as batalhas
de Concón (20 de agosto) e Placilla (28 de agosto), as tropas
revolucionárias conseguiram entrar emSantiago. Balmaceda,
refugiado na Embaixada da
Argentina, suicida-se em 19 de setembro (no
dia anterior finalizava-se o seu mandato), acabando com a Guerra Civil que
produziu mais de 10.000 mortes.
República Parlamentarista
A vitória
das tropas congressistas na Guerra Civil permitiu o estabelecimento de um
sistema político conhecido como República Parlamentar, dominado
principalmente pela oligarquia composta
pelos grandes latifundiários, a burguesia mineradora e bancária e a
aristocracia chilena.
Ainda que
não tenha se estabelecido um sistema parlamentar propriamente dito, o Congresso
Nacional dominou a política nacional e o Presidente se converteu em uma figura
praticamente decorativa, sem autoridade e subalterno à decisão das maiorias
parlamentares, o que o tornava incapaz de aprovar as reformas que o país
precisava. Os gabinetes ministeriais eram constantemente censurados pelo
Congresso e deveriam apresentar a sua renúncia imediatamente, produzindo-se uma
rotativa ministerial que impossibilitava um governo adequado. Por exemplo, o
governo de Germán Riesco teve
um total de 17 gabinetes e 73 ministros em um período de cinco anos.
Durante
estes anos, o progresso do país continuou devido à riqueza produzida pela
mineração do salitre, o que
permitiu a construção de algumas obras como a Estrada de ferro Transandina
e o Museu Nacional de Belas Artes, em comemoração ao centenário da
Independência chilena. Além disso, a economia do país teve que se sobrepor ao
destruidor terremoto que
assolou o porto de Valparaíso em 16 de agosto de 1906.
Internacionalmente,
mediante arbitragem britânica,
resolveram-se os problemas limítrofes que o país mantinha com a Argentina na
zona meridional dos Andes -
devido à aplicação dos critérios do divortium
aquarum (divisão de águas), defendido pelo Chile, e dos mais altos
cumes, sustentado pela Argentina, que não coincidiam na região. Ao mesmo tempo,
ambos países, junto ao Brasil, firmam o
denominado Pacto ABC para estabelecer mecanismos de cooperação e de mediação
entre os estados e, de certa forma, frenar a crescente influência estadunidense
na região. À época também se iniciou a Primeira Guerra Mundial, conflito
no qual a posição do país foi neutra.
Contudo, ao
longo das primeiras décadas do século XX, começou a
se manifestar o descontentamento dos cidadãos pela má situação. A forte
migração de camponeses às cidades fez com que estes se submetessem a
paupérrimas condições de vida, moradia e problemas sanitários. A mortalidade
em 1895 era de
31 por cento; 30 000 pessoas morreram de varíola em 1909, e 18 000
de tifo, ao passo
que o analfabetismosuperava 68%
da população. Além disso, as condições de trabalho tanto nas cidades quantos
nas empresas de salitre eram vergonhosas. Mil pessoas morriam em acidentes de
trabalho a cada ano, mas toda essa situação era minimizada e desconhecida pelos
dirigentes. Como forma de melhorar a situação, a partir dos anos 1900 começou a
se fazer presente a chamada Questão Social, com as primeiras greves de
trabalhadores exigindo condições básicas para o seu desenvolvimento no
trabalho. As primeiras reformas nesse sentido surgiram em meados dessa década:
exemplo disso é que só em 1907 foi
implantado o descanso aos domingos. Muitos desses protestos acabaram
tragicamente pela repressão militar contra os trabalhadores, sendo a mais
conhecida a Matança de Santa Maria de Iquique. A fundação de sindicatos e do
Partido Trabalhador Socialista 1912 permitiu
o desenvolvimento do movimento operário nacionalmente. Os protestos começaram a
se tornar cada vez maiores e mais violentos, demonstrando a incapacidade da
classe dirigente para enfrentar os problemas que a nova sociedade industrial
demandava.
Em 1920, a união
das forças populares e da classe média deu
poder à oligarquia, e Arturo Alessandri assumiu
como presidente. Alessandri propôs, ao Congresso, a adoção de leis muito
avançadas no âmbito social, mas tais projetos encontraram uma forte oposição
no senado. O
descontentamento pela recusa das reformas se manifestou no chamado "ruído
de sabres"
de 1924, realizado
pela jovem oficialidade do exército, que, em
uma sessão do Congresso em que se debatia a remuneração parlamentar, fizeram
soar suas cornetas como
forma de demonstrar sua reprovação, o que foi interpretado como uma ameaça
de golpe
de estado. O Congresso aprova, nessa situação, rapidamente, as leis sociais,
crendo que os militares voltariam a seus próprios trabalhos; porém isso não
aconteceu. Diante de tal situação, Alessandri sente que seu poder foi superado
e apresenta a renúncia ao
Congresso, asilando-se na embaixada dos Estados Unidos. O
Congresso não aceita a sua renúncia, dando-lhe uma autorização para se ausentar
do país por seis meses. Em 10 de setembro, deixa o
país, rumo à Itália.
O poder
ficou a cargo dos militares, que constituíram uma Junta de Governo, que não conseguiu,
no entanto, controlar a situação. Em 12 de setembro, as forças armadas dissolveram
o Congresso após 93 anos de funcionamento ininterrupto. Em 23 de janeiro do ano
seguinte, se formou uma nova junta. Em poucos meses, solicitou-se o retorno de
Alessandri. Ao voltar, em 20 de março de 1925, ele
deparou-se com a aparição de um novo caudilho militar, Carlos Ibáñez del Campo, o seu
Ministro da Guerra.
Alessandri
decidiu, então, realizar mudanças profundas na política nacional: criou o Banco Central de Chile e
conseguiu que se aprovasse, em um plebiscito, uma
nova Constituição, que foi
promulgada em 18 de
setembro de 1925. Com essa constituição, o poder voltou a ser exercido
efetivamente pelo Presidente da República, dando fim
ao governo parlamentar e estabelecendo um regime presidencial.
República Presidencial
Com a
vitória do Presidencialismo, Alessandri e Ibáñez se enfrentaram em uma
disputa pela liderança. O primeiro desejava estabelecer um candidato único à
Presidência, cargo que Ibáñes ambicionava. Este foi apoiado por um manifesto de
vários políticos promovendo sua candidatura que parecia oficial apesar da
negativa manifestada por Alessandri, produzindo a renúncia generalizada do
gabinete. Diante dessa situação, Ibáñez publicou uma carta aberta ao Presidente
o recordando que só poderia governar emitindo decretos com a sua assinatura, já
que era o único ministro do gabinete. Desta forma, o governo de Alessandri
estava submetido às decisões de Ibáñez, algo que Alessandri não aguentaria:
designou Luis Barros Borgoño como ministro do Interior e apresentou sua
renúncia irrevogável, em 2 de outubro de 1925.
Barros
Borgoño foi substituído por Emiliano Figueroa, que havia
sido eleito como candidato do consenso entre os partidos políticos para
enfrentar a crise política em que o país se encontrava. Contudo Ibáñez
manteve-se como ministro do Interior. Figueroa não pôde controlar Ibáñez e
terminou renunciando em 7 de abril de1927 - fato
que permitiu a Ibañéz assumir a Presidência diante da disponibilidade do cargo.
Durante seu
governo criaram-se diversos organismos como a Linha Aérea Nacional, a
Controladoria Geral da República, Carabineros do Chile e a Força Aérea do
Chile. Além disso, promulgou-se o Código do Trabalho e firma-se o Tratado de Lima, em 3 de julho de 1929, que acaba
com os problemas de fronteira com oPeru.
Ibáñez teve,
em seu começo, o respaldo da população. Mas com o passar dos meses começou a
ter atitudes extremamente autoritárias. Centenas de políticos, incluindo
Alessandri, partiram para o exílio;
estabeleceram-se restrições à imprensa e o
Congresso foi designado por Ibáñez com acordo dos partidos políticos, recebendo
o apelativo de Congresso Termal, por conta do local da negociação (as Termas de Chillán).
O crash da bolsa de Nova Iorque deu
origem, em 1929, à Grande Depressão. O governo de Ibáñez, que
havia triplicado a dívida externa ao
solicitar empréstimos aos Estados Unidos, e o
inevitável colapso da mineração dosalitre, provocaram
uma crise sem precedentes no Chile, fazendo, do país, o mais afetado do mundo
pelo incidente. Diante dessa situação, Ibáñez apresentou a renúncia em 1931 e
deixou o governo nas mãos deJuan Esteban Montero, presidente
do Senado. Nas
eleições que foram convocadas para outubro, Montero derrotou, com folga,
Alessandri, que havia voltado do exílio.
Montero, ao
reassumir a presidência, enfrentou imediatamente diversas tentativas revolucionárias. A
sublevação da Esquadra em Coquimbo só foi
a primeira tentativa de golpe de uma série que se sucederia nos meses
seguintes, conseguindo se consumar finalmente em 4 de junho de 1932.
Os líderes
do golpe de estado, Marmaduke Grove, Carlos Dávila e Eugenio Matte, declararam
a República Socialista do Chile. Porém esse governo durou apenas doze dias, até
que um contra-golpe acabou com essa tentativa, o que permitiria que Dávila como
presidente e outros membros da junta fossem desterrados na Ilha de Páscoa. Dávila,
contudo, esteve só cem dias como presidente e, após vários mandatos interinos,
Alessandri foi eleito como presidente da República.
O segundo
mandato de Arturo Alessandri caracterizou-se
principalmente pela recuperação do país, tanto da economia quanto da política.
Para isso, Alessandri utilizou-se em várias oportunidades das faculdades
extraordinárias de seu cargo e conseguiu afastar o exército da política, que no
momento estava composto pela coalizão de conservadores e liberais, o Partido
Radical (que cada vez tinha mais destaque), e a esquerda emergente composta
pelo Partido Socialista e o Partido Comunista. Além disso, a influência das ideologias fascistas que
surgiam na Alemanha, Espanha e Itália foi
assimilada pela juventude do Partido Nacional Socialista do Chile, liderado
por Jorge González von Marées.
Ainda que no
começo Alessandri governou com um gabinete pluralista, os radicais lentamente
começaram a se aproximar dos partidos de esquerda, retirando-se do governo em
abril de 1934. A divisão
dentre o governo da direita com
a esquerda e
os radicais começou
a se tornar cada vez mais profunda e a violência começou a reaparecer. O
Massacre de Ranquil foi só uma amostra da tensão que começou a reinar nos campo
e na cidade. Alessandri declarou estado
de sítioem fevereiro de 1936 e
fechou o Congresso, enquanto os operários se declaravam em guerra à sombra da
recém fundada Confederação de Trabalhadores do Chile.
Estádio Nacional do Chile.
Apesar das
agitações que ocorriam no país, Alessandri, junto ao ministro Gustavo Ross
Santa María, estava conseguindo recuperar a derrotada economia. A mineração
de salitre já
estava dando seus últimos frutos e começava a ser substituída pelo cobre, enquanto a
agricultura estava se recuperando rapidamente. A dívida externa foi
reduzida em 31% com a compra de bônus depreciados e a indústria nacional
conseguia satisfazer 70% das necessidades do país. Essa melhora permitiu a
construção de obras como o Estádio Nacional e o Bairro Cívico.
Com a
aproximação da eleição presidencial, os radicais começaram a se aliar com os
comunistas e socialistas, formando a Frente Popular, o qual levantou a
candidatura do radical Pedro Aguirre Cerda. A Coalizão
elegeu Gustavo Ross como candidato presidencial, sendo detestado pela oposição,
que o denominava Ministro da Fome. Porém a surpresa foi a candidatura de Ibáñez, apoiado pela Aliança Popular
Libertadora e o Partido Nacional-Nacionalista.
Ross parecia
ser o vencedor das eleições graças à onerosa campanha realizada e à divisão dos
eleitores opositores entre Aguirre Cerra e Ibáñez. Porém um terrível
acontecimento mudaria a situação: membros das juventudes nazistas tomaram a
Casa Central da Universidade do Chile em 5 de setembro de 1938.
Atrincheirados no edifício, uma tropa de artilharia atacou a entrada principal,
o que ocasionou a rendição dos 71 protestantes. Estes foram transferidos ao
Edifício do Seguro Operário, localizado em frente ao Palácio de La Moneda, e ali
foram fuzilados por carabineros. A Matança do Seguro Operário foi atribuída à
oposição como ordem de Alessandri, o que provocou a renúncia de Ibáñez de sua
candidatura e seu apoio a Aguirre Cerda. Finalmente em 23 de outubro o
candidato da Frente Popular obteve 50,2% dos votos, contra 49,3% de Ross.
Pedro Aguirre Cerda assumiu
o cargo de Presidente e levou a cabo uma política de esquerda moderada,
promovendo a industrialização e diminuindo o poder daoligarquia. Diante do
devastador terremoto que
devastou Chillán e
grande parte do sul do país em 1939, funda a
Corporação de Fomento da Produção. Através do "Projetio de substituição de
Importações" busca conseguir a independência econômica do país. Exemplo
disso é a criação da Empresa Nacional de Eletricidade, a fundação de plantas
hidrelétricas, a ENAP a cargo da primeira descoberta de petróleo em Magalhães,
a Companhia de Aços do Pacífico e indústrias estatais de exploração
silvoagropecuária e manufatureira. Com esse impulso, a indústria chegou a um
crescimento anual de 7,5% entre 1940 e 1943.
Os bons
resultados econômicos começaram a produzir mudanças na sociedade chilena e dar
novos brios às cidades. Santiago, por
exemplo, começou a explodir demograficamente, alcançando 1 milhão de habitantes
e a cultura se desenvolveu graças aos aportes literários de Vicente Huidobro e Augusto D'Halmar. Como parte
de sua vocação de educador, Aguirre Cerda iniciou a extensão da educação
pública a grande parte do país, acreditando ser a única forma de superar a
pobreza.
Durante
estes anos as relações internacionais do país tiveram que enfrentar importantes
fatos bélicos que assolavam grande parte do mundo. A Guerra Civil Espanhola produziu
um massivo êxodo de espanhóis, que chegaram ao país graças às ações realizadas
pelo embaixador na França, Pablo Neruda -
principalmente a bordo do navio Winnipeg.
Anos mais tarde, produziu-se o início da Segunda Guerra Mundial, onde o
Chile, assim como na Primeira Guerra Mundial,
declarou-se neutro, apesar de grande parte da população apoiar os Aliados. Por outro
lado, em 1940 e por ordem de Aguirre Cerda, oficializa-se a reclamação do país
sobre a Antártida e
declaram-se os limites do Território Antártico Chileno.
O governo de
Aguirre Cerda teve um fim abrupto devido à mortal tuberculose que o
afetou, falecendo ao fim de1941 sem
terminar o mandato. Em 1942, o
radical Juan Antonio Ríos é
eleito como sucessor de Aguirre Cerda, finalizando a maioria dos projetos
deste.
Durante seu
governo, as pressões para tomar parte oficialmente na Segunda Guerra Mundial, tanto
pelosEstados
Unidos quanto por simpatizantes do Eixo, termina
com a declaração de guerra à Alemanha e Japão, em 20 de janeiro de
1943. Um feito transcendente para a história da literatura chilena foi a
premiação da poetisa Gabriela Mistral com
o Prêmio
Nobel, em 10 de
dezembro de 1946.
A
estabilidade originada nos governos radicais, com a soma das distintas forças
políticas, começou a ruir seriamente durante o governo de Ríos. A crise entre a
presidência e os socialistas, os comunistas, a direita e seus companheiros de
partido levou Ríos a exigir a saída de todos os radicais de seu gabinete.
Porém, como seu antecessor, a saúde impediu que continuasse no cargo de
Presidente, falecendo em 1946.
Gabriel Gonzáles Videla foi
eleito Presidente como líder da Aliança Democrática, composta entre outros pelo
Partido Radical e pelo Partido Comunista (PC) liderado por Neruda. Porém,
em 1947, as
eleições municipais deixaram clara a ascensão do PC em pleno cenário da Guerra Fria. Diante
desta situação, e sob influência da guerra fria e do macartismo norteamericano,
González Videla expulsa o PC de seu governo e se converte em seu férreo
opositor.
Os sindicatos mineiros
de Lota e Chuquicamata, dominados
por comunistas, declaram-se em greve e instala-se o estado
de sítio em Santiago; nesse
contexto, o Congresso aprova a Lei de Defesa da Democracia, denominada como a
"Lei Maldita" por seus opositores, que proscreve ao Partido Comunista
e envia seus militantes a um campo de detenção em Pisagua.
Além disso,
durante o governo de Gonzáles Videla elabora-se o "Plano Serena",
visando o desenvolvimento da província de Coquimbo e
remodelação de La
Serena, além da conquista do voto feminino. Instalam-se as primeiras bases
antárticas e funda-se a Universidade Técnica do Estado.
Para a
eleição presidencial de 1952,
enfrentam-se Pedro Enrique Alfonso (representando
o radicalismo), o centrista Arturo Matte, o
socialista Salvador Allende eCarlos Ibáñez del Campo como
candidato independente. O general Ibáñez aparece como a solução dos problemas
da política tradicional e, com seus lemas de "O General da Esperança",
"Pão para Todos" e seu símbolo da vassoura para varrer a corrupção,
consegue a vitória com mais de 47%.
O populismo
com que assume Ibáñez permite ao seu governo grande adesão da população,
aproximando-se da esquerda. Nos seus primeiros anos apóia inclusive a fundação
da Central Única de Trabalhadores, liderada
por Clotario Blest e derruba a "Lei Maldita" no fim de seu mandato.
Porém em 1955 a
substituição de importações fracassa e a economia entra em recessão. Seu
governo começa a enfraquecer devido ao pouco apoio de partidos.
Como forma
de buscar uma solução ao problema econômico encarga-se à Missão Klein-Saks, uma
firma estadunidense que apresenta ao presidente a única forma de solucionar os
problemas: medidas liberais, como reformas no comércio exterior, supressão de subsídios, eliminação
de reajustes automáticos de salários no setor público e parte do privado,
modificação do estatuto do Banco Central do Chile e a criação do Banco do Estado do Chile. Estas
medidas tornam-se impopulares e geram descontentamento na população. Greves
ameaçam novamente a estabilidade do Governo e é proclamado estado de sítio por
Ibáñez, sendo rechaçado pelo Congresso. Em 1957 enfrenta
duramente a Federação de Estudantes da Universidade do Chile, pela alta nas
passagens do transporte público, tendo os protestos deixando um saldo de mais
de 20 mortos e graves danos materiais ao centro de Santiago.
Os Três Terços
Apesar das tentativas do Bloqueio de Saneamento Democrático, a forte
decepção que produziu o populismo de
Ibáñez na população permitiu a vitória do independente de direita Jorge Alessandri, filho de Arturo Alessandri, nas
eleições presidenciais de 1958. Alessandri
obteve cerca de 31,6%. Salvador Allende, como
candidato da Frente de Ação Popular (FRAP)
- aliança de esquerda - obteve 28,9%, enquanto o democrata cristão Eduardo Frei Montalva conseguiu
20,7%. Nesta eleição, o Partido
Radical (cujo candidato Luis Bossay só obteve 15%) começa a perder protagonismo
ante a conformação de um sistema político conhecido como "Os Três Terços"
(a direita, a democracia cristã e a
esquerda), e que perdurará por quinze anos. Devido ao fato de nenhum candidato
ter alcançado a maioria absoluta, o Congresso teve que eleger o presidente,
dando ao candidato da direita o cargo.
O engenheiro
Alessandri decide pôr em prática um plano de estabilização econômica, centrado
fundamentalmente na luta contra a inflação. Devido a
seu caráter sóbrio e técnico, muitas de suas medidas não são populares. A ideia
de Alessandri é criar um Estado que tenha a infra-estrutura para incentivar o
investimento privado, deixando a ideia do "Estado Paternalista". Para
tanto, deixa-se assessorar por muitos especialistas na matéria, muitos dos
quais eram independentes, o que provoca certos atritos com os partidos que o
apoiavam.
Durante seu
governo, Alessandri teve que enfrentar os efeitos dos catastróficos terremoto e maremoto dos
dias 21 de maio (com epicentro em Concepción) e 22 de maio de 1960 (com
epicentro em Valdivia), mas que
arrasou todos os povoados situados entre Chillán e Chiloé,
sendo o movimento sísmico de maior
intensidade registrado na história da humanidade, com 9,5 graus de magnitude na escala Richter. Estima-se
que a reparação dos sinistros tenha custado mais de 422 milhões de dólares.
Apesar disso, o povo comemorou a realização do Campeonato Mundial de Futebol de 1962 no
Chile.
Em sua
gestão, foram criadas as empresas estatais Entel Chile, Enami e Ladeco, e
Alessandri tentou conseguir ajuda econômica estadunidense através da Aliança para o Progresso. Ademais,
começou a materializar-se o projeto dereforma
agrária que Alessandri via como uma forma de otimizar a exploração da
terra. A reforma foi feita mediante a redistribuição das terras do Estado, sem
interferência nas propriedades dos grandes lafundiários.
Ao se
aproximarem as eleições de 1964, a Guerra Fria estava
no auge e o crescimento do socialismo de
Allende parecia inevitável. É assim que a figura de Eduardo Frei Montalva emerge
como forma de deter a FRAP. Com seu lema "Revolução em Liberdade", Frei consegue somar aliados a seu
projeto de reformas profundas no país, sem submetê-lo à influência soviética,
como supostamente faria Allende. Em dois anos, o Partido Democrata Cristão do
Chile converte-se na principal referência política dos anos 1960.
A luta entre
Allende, Frei e o candidato da Frente Democrática, Julio Durán, é praticamente voto a voto.
Porém um fato conhecido como "Naranjazo" mudaria completamente o
destino da eleição. A morte do deputado socialista por Curicó, Óscar Naranjo, permitiu a
realização de uma eleição complementar, prévia da presidencial, e que foi
utilizada por todos os partidos como uma prévia da eleição do 4 de setembro. Nesta
eleição, o filho do falecido, também socialista, obteve 39,2% dos votos, frente
a 32,5% da Frente Democrática e 27,7% do Partido Democrata Cristão.
Atemorizados
com uma possível vitória de Allendre, os partidários da direita apóiam
massivamente Frei, o qual ademais receberia apoio do governo dos Estados Unidos. A marcha
da Pátria Jovem, organizada para apoiar a candidatura de Frei, converte-se em
um êxito com a assistência de milhares de pessoas ao Parque Cousiño, o que
seria uma prévia do resultado final da eleição. Frei obteve 56% dos votos (uma
das mais altas maiorias na história eleitoral chilena) enquanto Allendre obteve
cerca de 40%.
Eduardo Frei
leva adiante uma política de reformismo moderado, em que se destaca a
construção de milhares de moradias, modernização do aparato estatal, a reforma
educacional (obrigatoriedade de oito anos), fortalecimento das organizações de
base e a ampliação da Reforma Agrária. Esta última se converteu em um dos temas
mais delicados já que, ao contrário do governo de Alessandri, incluem-se
expropriações das grandes fazendas, o que leva a animosidades com os políticos
de direita que entendem o ato como uma traição ao seu apoio à eleição
presidencial.
Por outro
lado, o governo inicia o processo de "Chilenização" do cobre, adquirindo
a mina El Teniente e grande parte das ações de Andina e La Exótica. Além disso,
constroem-se o túnel Lo Prado e o Aeroporto de Pudahuel, funda-se
a Televisão Nacional do Chile e
iniciam-se as escavações do Metrô de Santiago.
Porém
em 1967 a
Democracia Cristã começa a rachar enquanto o governo deve assumir o rechaço
tanto da esquerda quanto da direira. Em 1968, as greves
começam a se propagar, enquanto as reformas das estruturas políticas dos alunos
da Universidade do Chile e
da Universidade Católica do Chile produzem
sérios conflitos entre os estudantes e o governo.
Em 1969, a crise do
governo Frei se acentua, incluindo-se inclusive rumores de Golpe de Estado, o que se
concretiza em 29 de
outubro com o chamado "Tacnazo",
liderado pelo general Roberto Viaux, que leva o
Regimento Tacna às ruas de Santiago. Ainda que o evento tenha sido apaziguado e
nada foi mais que um falso alarme, refletiu a gravidade da situação política em
que se avizinha uma iminente vitória de Salvador Allende nas próximas eleições.
No mesmo
ano, surgiu o Movimento da Ação Popular Unitária (MAPU), como facção mais
esquerdista da Democracia Cristã e se une à Unidade Popular, a nova
aliança formada por socialistas, comunistas, radicais, sociais-democratas e
outros grupos, tendo como propósito a chegada de Allende ao Palácio de La Moneda.Radomiro Tomic, o
candidato oficial, não é considerado apto para derrotar Allende, motivo pelo
qual a direita declara Jorge Alessandri candidato.
Ainda que
Alessandri obtivesse a princípio um grande apoio, com o correr das semanas este
começou a dissipar-se. Em 4 de setembro de 1970, a votação foi realizada: Allende
obteve 36,3%, enquanto Alessandri 34,9% e Tomic, 27,9%. Como nenhum candidato
havia alcançado a maioria absoluta, o Congresso teria que decidir o vencedor.
Desde 1946, o Congresso havia eleito nesses casos aquele que conseguisse a
maioria relativa (assim o fez em 1946, 1952 e 1958), mas
muitas pessoas começaram a pressionar para que Alessandri fosse eleito.
O Presidente
dos Estados Unidos, Richard Nixon, opõe-se
fortemente a uma vitória do marxismo na América Latina, motivo
pelo qual idealiza junto à CIA dois
planos para evitar que o Congresso elegesse Allende: o primeiro consistia em
tentar convencer a Democracia Cristã para que votasse em favor de Alessandri, o
qual renunciaria e chamaria a novas eleições de donde seria eleito Frei; o
segundo era provocar um clima de instabilidade política em que o Exército seria
obrigado a atuar. Porém o chamado Track
One viu-se eliminado quando Radomiro Tomic anunciou que havia
chegado a um acordo com Allende para que este assumisse, respeitando um estatuto
de garantias constitucionais. Isso provoca a execução do Track Two, que consistia no sequestro
do Comandante do ExércitoRené Schneider, de maneira
tal a involucrar o Exército, para que impedisse o Congresso de eleger Allende.
Tal ação foi executada em 22 de outubro de
1970, quando Scheneider tenta se defender do atentado e, nessas circunstâncias,
é ferido gravemente, falecendo dias depois. Apesar do episódio, o Congresso
Pleno decide em 24 de outubro designar
Allende como novo presidente do Chile. Mas, o
governo Nixon estava preparando outros "Tracks" para o caso de Allende tomar posse e assumir o
governo da nação.
Governo da Unidade Popular
Salvador Allende, que assume
em 3 de
novembro, tenta construir uma nova sociedade baseada no socialismo através
da democracia, uma
experiência até então única no mundo. Entre suas primeiras medidas, continua o
processo de reforma
agrária e inicia-se um processo de estatização de empresas consideradas
chave para a economia chilena. A partir de certos resquícios legais, baseados
em um decreto-lei de 1932, se uma
empresa detivesse certo mercado sua produção poderia sofrer intervenção do
Estado, o que faz o governo da Unidade Popular incitar aos trabalhadores que
detenham suas atividades e assim estatizar as empresas.
Estas
medidas foram rechaçadas pela direita, o que não sucedeu com o projeto chave do
Governo e que foi apoiado por todos os setores políticos do país: a
nacionalização do cobre. Em 15 de julho de 1971, foi
aprovado este projeto por votação unânime nas duas Câmaras. O Estado (através
da Codelco Chile), tornaria-se proprietário de todas as empresas extratoras de
cobre - sendo que estas receberiam indenização, restando-lhes as
"utilidades excessivas" que haviam tido nos últimos anos produto dos
baixos ou nulos impostos que pagavam. Assim, Anaconda e Kennecott, uma das
principais empresas mineradoras, não receberam indenizações pelas minas de
Chuquimata e El Tenente, respectivamente, o que dá início a um boicote ao
governo de Allende liderado por Henry Kissinger (
negando empréstimos internacionais) e apoiado por algumas empresas
multinacionais como a ITT, a Ford, a Pepsicola e outras. Por outra parte, o
aumento drástico dos salários dos trabalhadores e o congelamento dos preços
funciona e alcança-se um crescimento de 8% no PNB com baixa inflação. Neste
ambiente, a Unidade Popular chega ao seu auge, com 49,73% das preferências nas
eleições municipais deste ano e com um de seus referentes, Pablo Neruda, recebendo
o Prêmio
Nobel de literatura.
Porém, a partir
do segundo ano, as reformas de Allende começam a ser paralisadas devido à
violência que começa a surgir, ao boicote económico e sabotagens orientados
pela administração Nixon (EUA) e à crise mundial do petróleo cujos efeitos
nessa época tornaram-se notórios. A tomada de terrenos, aproveitando os
resquícios da reforma agrária, termina com alguns agricultores mortos ao tentar
defender seus terrenos. A sociedade começa a se polarizar e os
enfrentamentos entre partidários e opositores de Allende tornam-se mais
frequentes, nascendo os panelaços. Com tal clima, a visita de Fidel Castroincita os
membros da esquerda a iniciar uma revolução popular com base na luta de
classes, algo oposto ao que o presidente se propunha. Economicamente, a magia
do primeiro ano começa a se desfazer, surgindo os primeiros sintomas do
desabastecimento.
O
assassinato de Edmundo Pérez Zujovic por um
obscuro grupúsculo terrorista sem vínculo com a Unidade Popular, é o estopim
para a Democracia Cristã, que decide associar-se ao Partido Nacional para se
opor ao governo. Uma acusação constitucional consegue derrubar o ministro do
Interior, José Tohá; porém Allende consegue
provocar a oposição ao colocá-lo como ministro da Defesa. Em 19 de fevereiro de 1972, a oposição
tenta aprovar no Congresso Pleno uma reforma constitucional que buscava
regularizar os planos estatizadores da União Popular, iniciativa dos senadores Juan Hamilton e Renán Fuentealba. Em 21 de fevereiro, Allende
anuncia formulárias observações, através de vetos supressivos ou substitutivos,
que finalmente chegaram por ofício em 6 de abril.
Nos partidos
do governo mais ligados à ultra-esquerda, aumenta o desejo de radicalizar as
reformas, principalmente pelo líder do Partido Socialista, Carlos Altamirano; o
Movimento de Esquerda Revolucionária intensifica seus ataques, respondendo ou
sendo respondido pelos atentados do movimento de ultradireita Pátria e
Liberdade.
No âmbito
econômico, o país entra em recessão e o crescimento cai. O PNB cai em torno de
25% e a dívida externa se eleva a 253 milhões de dólares. O desabastecimento, fortalecido
por sabotagens (ocultamento de mercadorias) e greves de transportes financiadas
pela CIA, permite a configuração do mercado negro e o governo instala as Juntas
de Abastecimento e Preços (coordenadas nacionalmente pelo general Bachelet)
para administrar o repasse de bens para a população. Os meios de comunicação
entram em enfrentamentos verbais segundo sua tendência política. Segundo
arquivos desclassificados posteriormente pelo governo estadunidense, a CIA houvera
entregue apoio, mediante a contratação de publicidade, a diários opositores,
como El Mercurio e aos promotores de uma
greve de caminhões durante outubro de 1972, o que acaba com o ingresso de
militares aos principais ministérios do país, formando-se um gabinete
"cívico-militar", onde o general Carlos Prats, comandante
em chefe do exército, assume como ministro do Interior.
Em 1973, as
eleições parlamentares dão à Unidade Popular 43% dos votos e à Confederação
pela Democracia (CODE), 55%. Allende não consegue a maioria para aprovar suas
reformas nem a Confederação pela Democracia consegue os dois terços do
Congresso para poder destituir o Presidente. Ainda que Allendre tratasse de
conseguir um entendimento com Patricio Aylwin, presidente
da Democracia Cristã, o Partido Socialista mostra-se completamente
intransigente e os acordos não progridem. A violência aumente, especialmente
entre os estudantes, devido ao projeto da Escola Nacional Unificada. A FEUC
demonstra seu repúdio e a Federação de Estudantes Secundários (FESES) se
divide. O projeto é parado graças à intervenção do Cardeal Raúl Silva Henriquez, que surge
como mediador da crise.
O povo
começa a ver as Forças Armadas como a
única salvação para a crise que vive o país. Porém as ideias deRené Schneider ("enquanto houver regime legal as Forças
Armadas não são uma alternativa de poder") e a do general Carlos
Prats ("enquanto subsistir o
Estado de Direito a força pública deve respeitar a Constituição")
estavam contra um pronunciamento militar para deter grande parte das tropas que
se levantaram. Ainda que o Partido Comunista, respaldando ao presidente
Allende, insistisse em manter a paz e evitar a guerra civil, Altamirano afirma
que "o golpe não se combate com
diálogos, faz-se com a força do povo". Enquanto as observações de
Allende à reforma Hamilton-Fuenzalida foram rechaçadas em parte pelas câmaras,
sem votar se insistiriam ou não no texto antes aprovado, gerando-se uma
controvérsia entre o Presidente e o Congresso, enquanto à tramitação do projeto
de reforma. Allende planteou a questão ao Tribunal Constitucional, que
finalmente declarou-se incompetente, acolhendo a exceção formulada pela Câmara dos Deputados e
o Senado. Diante
dessa situação, e vencido o prazo para recorrer a um plebiscito que elucidaria
a questão, Allende dita um decreto promulgatório da reforma, contendo apenas os
pontos não vetados. Esse decreto não é aceito pela Controladoria Geral da
República e a oposição considera tal fato como absolutamente ilegítimo.
Em 22 de agosto, a câmara
aprova o "Acordo da Câmara de Deputados sobre o grave quebramento da ordem
constitucional e legal da República", causada pela negativa do exército em
promulgar integralmente a reforma constitucional das três áreas da economia,
aprovada pelo Congresso.
Em 27 de junho, Carlos Prats é
insultado nas ruas e, temoroso de um ataque como o de Schneider, dispara contra
o agressor, atingindo uma mulher inocente. Prats apresenta sua renúncia, que é
rechaçada por Allende. No dia 29, Prats teve que enfrentar um dos momentos mais
tensos, quando o coronel Roberto Souperlevanta o
Regimento Blindado nº 2 e se dirige ao Palácio de La Moneda. Pratz,
dirigindo as guarnições de Santiago, consegue
deter essa tentativa de golpe conhecida como Tanquezaço, enquanto os instigadores se refugiam e pedem asilo na
embaixada do Equador, deixando
um saldo de vinte mortos, principalmente civis.
Allende
reconhece a crise em seu governo e decide convocar um plebiscito para
evitar um golpe
de estado. As facções mais radicais do governo da Unidade Popular repudiam a sua
decisão. O MIR deixa de o chamar de "companheiro" e o chama de
"senhor"; Allende apenas conta com o apoio do Movimento de Ação
Popular Unitária, do Partido Radical e do Partido Comunista, que compartilham a
"via pacífica". Diante dessa situação, Allende convocou seu ministro
da Defesa,Orlando Letelier, para que convença ao Partido
Socialista, o que consegue na noite de 10 de dezembro de 1973.
Regime Militar
Desde
Agosto 1973, em forma
mais visível, ou desde antes, com apoio dos "Tracks" de Nixon,
setores da Marinha e a Força Aérea preparavam um golpe de estado contra o
governo de Allende, lideradas pelo
vice-almirante José Toribio Merino e o
general Gustavo Leigh. Em 21 de agosto, Carlos Prats decidiu
renunciar ao posto de Comandante em Chefe após manifestações das esposas dos
generais. Em seu lugar, assume Augusto Pinochet no dia
23, considerado um general leal e apolítico. Em 22 de agosto, a Câmara
de Deputados havia aprovado um acordo em que se convocava os ministros
militares a solucionar "o grave
quebramento da ordem constitucional" (o "Acordo da Câmara de
Deputados sobre o grave quebramento da ordem constitucional e legal da
República").
Altamirano é
advertido de um possível golpe de estado por
parte da Marinha e este
lança um discurso incendiário, dizendo que o Chile se
converterá em um "segundo Vietnã heróico", enquanto se inicia um processo de
desaforo contra Altamirano. Em 7 de setembro, Pinochet é
convencido por Leigh e Merino e se une aos golpistas, enquanto ente os Carabineros, apenas César Mendoza, um general
de baixa antiguidade, estava a favor.
No dia 10 de setembro, a marinha
zarpou como estava previsto para participar dos exercícios UNITAS. O exército é
aquartelado para evitar possíveis distúrbios no dia do processo de Altamirano.
Porém a armada regressou a Valparaíso na manhã de 11 de setembro e
tomou a cidade rapidamente. Allende foi alertado cerca das 7 da manhã e se
dirigiu ao La Moneda, tratando de localizar a
Leigh e Pinochet, o que foi impossível e o fez pensar que Pinochet estivesse
preso. O general Sepúlveda, diretor dos Carabineros, assinalou que se manteriam
fiéis, mas Mendoza assumiu como Diretor Geral. Por outro lado, Pinochet chegou
ao Comando de Comunicações do Exército e começou a participar ativamente do
golpe. Às 8h42, as rádios Mineria e Agricultura transmitiram a primeira
mensagem da Junta Militar dirigida por Pinochet, Leigh, Mendoza e Merino,
solicitando a Allende a entrega imediata de seu cargo e a evacuação imediata de
La Moneda, ou seria atacado por tropas de ar e terra. Nesse momento, as tropas
de Carabineros cercando o Palácio se retiraram.
Allende
decide continuar no Palácio, enquanto às 9h55 chegam os primeiros tanques ao
Bairro Cívico, enfrentando-se a franco-atiradores leais ao governo. A CUT chama
à resistência nos bairros industriais, enquanto o Presidente decide dar uma
última locução:
"Colocado em uma transição histórica, pagarei
com minha vida a lealdade do povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a
semente que entregaremos à consciência de milhares e milhares de chilenos não
poderá ser cegada definitivamente. Trabalhadores de minha Pátria! Tenho fé no
Chile e em seu destino. Superarão outros homens nesse momento cinza e amargo
onde a traição pretende se impor. Sigam vocês sabendo que, muito mais cedo que
tarde, abrirão-se de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre,
para construir uma sociedade melhor." Salvador Allende, 11 de setembro de 1973
O fogo entre
os tanques e os membros do GAP se inicia e, às 11h52, aviões Hawker Haunter da Força Aérea
Chilena bombardeiam o Palácio de La Moneda e a residência de Allende, na
Avenida Tomás Moro, Las Condes. O Palácio
começa a se incendiar, mas Allende e seus partidários se negam a render-se.
Perto das 2 horas da tarde, as portas são derrubadas e o Palácio é tomado pelo
exército. Allende ordena a evacuação, mas se mantém no Palácio. Segundo o
testemunho de seu médico pessoal, Allende disparou com uma metralhadora contra
seu queixo, cometendo suicídio.
Às 18 horas,
os líderes do pronunciamento se reúnem na Escola Militar, assumindo como
membros da Junta
Militar que governará o país, e decretam o "estado de guerra", incluindo estado
de sítio.
Primeiros Anos da Junta Militar
O Estádio Nacional de Chile usado
como campo de concentração durante
a ditadura de
Pinochet, em 1973
Após
derrubar o governo democrático de Allende, os membros da Junta de Governo
começaram um processo de estabelecimento de seu sistema de governo. Ainda que
em teoria se mantivesse vigente a Constituição de 1925, o poder que recaía na
nova Junta estabelecia uma nova institucionalidade no país: o estado de guerra,
onde qualquer pessoa poderia ser detida ou executada pelas tropas, mesmo na rua
e sem maiores explicações.
De acordo
com o Decreto Lei Nº 1, de 11 de setembro de 1973, Augusto Pinochet assumia
a presidência da Junta de Governo, em sua qualidade de comandante em chefe do
ramo mais antigo das Forças Armadas. Este
cargo, que originalmente seria rotativo, finalmente se tornou permanente;
em 27 de
junho de 1974 Pinochet
assume como "Chefe Supremo da Nação", em virtude do Decreto Lei Nº
527, cargo que seria substituído pelo de Presidente da República, em 17 de dezembro de
1974, pelo Decreto Lei Nº 806. Entretanto, a Junta assume as funções
constituinte e legislativa em lugar do Congresso Nacional, que foi fechado
em 21 de
setembro.
Diante de
tal situação, milhares de pessoas começaram a sofrer a repressão exercida pelo
novo governo. A maioria dos líderes do governo da Unidade Popular e outros
líderes da esquerda foram presos e transferidos a centros de reclusão. Cuatro Álamos, Villa Grimaldi, o Estádio
Chile e o Estádio Nacional de Santiago foram
utilizados como campos de detenção e tortura, assim como a Oficina Salitrera
Chacabuco, a Ilha Dawson na Patagônia, o porto de Pisagua, o Buque Escola Esmeralda e
outros locais ao longo do país. Três mil pessoas teriam sido assassinadas por
membros da Direção de Inteligência Nacional (DINA) e de outros organismos das
Forças Armadas, entre os que se destacam o general Bachelet, o cantor e
compositor Victor
Jara e o advogado e ministro José Tohá. Muitas dessas pessoas
permanecem como desaparecidas na atualidade. Além disso, 35 mil pessoas foram
torturadas sistematicamente, mais de 300 mil pessoas foram detidas por
organismos do governo e outras tiveram que se exilar em diversos países do
mundo, algumas das quais foram brutalmente assassinadas em atentados explosivos
no exterior, como o general Carlos Pratsna Argentina
e o diplomata e ex-ministro Orlando Letelier em
pleno bairro diplomático de Washington (EUA). As sistemáticas violações aos direitos humanos
cometidas pela ditadura de Pinochet provocaram o
repúdio de diversos estados e da Organização das Nações Unidas (ONU).
A esto se agrega os evidentes enriquecimentos ilícitos de Pinochet, familiares,
colaboradores mais próximos e dos setores que lucraram com a ditadura.
A liberdade
de imprensa no Chile acabou, salvo para jornais golpistas como "El
Mercurio", similares e correlatos.
Diversos
jornais de esquerda ou até independentes foram expropriados e as vezes tiveram
seus locais e maquinários saqueados, destruídos e incendiados.
No âmbito
econômico, o Regime Militar tenta uma "política de choque" para corrigir a crise em que havia sido
assumida pelo governo, com inflação superior a 300%. Para tanto, solicita-se a
ajuda de um grupo de jovens economistas egressos da Universidade de Chicago, que
implantam o modelo de liberalismo de Milton Friedman. Os Chicago Boys aproveitaram as
ideias nascidas em El Ladrillo e, seguindo as ideias de Friedman, sob a
proteção e apoio da ditadura, começaram um tratamento de choque monetarista
para a economia chilena: o gasto público foi reduzido em 20%, foram demitidos
30% dos empregados públicos, o Imposto de Valor Agregado (IVA) foi
aumentado e os sistemas de empréstimo e financiamento de moradia foram
eliminados. Como previsto, a economia depois destas medidas despencou, algo que
Friedman considerava necessário para faze-la "ressurgir". O PGB e as
exportações caíram em 12% e 40%, respectivamente, e o desemprego aumentou para
16%. Porém as medidas aplicadas durante esse período favorecidas pelo aumento
internacional do preço do cobre (maior exportação do Chile) começaram a surtir
efeito em 1977, quando a economia começou a se levantar e se deu início ao que
foi o "Boom" ou o
"Milagre Chileno".
Nestes anos, finalizaram-se os trabalhos do Metrô de Santiago e
começaram os da Carretera Austral.
Aproveitando
a conjuntura na América Latina, liderada
por múltiplos ditadores militares, o Chile se
integrou junto a outros estados na Operação
Condor, um plano de inteligência destinado à pratica do terrorismo de estado
no Cone Sul, apoiado
pela CIA, visando
inclusive o assassinato de ex-presidentes. Um dos ideólogos deste plano foi o
chefe da DINA, Manuel Contreras, um dos
homens com maior poder no país durante estes anos. A proximidade que tinha com
líderes de outros países permitiu que, por exemplo, o Chile acertasse posições
com a Bolívia, liderada
pelo general Hugo
Banzer. Isso permitiu a firmação do Acordo de Charaña, uma
tentativa de solucionar o problema da mediterraniedade da Bolívia e em que se
restabeleciam as relações diplomáticas, rompidas desde décadas atrás.
A Troca de Década
O ano
de 1978 marca
um dos anos mais críticos do governo de Pinochet. Os Estados Unidos, que o
haviam apoiado no princípio do regime, tornam-se um dos seus principais
detratores, devido principalmente ao atentado terrorista contra Orlando Letelier, exilado
em Washington. Jimmy Carter, que assume
o governo do país no ano anterior, realiza uma forte campanha junto a diversos
organismos internacionais exigindo maiores liberdades civis no Chile e
criticam a censura contra a imprensa e a repressão à oposição. Antes disso,
Pinochet convoca um plebiscito, quando
ainda não existiam registros eleitorais. De acordo com os resultados publicados
pelo governo, votaram 5.349.172 pessoas: 4.012.023 votos pela opção
"Sim", 1.092.226 pela opção "Não" e 244.923 foram brancos
ou nulos. Porém, tais cifras foram questionadas devido às diversas irregularidades
do processo.
As violações
aos direitos humanos continuaram apesar da pressão internacional. Enquanto
Pinochet promulga o Decreto Lei Nº 2.191, que concedeu anistia a
todos os que haviam cometido feitos delituosos desde a data do golpe, em
qualidade de autores, cúmplices ou encobridores, a imprensa começa a revelar o
destino dos primeiros detidos desaparecidos na zona de Lonquén. No entanto, a DINA é
substituída pela CNI, enquanto o cardeal Raúl Silva Henriquez encara
o problema e cria a Vicaria da Solidariedade.
Neste
ambiente, Gustavo Leigh manifesta
publicamente suas diferenças de opinião com Pinochet. Leigh, o gestor do golpe,
opõe-se ao excessivo personalismo de Pinochet e ao modelo econômico imposto.
Leigh também esperava apurar os prazos para o retorno da democracia e estava
contra as práticas terroristas que estava exercendo o Estado. Diante das
declarações do Comandante da Força Aérea ao periódico italianoCorriere della Sera e sua
recusa em se retratar, Leigh é destituído pela Junta Militar e é
substituído porFernando Matthei.
Ainda que as
relações diplomáticas com os países vizinhos haviam se aproximado, foram
rompidas durante 1978. A proximidade da comemoração do centenário da Guerra do Pacífico produziu
efervescência no Peru (com
que teve problemas diplomáticos em 1974) e naBolívia. As
tentativas de outorgar uma saída ao mar a este último viram-se acabadas pelo veto
do Peru ao Acordo de Charaña, veto que poderia exercer de acordo com o
estabelecido no Protocolo Adicional do Tratado de Ancón, chegando o ditador do
Peru, General EP Juan Velasco Alvarado a
mobilizar a 18ª Divisão Blindada do Exército do Peru ao sul, próximo à
fronteira do Chile; dias depois o general EP Francisco Morales Bermúdez Cerruti derrota
o general Velasco, desmobiliza a 18ª Divisão Blindada, cujos tanques retornam
aos seus quartéis e a normalidade volta à fronteira, mantendo o veto ao Acordo
de Charaña. Diante de tal quadro Banzer rompe relações diplomáticas com o
Chile.
Ao mesmo
tempo surge com a Argentina o Conflito de Beagle. A Rainha Elizabeth II do Reino Unido abdica
das ilhas Picton, Lexxon e Nueva ao Chile, as quais estavam em disputa com o
país vizinho. Ambos países haviam se comprometido a aceitar o laudo britânico
de 1967, porém
Jorge Rafael Videla declara o ocorrido como "insanealmente nulo" e a possibilidade de guerra com a
Argentina é iminente, a que se somava a possibilidade de um "quadrilhaço" (guerra com a
Argentina, Peru e Bolívia).
O Chile
tenta solucionar as diferenças através de uma mediação papal com Paulo VI, mas sua
morte e a de seu sucessor, o Papa João Paulo I, agravam a
situação. As tropas chilenas estão recrutadas em Punta Arenas e a
esquadra chilena zarpa para enfrentar a da Argentina, em 22 de dezembro de
1978. Uma tempestade nas águas patagônicas evita o primeiro enfrentamento,
enquanto o Papa João Paulo II apela
a uma mediação entre ambos países, a qual é aceita pela Argentina. O conflito
seria encerrado com o "Tratado de Paz e Amizade", firmado em 29 de novembro de 1984.
Em outubro
de 1978, o Conselho de Estado (um organismo assessor à Junta, presidido
por Jorge Alessandri) recebeu um anteprojeto de
Constituição redigido pela Comissão Ortúzar. Em 8 de junho de 1980, Alessandri
entrega um dictamen e informe elaborado pelo Conselho, contendo várias
correções ao anteprojeto. A fim de analisar o projeto apresentado pelo
Conselho, a Junta de Governo nomeia um grupo de trabalho que praticou suas
funções durante um mês, realizando diversas modificações no texto. Finalmente,
em 10 de
agosto Pinochet informa que a Junta aprovou a nova Constituição e que a
submeterá a um plebiscito. Os registros eleitorais, no entanto, não foram
abertos, motivo pelo qual várias irregularidades teriam sido cometidas. A
oposição só pôde se manifestar em um ato político liderado por Eduardo Frei Montalva no
teatro Caupolicán. Em 11 de setembro de
1980 realizou-se o referendo que obteve um respaldo de 68,95% dos votos. Assim,
a nova Constituição Política da República do Chile entrou em vigor em 11 de março de 1981.
Em 1981, os
primeiros sintomas de uma nova crise econômica começam a ser sentidos no país.
Pinochet impõe oliberalismo econômico.Durante o
regime de Pinochet, entre 1974 e 1987, o PNB per capita do
Chile caiu 6,4% em dólares constantes, caindo de US$ 3.600 em 1973 para
3.170 em 1993 (dólares
constantes) [47] As
sucessivas tentativas e erros de dosagem nas medidas recomendadas pelo
modelo liberal custaram
ao Chile uma queda 30% do seu PIB. Apenas
cinco países da América Latina tiveram,
em termos de PNB per capita, um
desempenho pior que o do Chile durante
a eraPinochet (1974-1989).[47] As
sucessivas tentativas e erros de dosagem nas medidas recomendadas pelo
modelo liberalcustaram ao
Chile uma queda 30% do seu PIB a
balança de pagamentos alcançou um déficit de 20% em 1981 e os
preços do cobre caíram
rapidamente. Os investidores estrangeiros deixaram de investir, enquanto o
governo dizia que tudo isso era parte da recessão mundial. Os investidores
nacionais e as empresas chilenas haviam aproveitado durante esse período para
pedir diversos empréstimos, com base na promessa de um câmbio fixo de um dólar a 39
pesos chilenos.
A situação
não pôde se sustentar e, em junho de 1982, o peso foi
desvalorizado e a política de câmbio fixo se encerrou. Diante disso, os
empréstimos alcançaram taxas exorbitantes e muitos bancos e empresas quebraram.
O desemprego se elevou a 25% e o governo não encontrava fórmula capaz de
manejar a situação. A inflação alcançou 20% e o PIB caiu em 15%. Começaram,
então, a aparecer os primeiros protestos de caráter pacífico, que foram
violentamente reprimidas pelos carabineros e pelo exército. Implanta-se o estado
de sítio e o momento é aproveitado por diversas organizações terroristas
como a Frente Patriótica Manuel Rodriguez, que decidiu iniciar a "Operação Retorno" e começar com
o fim do Regime pela via armada.
Em 27 de dezembro de 1986, comandos
do FPMR tentam assassinar o general Pinochet no caminho ao Cajón de Maipo.
Diante do fracasso dos comandos esquerdistas, Pinochet ordena uma forte onda
repressiva que termina com a morte de diversos frentistas (Operação Albânia). No mesmo
período tornou-se público o assassinato de cinco professores comunistas que
foram encontrados degolados, delito cometido por corpo de carabineiros, o que
obrigou à renúncia do diretor geral César Mendoza, que foi substituído
por Rodolfo Stange.
Com a
renúnica de Sergio Fernández ao Ministério do
Interior, Sergio Onofre Jarpa, seu
sucessor, permite a aproximação à Aliança Democrática (composta por democratas
cristãos e socialistas moderados). Graças à participação do Cardeal Francisco Fresno,
partidários do governo e parte da oposição formularam, em agosto de 1985, um
"Acordo Nacional para a Transição à Plena Democracia". Tal acordo foi
recebido com ceticismo por setores da extrema esquerda e sérias discrepâncias
ao interior da Junta de Governo.
No âmbito
econômico, Hernán Büchi conseguiria
produzir o "Segundo Milagre"
devido a um profundo processo de privatizações de empresas públicas (LAN Chile,Entel, CTC, CAP) e a reimplantação
do modelo liberal (substituído pelo keynesiano nos anos
mais cruéis da crise). Ainda que o PIB se duplicasse nos anos seguintes, a
redução do gasto social explica um aumento da desigualdade entre ricos e
pobres, fazendo do Chile um dos país com maior desigualdade na renda, e as
gratificações reduziram-se a limites mínimos, entre outros efeitos. Além disso,
a zona do Chile Central foi sacudida por um terremoto em 3 de março de
1985, tendo os edifícios de Santiago, Valparaíso e San Antonio sofrido graves danos nas
estruturas.
Últimos Anos
O governo
promulgou, em 1987, a Lei
Orgânica Constitucional dos Partidos Políticos, que permitiu a criação de
partidos políticos; e a Lei Orgânica Constitucional sobre sistema de inscrições
eleitorais e Serviço Eleitoral, que permitiu se abrir os registros eleitorais.
Com estas disposições legais, abriria-se a brecha para se cumprir o
estabelecido pela Constituição de 1980. Segundo
ela, devia-se convocar os cidadãos a um plebiscito onde
se ratificaria um candidato proposto pelos Comandantes em Chefe das Forças
Armadas e o General Diretor dos Carabineros, para ocupar o cargo de presidente
da República no período seguinte de oito anos.
No caso de o
resultado ser adverso, o período presidencial de Augusto Pinochet se
prorrogaria por mais um ano, como as funções da Junta de Governo, devendo se
convocar a eleição de
Presidente e de Parlamentares.
No início de
1987, o país presenciaria a visita do Papa João Paulo II, que
percorreu as cidades de Santiago, Viña del Mar, Valparaíso, Temuco, Punta Arenas,Puerto Montt e Antofagasta. O Sumo Pontífice
seria testemunha presente da repressão durante alguns protestos, durante a
cerimônia de beatificação de Teresa dos Andes no
Parque O'Higgins (3 de
abril de 1987). Durante sua visita, João Paulo II manteve uma longa
reunião com Pinochet em que trataram do tema do retorno à democracia. Nesta
reunião, o Pontífice haveria instigado Pinochet a fazer modificações no regime
e inclusive haveria solicitado sua renúncia. No ano seguinte, convocou-se a
realização do plebiscito, fixado em 5 de outubro.
Em 30 de agosto de 1988, os
Comandantes em Chefe das Forças Armadas e o General Diretor dos Carabineros, de
conformidade com as normas transitórias da Constituição em vigor, propuseram
como seu candidato Augusto Pinochet. Os partidários do "Sim" estariam
integrados por membros do governo e os partidos Renovação Nacional, a União
Democrata Independente e outros partidos menores. Por outro lado, a oposição
criou a Concertação de Partidos pelo "Não" que agrupava 16 organizações
políticas opositoras ao regime, entre as que se destacavam a Democracia Cristã,
o Partido pela Democracia e algumas facções do Partido Socialista. No entanto,
o Partido Comunista ainda estava proscrito.
Em 5 de setembro deste
ano, foi permitida a propaganda política após quinze anos de ditadura. A propaganda seria
um elemento chave para a campanha do "não", ao mostrar um futuro
colorido e otimista, contraponto a campanha oficial, notoriamente deficiente de
qualidade técnica e que pressagiava o retorno do governo da Unidade Popular em
caso de uma derrota de Pinochet. Ainda que a campanha do "sim"
conseguisse reverter os magros resultados do começo, revitalizando sua
campanha, os resultados finais entregaram a vitória à oposição: o
"sim" obteve 44,01% contra 55,99% do "não".
Apesar do silêncio
inicial de Pinochet (que, segundo algumas informações, aparentemente havia
pensado em não reconhecer os resultados no princípio), reconhece a vitória do
"não" e afirma que continuará o processo traçado pela Constituição de
1980. Assim, chamou-se eleições para a presidência e parlamento no dia 14 de dezembro de 1989.
Previamente, um plebiscito realizado em 30 de julho deste
ano havia aprovado uma série de reformas à Constituição, reduzindo em parte
o autoritarismo que
possuía a Carta Fundamental.
Patricio Aylwin, candidato
da Concertação, obteve 55,17% dos votos, frente a 29,4% de Büchi e 15,43% de
Francisco Javier Errázuriz, candidato independente de centro.
Transição para a Democracia
Governo de Patricio Aylwin (1990-1994]
Patricio Aylwin recebeu
o mandato das mãos de Augusto Pinochet, em 11 de março de 1990 no
novo Congresso Nacional do Chile, localizado
na cidade deValparaíso, dando início ao processo de
transição à democracia.
No início de
seu governo, Patricio Aylwin teve que trabalhar em um sistema que mantinha
inacessíveis muitos vestígios do Regime Militar. Ainda que
a Concertação tivesse obtido a maioria dos votos nas eleições parlamentares,
devido ao sistema binomial e a existência de senadores designados, não se
poderia fazer as esperadas reformas à Constituição e a administração local
das comunas ainda
estava nas mãos de pessoas designadas pelo governo militar, que foram
substituídas nas eleições de junho de 1992.
Patricio
Aylwin, Presidente do Chile após a restauração da democracia.
Aywlin
governou cautelosamente, cuidando das relações com o exército, onde
Pinochet ainda se mantinha como Comandante em Chefe. O exército, ainda que
houvesse deixado de participar do governo, seguia sendo um importante ator
político e manifestou seu rechaço a certas medidas do governo concertacionista
através de movimentos táticos como o "Exército em Enlace" e o "Boinazo", em 1991 e 1992,
respectivamente.
Neste
contexto, constituiu-se a Comissão Nacional de Verdade e Reconciliação,
destinada a investigar e esclarecer as situações de violações dos direitos humanos durante
os anos do Regime Militar. Dirigida por Raúl Rettig, a Comissão enfrentou o
rechaço das autoridades castrenses. Apesar disso, o informe da comissão foi
trazido ao conhecimento público através da televisão pelo Presidente Aylwin,
em 4 de
março de 1991, após nove meses de trabalho. No seu pronunciamento,
Aylwin apresentou o resultado dos estudos, pediu perdão às famílias das vítimas
em nome da Nação, anunciou medidas de reparação moral e material para estas e o
desejo do Estado de impedir e prevenir novas violações aos direitos humanos.
Durantew sua
gestão, Aylwin propôs criar modificações nas normas tributárias para aumentar o
gasto deimposto e
melhorar a distribuição de renda, no momento em que a economia chilena seguia
prosperando devido ao aumento das exportações de cobre e dos
produtos agrícolas. Com tanto, a pobreza em seu
mandato reduziu-se de 38,75% para 27,5%. Promulga-se a Lei Indígena, que
reconhece pela primeira vez aos povos indígenas e que cria a Corporação
Nacional de Desenvolvimento Indígena, organismo encarregado da promoção de
políticas que fomentem o desenvolvimento integral desses povos. Igualmente, o
Escritório de Planificação Nacional e Cooperação (ODEPLAN) se transforma em
Ministério de Planificação e Cooperação; cria-se o Fundo de Solidariedade e
Inversão Social, para fomentar as políticas sociais, e com a promulgação da Lei
sobre Bases Gerais do Meio Ambiente, que buscava estruturar um marco para a
ordenação ambiental, cria-se a Comissão Nacional do Meio Ambiente, para
promover o desenvolvimento sustentável e
coordenar as ações derivadas das políticas e estratégias ambientais do governo.
Em 1993 foram
realizadas novas eleições presidenciais e renovou-se a Câmara dos Deputados e
metade do Senado. Eduardo Frei Ruiz-Tagle, filho do
mandatário homônimo e também democrata-cristão, obteve 58,01% dos votos, a
maior votação em eleições livres da história republicana. O segundo, Arturo Alessandri Besa, candidato
da União pelo Progresso (RN e UDI), obteve só 24,3% dos sufrágios.
Governo de Eduardo Frei Ruiz-Tagle (1994-2000)
Frei, que
assumiu em 11 de
março de 1994, reiniciou
as relações do país com exterior, após certo isolamento em que esteve durante
o Regime
Militar. Aeconomia se
expandiu ainda mais e o crescimento médio foi de 8% ao ano durante os três
primeiros anos de governo, o que permitiu o início das negociações com o Canadá, Estados Unidos e México para a
integração ao Nafta e o
ingresso como membro associado do Mercosul. O Chile
também ingressou no Grupo do Rio e no
decorrer da década conseguiu resolver os últimos litígios fronteiriços com a
Argentina (Laguna del Desierto e Campos de Hielo Sur).
Ademais,
iniciam-se as primeiras gestões para um tratado de livre comércio e de
associação com a União Europeia e, em
1997, o Chile se converte em membro da APEC, abrindo
sua economia até a costa da Ásia,
principalmente Japão e China. A pobreza continuou
com seu ritmo descendente e, em 1998, chegou a
21,7% da população. Várias obras públicas foram construídas ao longo do país e
inicia-se o sistema de licitações que
permitem a construção das primeiras rodovias de
nível internacional do país.
Porém na
metade de seu mandato tem início a crise asiática, que
afetará grande parte da pujante economia chilena. Durante estes mesmos anos, o
país enfrentou importantes crises ambientais: a
alta contaminação
atmosférica em Santiago, o terremoto Blanco
de 1995 que
assolou o sul do Chile, as fortes secas de1996 que
impediram a geração de hidroeletrecidade e o
corte do abastecimento às principais cidades, as enchentes de
1997 na zona centro-sul e o terremoto de Punitaqui no mesmo ano.
O
crescimento do Chile estancou-se (o PIB diminuiu em 1%) e o desemprego começou
a aumentar, superando os 12% (em 1997, mantinha-se próximo a 5%). As decisões
errôneas do ministro Eduardo Aninat e
do Banco
Central expandiram o efeito e a recessão se
estabeleceu nos últimos anos do governo de Eduardo Frei.
Concomitantemente,
uma crise política inicia-se no país devido à detenção, em Londres, de Augusto Pinochet, que em
1998 havia assumido como senadorvitalício
após abandonar o Comando do Exército, devido a
uma ordem de captura internacional emanada do juiz espanhol Baltasar
Garzón pelo assassinato e tortura de cidadãos de nacionalidade espanhola
durante seu governo. A detenção de Pinochet supôs uma humilhação ao Chile,
visto que em seu país não havia sequer sido processado por causa alguma. A
postura oficial do governo então foi que Pinochet deveria voltar ao país para
ser julgado pelos tribunais nacionais
e não na Espanha ou Suíça, países que
solicitam sua extradição ao Reino Unido. Os
partidos de direita apoiam fortemente Pinochet, realizando manifestações contra
sua detenção, nas embaixadas da Espanha e do Reino Unido e ocorrem alguns
embates com simpatizantes da Concertação, cujos partidos da ala progressista
apóiam a reclusão de Pinochet.
As gestões
dos ministros de relações exteriores José Miguel Insulza e,
posteriormente, Juan Gabriel Valdés, sofrem
avanços e retrocessos. A Câmara dos Lordesrevoca, em
novembro de 1999, uma
resolução de um tribunal que aceitava a imunidade diplomática de
Pinochet como senador e ex-Presidente. A ex-Primeira Ministra Margaret Thatcher visita
Pinochet, que começa a sofrer graves problemas de saúde, e confessa que o Chile
havia apoiado ao Reino Unido durante aGuerra das Malvinas (1992), conflito
em que o Chile era neutro, o que provocou reações de protesto por parte do
governo argentino. Ainda que o governo de Tony Blair quisesse
que se julgasse Pinochet, os exames neurológicos verificaram a gravidade do
estado de saúde de Pinochet. Para evitar que o general morresse naGrã-Bretanha, Jack Straw, ministro
das Relações Exteriores de Blair, decide liberar Pinochet em 2 de março de 2000 por
"razões humanitárias".
Pinochet retorna a Santiago no dia 3 e se levanta de sua cadeira de rodas,
levantando sua bengala de forma vitoriosa, caminhando alguns metros na pista de
aterrisagem do Aeroporto, irritando os políticos que estavam contra seu
traslado.
Durante
estes anos, a direita aumentou seu apoio na mão de Joaquín
Lavín, prefeito de Las Condes e
figura relativamente nova no âmbito político, e que consegue se aproximar do
eleitorado popular. Aproveitando as deficiências dos governos da Concertação no
período da crise, Lavín consegue colocar em xeque o candidato oficial Ricardo Lagos, um dos
principais líderes da esquerda concertacionista durante a época do plebiscito,
pré-candidato presidencial nas duas oportunidades anteriores e ministro de
Obras Públicas durante o governo de Frei. Diante da forte luta para ser o
nominado da Concertação frente ao democrata-cristão Andrés Zaldivar, em que
Lagos havia obtido mais de 71% em eleições primárias, grande parte do
eleitorado de centro havia votado em Lavín temorosos da chegada de um socialista
ao governo, repetindo a experiência de Salvador Allende. Da mesma
forma, muitos comunistas e
a esquerda extraparlamentar temem
a vitória do candidato gremialista em primeiro turno e decidem votar por Lagos,
deixando de lado a candidata Democrata-Cristã, Gladys Marín. Nas
eleições de 12 de
dezembro de 1999, Ricardo Lagos obtém 47,96% dos votos, apenas 30.000 a
mais que Lavín. Marín obtém apenas 3,92%. O segundo turno é fixado para 16 de janeiro de
2000: o comando de Lagos é refeito e integra Soledad Alvear,
ex-ministra de Justiça de Frei, como coordenadora de campanha para aproximar-se
do voto de centro que havia escapado para Lavín. Finalmente, Lagos é eleito com
51,3%, contra 46,7% do candidato da UDI.
Século XXI
Governo de Ricardo Lagos (2000-2006)
Ricardo Lagos assume
o governo em 11 de Março de 2000 e deve
lidar com as consequências da crise asiática, da qual o país não se recupera, e
do caso Pinochet. Entre suas prioridades se destacam pôr em prática a Reforma
Processal Penal e a redução dos níveis de desemprego. A economia chilena
não decola e as tentativas de reforma do governo de Lagos não são aprovadas
no Congresso ou não
têm resultados favoráveis, como a reforma da saúde.
Durante o
ano de 2001, revela-se
um caso de corrupção relacionado à venda de revisões técnicas emRancagua, em que é
envolvido um subsecretário do governo e alguns parlamentares da Concertação.
Inicia-se, então, uma série de acusações de corrupção ao governo de Ricardo
Lahos relacionadas ao Ministério de Obras Públicas (Caso MOP-GATE,
principalmente) e a administação de Lagos começa a enfraquecer, especialmente
após as eleições parlamentares deste ano que dão como resultado quase um empate
técnico entre a Concertação e a Aliança pelo Chile.
O governo
passa por sua pior crise durante o ano 2002 e
começos de 2003, quando
enfrenta inúmeras críticas pela administração. O Chile ingressa como membro
do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tendo que
tomar uma decisão ante os planos de Washington de
invadir o Iraque. Ricardo
Lagos, em uma conversa telefônica, informa a George W. Bush que o
Chile votará contra a proposição, o que é apoiado por grande parte da população
nacional, que se opunha em validar uma invasão.
O Chile
consegue fechar os acordos iniciados no governo anterior, firmando o tratado de
livre comércio com a União Europeia, que entrou em vigência em 1 de janeiro de
2003. Posteriormente, são firmados os tratados com a Coreia do Sul e Estados Unidos, graças às
gestões de Soledad Alvear, ministra de Relações Exteriores do governo de Lagos.
As exportações, aumentam explosivamente e o Chile volta ao crescimento do
governo de Frei, desfazendo-se as dúvidas que inicialmente tinha o
empresariado. Mesmo assim o governo não consegue controlar as cifras de
desemprego (que beiram os 8%) e a desigualdade de renda não varia
substancialmente.
No início
de 2004, Lagos teve
que enfrentar publicamente o Presidente da Bolívia, Carlos Mesa, visto que
esse exige uma saída ao mar para seu país, considerando a precária situação
econômica e política que vivia o país. Posteriormente, Lagos enfrenta Hugo Chávez e Néstor
Kirchner. A dura posição frente ao Presidente da Bolívia e a atitude utilizada
com os outros mandatários foram reconhecidas por toda a opinião pública,
nacional e internacional, e a valorização positiva de Ricardo Lagos começou a
aumentar, conseguindo taxas próximas a 65% de apoio segundo diversas pesquisas.
A crise que parecia pressagiar inclusive um fim abrupto do governo se dissipa e
a Concertação começa a ressurgir. Os prognósticos, que davam Joaquín
Lavín como vencedor das próximas eleições presidenciais, começam a
variar substancialmente com a arremetida de duas ministras do governo de
Ricardo Lagos, Soledad Alvear e Michelle Bachelet.
Sob o
mandato do general Juan Emilio Cheyre, o exército
reconhece as violações dos Direitos Humanos e o
Governo entrega os resultados da Comissão Valech sobre tortura durante o Regime
Militar. Pinochet é processado por diversos casos de violações aos Direitos
Humanos, mas se isenta devido a uma "demência
senil". Durante 2004, investigações nos Estados Unidos demonstrariam que
Pinochet guardou vários milhões de dólares no Banco Riggs, e, em 2005, seria
detido por evasão de tributos e falsificação de material público.
O governo de
Lagos caracterizou-se em um amplo desenvolvimento de obras viárias, criando-se
as primeiras estradas urbanas
do pais. Na política, diminui-se o apoio à Aliança, aparentemente pelo Caso
Spiniak (descoberta de rede de crimes sexuais contra menores no
país, que envolvia políticos da direit), o que permite uma recuperação do
oficialismo, demonstrado nos resultados das eleições municipais de 31 de outubro de
2004 (47,9% para Concertação e 37,7% para a Aliança na eleição de
conselheiros).
As figuras
das ex-ministras Alvear e Bachelet começam a aumentar seu respaldo nas
pesquisas e, no princípio de 2005, ambas venceriam Lavín, o candidato da
Aliança. A Concertação decide por um processo de primárias entre suas duas
candidatas, enquanto na Aliança começam a surgir vozes dissidentes quanto à candidatura
de Lavín, o que acaba com a indicação de Sebastián Piñera como candidato da
Renovação Nacional, em 14 de maio. Diante do
baixo respaldo nas pesquisas sobre as primárias, Alvear declina sua
candidatura, o que faz de Bachelet a eleita como representante do conglomerado
oficial.
Bachelet,
que havia assumido originalmente o Ministério da
Saúde, passa em 2002 ao Ministério da Defesa Nacional, sendo a primeira mulher
da América Latina em ostentar tal cargo. Durante sua administração, as relações
civico-militares começam a se recompor após anos de deterioramento desde 1973. Bachelet
corre como favorita. Com o passar dos meses, Piñera começa a tomar vantagem e
finalmente supera levemente Lavín nas eleições presidenciais de 11 de dezembro. Ainda que
a Concertação consiga um resultado histórico (51,75%) nas eleições
parlamentares e que assim tenha, desde 2006, maioria em
ambas as câmaras, sua candidata à primeira magistratura não consege convocar
todo o apoio dos cidadãos de Lagos e seu conglomerado, e obtém 46% dos votos.
Com tais resultados, Piñera e Bachelet enfrentaram-se novamente em 15 de janeiro de
2006 no segundo turno, no qual Bachelet recuperou grande parte do eleitorado
dissipado no primeiro turno, graças ao decidido apoio dos personagens do
governo, sendo eleita com 53,49% das preferências. Assumiu o cargo de
Presidente da República em 11 de março de 2006, convertendo-se na primeira
mulher em ostentar tal cargo no país.
Governo de Michelle Bachelet (2006-2010)
Michelle
Bachelet pautou inicialmente seu governo pelo princípio da igualdade: na
distribuição dos cargos públicos, a Presidente procurou dividir os cargos para
homens e mulheres de maneira igualitária.
Em maio
de 2006, sua
popularidade caiu cerca de 8% em relação ao mês anterior, devido aos maiores
protestos já realizados no Chile desde
o fim do governo de Pinochet, em 1990,
organizados por estudantes secundaristas e universitários acerca de benefícios
aos mesmos e participação no estudo da nova legislação de ensino chilena. Com
isso, a quase totalidade de instituições secundárias de ensino no país entraram
em greve por mais de duas semanas. Próximo ao Palácio de La Moneda, sede do
governo federal, ocorreram vários conflitos entre forças policiais e
estudantes.A mobilização realizadas por estudantes secundaristas do Chile entre
abril e junho de 2006 e
entre setembro e outubro do mesmo ano foi conhecida informalmente como
Revolução dos Pinguins devido ao tradicional uniforme utilizado pelos
estudantes. A greve
nacional de estudantes convocada para 30 de maio, contou com
uma adesão de mais de 600.000 estudantes, tornando-se o maior protesto de
estudantes na história do Chile,
superando os ocorridas em 1972 durante
o governo deSalvador Allende e seu projeto da Escola
Nacional Unificada e durante os anos 1980 contra
as políticas do Regime Militar.
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