01 agosto 2013

Etnia Negra (continuação)


Distribuição geográfica

Desde os tempos coloniais, há uma distribuição irregular da população preta no Brasil. Atualmente, porém, pode-se encontrar populações pretas em todas as regiões brasileiras.

 Após a Abolição

No dia 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel, como regente do trono na ausência de seu pai, o Impedor Pedro II, proclamou a abolição da escravatura. A abolição não trouxe a transformação econômica e social esperada pelos abolicionistas. O Brasil continuou sendo um país essencialmente agrário, com um sistema paternalista de relações sociais e com uma rígida estratificação social. Os proprietários de terras (brancos em sua maioria e, por vezes, mulatos claros) praticamente detinham o monopólio do poder econômico, social e político. Os estratos baixos majoritários da sociedade, formados por brancos pobres e descendentes de escravos, a eles se submetiam.

Os cerca de meio milhão de escravos libertos com a abolição foram lançados numa sociedade já multirracial, na qual muitos descendentes de escravos já se encontravam em liberdade. No século XVIII, havia mais escravos do que livres ou libertos em algumas regiões do Brasil, sendo que os brancos nunca foram maioria em parte nenhuma do Brasil, até a imigração europeia alterar o perfil demográfico de vários estados do Sul e Centro-Sul a partir do século XIX.

No início do século XIX, a maioria da população de origem africana ainda vivia sob a escravidão. Em 1819, cerca de 30% da população brasileira era escrava e os libertos constituíam somente entre 10 e 15%. Porém, no decorrer desse século, assistiu-se a um crescimento exponencial da população de descendentes de ex-escravos, uma vez que em 1872 os descendentes de ex-escravos já representavam 42% da população brasileira e os escravos haviam se reduzido para apenas 16%. Neste ano, havia na população parda quase três vezes mais libertos do que escravos.

Portanto, quando da Abolição, o Brasil já possuía uma grande classe de libertos, de variados tons de pele, e uma tradição longa, que remontava aos primórdios da colonização, de ascensão social por parte de um pequeno número de escravos alforriados. Uma carência centenária de mão de obra branca qualificada e semiqualificada no Brasil colonial obrigou os colonizadores portugueses a legitimar a criação de uma classe de ex-escravos que fosse capaz de exercer essas atividades, tendência essa que provavelmente continuou no século XIX.

A ascensão social dos descendentes de africanos dependia de diversos fatores. A cor da pele, a textura capilar e os traços faciais se mostravam elementos determinantes da categoria racial a qual pertenceria uma pessoa. O patrimônio e a posição social aparente, como a vestimenta e círculo social, também tinham influência, seguindo a linha de pensamento que no Brasil o "dinheiro embranquecesse", embora esse fenômeno se limitasse aos mulatos claros. Os limites à ascensão social dependiam, portanto, da aparência física (quanto mais "negroide", mais difícil ela era) e também do grau de "brancura" social (educação, maneiras e renda). Mas não era apenas a aparência física que importava, a origem ainda tinha importância no Brasil. Era comum que mestiços em ascensão escondessem a sua origem familiar, o que demonstrava que mesmo os mulatos que tinham um fenótipo que lhes permitia a ascensão social se sentiam inseguros que sua origem familiar pudesse ameaçar a sua mudança social.

O fato é que os libertos de cor, quase invariavelmente mulatos claros, já desempenhavam um papel importante bem antes da Abolição em 1888. Alguns haviam alcançado uma considerável ascensão social, ingressando em ocupações qualificadas ou se destacando como artistas, políticos e escritores, mesmo quando a escravidão ainda vigorava. Essa minoria contrastava com a maioria afundada na pobreza. Com a Abolição, milhares deixaram as fazendas e passaram a viver da agricultura de subsistência. Em seguida, muitos voltaram para seus antigos senhores e se inseriram novamente na força de trabalho. Outros rumaram para as cidades, não preparadas para receber esse fluxo de trabalhadores não qualificados. No Centro-Sul, os ex-escravos tiveram que competir pelos postos de trabalho com a massa de imigrantes europeus que estava chegando, mais qualificados que eles para sobreviver no mundo capitalista urbano. No Nordeste, decadente economicamente, as oportunidades de emprego eram poucas para todos. Assim, para as classes baixas brasileiras, na qual se encontravam a maioria dos negros e mulatos, a ascensão social era dificílima.

Com a Abolição, assistiu-se à saída dos ex-escravos que não queriam mais servir aos seus antigos senhores, seguida à expulsão dos negros velhos e enfermos das fazendas. Grande número de negros passaram a se concentrar na entrada das vilas e cidades, vivendo em condições precárias, o que forçou muitos deles a regressar para o trabalho nos latifúndios. Com o desenvolvimento da economia agrícola, outros contingentes de trabalhadores e agregados foram expulsos, engrossando a população das vilas.

 Essa massa não era constituída apenas por negros, mas também por pardos e brancos pobres, que ficavam à disposição para o aliciamento de mão de obra. Essa massa, predominantemente negra e mulata, ainda hoje pode ser vista junto aos conglomerados urbanos brasileiros e em todas as áreas de latifúndio, vivendo em situação de miserabilidade.

Miscigenação


Além da imigração européia do final do século XIX e início do século XX, um dos fatores que causaram a diminuição estatística relativa da população preta no Brasil nos últimos dois séculos foi a intensa miscigenação ocorrida.

No período colonial e imperial, vários fatores, como a relativamente reduzida população de mulheres brancas, acabaram por fazer com que um grande número de relacionamentos entre portugueses e africanas, assim como entre portugueses e índias, acontecessem. Alguns mulatos eram alforriados e, em grupos mais restritos, educados, todavia, a maioria deles continuava a ser escrava. Esse fenômeno não foi exclusivo da América Portuguesa, tendo ocorrido em toda a América Latina e, em menor escala, na América do Norte.



O papel das mulheres


 



 

Negra com turbante fotografada por Albert Henschel (c.1870).


 

Mulher negra da Bahia fotografado por Marc Ferrez (c.1885).

A miscigenação de africanos no Brasil ocorreu sobretudo através de concubinatos envolvendo mulheres negras ou mulatas e homens brancos de origem portuguesa. Em um levantamento de pessoas acusadas de concubinato na Comarca do Rio das Velhas, em Minas Gerais, entre 1727 e 1756, os números mostram que entre os concubinos, 92% eram homens brancos. Porém, das concubinas, 52,1% eram africanas, 35,1% crioulas (negras brasileiras) ou mestiças, e apenas 11,8% eram brancas. Havia, portanto, um nítido predomínio de concubinato envolvendo um homem branco (92%) e uma mulher negra ou mulata (87,2%). Por muito tempo, a historiografia associava a prática disseminada da concubinagem no Brasil colonial à ausência de moral, à condição de extrema pobreza desses indivíduos, aos parcos recursos para realizar um casamento, à pouca disponibilidade de mulheres brancas etc. Estas explicações não levavam em conta a influência das culturas africana e indígena nesse contexto. As mulheres africanas e suas descendentes crioulas, pardas e mulatas tinham percepções culturais diferentes das europeias. Para muitas dessas mulheres, permanecer solteira não representava uma degradação, mas uma virtude.

 O casamento católico na igreja, tão valorizado na cultura portuguesa, ainda não era uma prioridade para as mulheres de origem africana no Brasil colonial. Apenas mais tarde é que houve uma valorização do casamento no Brasil, e as mulheres solteiras passaram a ser estigmatizadas. Isso se deu através da importação da cultura portuguesa, disseminando aspectos culturais como a devoção à Santo Antônio (santo casamenteiro). A Igreja Católica se esforçou para instituir o casamento monogâmico na Europa no século XIII. Foi um processo árduo de normatização de comportamento feito à base de grande repressão. No Brasil, este processo só se concretizou a partir da segunda metade do século XIX, após a transferência da corte portuguesa para o Brasil. Antes disso, proliferavam no Brasil formas heterodoxas de organização familiar, imperando o concubinato e as relações temporárias. O papel da mulher no Brasil também era mais dinâmico do que se esperava para os padrões católicos de mulher recatada e devota, que se tentava imprimir. Só no século XIX, através de enorme repressão sexual, é que a concepção de que o sexo servia apenas para reprodução se instalou no Brasil e o casamento passou a ser a norma a ser seguida. Tal concepção só viria a se dissolver a partir da revolução sexual que se disseminou pelo mundo ocidental na década de 1960.

Na concepção de muitas mulheres de origem africana no Brasil colonial, o concubinato não restringia a liberdade das mulheres como o casamento, e ainda era uma forma de ascensão social, pois muitas escravas conseguiam a liberdade ao se unirem a homens brancos. Estes, após a morte, costumavam deixar bens para os filhos tidos com a concubina. Mulheres de origem africana figuravam em relações endogâmicas, poligâmicas ou mesmo relações monogâmicas, onde elas eram o centro dessa estrutura. Muitas ex-escravas, após conseguirem a liberdade, caíam na pobreza, por não dominarem algum ofício, somado ao preconceito por serem mulheres, de cor e ex-escravas. Algumas forras viviam em situação mais degradante do que alguns escravos, como os domésticos. Outras, por sua vez, se inseriam no mercado de trabalho e conseguiam uma ascensão social, acumulando riquezas. Estas moravam sozinhas, adquiriam escravos e desenvolviam atividades econômicas. Há vários relatos de mulheres negras e pardas forras, durante o período colonial, que desfrutavam de um padrão de vida equiparado ao da elite, principalmente em Minas Gerais, onde a ascensão social era mais maleável. Gozavam da liberdade de decidir o futuro de suas vidas, contrastando com a situação de submissão de muitas mulheres brancas, que primeiro viviam sob o jugo dos seus pais, para depois terem que se submeter ao marido, passando a viver praticamente enclausuradas dentro de casa. A figura mais emblemática da ascensão social das mulheres de ascendência africana no Brasil colonial é Chica da Silva, mas muitas outras mulheres forras desconhecidas alcançaram ascensão social semelhante.

Pesquisas genéticas


 


Uma recente pesquisa genética, encomendada pela BBC Brasil, analisou a ancestralidade de 120 brasileiros auto-declarados pretos que vivem em São Paulo. Foram analisados o cromossomo Y, herdado do pai, e o DNA mitocondrial, herdado da mãe. Ambos permanecem intactos através de gerações porque não se misturam com outros materiais genéticos provenientes do pai ou da mãe, salvo as raras mutações que podem ocorrer. O DNA mitocondrial de cada pessoa é herdado da sua mãe, e esta o herdou do ancestral materno mais distante (a mãe da mãe da mãe etc).

Já o cromossomo Y, presente apenas nos homens, é herdado do pai, e este o herdou do ancestral paterno mais distante (o pai do pai do pai etc).

Miscigenação racial dos brasileiros
Valores arredondados provenientes de duas pesquisas independentes feitas respectivamente com brasileiros negros e com brasileiros brancos
Lado
Origem
Negros Porc.(%)48
Brancos Porc.(%)49
Materno
(DNAmt)
85%
29%
2,5%
38%
12,5%
33%
Paterno
(Cromossomo Y)
48%
2%
50%
98%
1,6%
0%

Esta pesquisa mostrou proporções quase iguais de pessoas com cromossomo Y provenientes da Europa (50%) e da África subsaariana (48%) no grupo de brasileiros negros que foi analisado. Com segurança pode-se afirmar que metade (50%) desta amostra de pretos brasileiros são descendentes de pelo menos um europeu homem. Por outro lado, esta pesquisa mostrou que no grupo de brasileiros e brasileiras pretos analisados, cerca de 85% das pessoas tinham DNA mitocondrial originado de uma antepassada da África subsaariana e 12,5% de uma índia.

Se o grupo analisado representa uma boa amostra da população brasileira, pode-se dizer que os brasileiros negros descendem pelo lado paterno tanto de europeus quanto de africanos subsaarianos, embora pelo lado materno sejam na maior parte descendentes de africanas subsaarianas (85%). Nota-se também que uma parte considerável (12,5%) deste grupo de brasileiros auto-declarados pretos é descendentes pelo lado materno de pelo menos uma ancestral índia.


 

Daiane dos Santos, 40,8% de ancestralidade européia, 39,7% africana e 19,6% ameríndia de acordo com um estudo de seu DNA.

A mesma pesquisa genética também analisou a ancestralidade de brasileiros negros famosos. O resultado surpreendeu ao mostrar que pessoas auto-classificadas e consideradas pretas perante a sociedade apresentam alto grau de ancestralidade europeia. Alguns resultados obtidos foram:


Outra pesquisa genética sugere que uma quantidade considerável de brasileiros brancos não carregam em si apenas DNA proveniente de povos europeus, tendo também DNA proveniente de índios e africanos, devido a miscigenação. Como esperado, o ancestral não-europeu está mais comumente do lado materno. De acordo com essa pesquisa os brasileiros brancos seriam resultado mais da miscigenação com índias do que com africanas subsaarianas, embora a diferença seja pequena. (os resultados desta pesquisa foram colocados na mesma tabela com a pesquisa genética de brasileiros negros anteriormente mencionada) A mesma pesquisa permitiu comparar o grau de miscigenação dos brasileiros brancos com o de estadunidenses brancos, comprovando-se, como esperado, que os primeiros são mais miscigenados, embora também tenha havido miscigenação entre os segundos.

De acordo com esse mesmos estudo genético, 45% de todos os brasileiros, brancos e pretos, teriam cerca de 90% de genes africanos subsaarianos; e que cerca de 86% possuem 10% ou mais de genes africanos subsaarianos.

 Mas esse próprio estudo admite que seus limites de confiança são amplos e foram feitos por extrapolação (extrapolação de 173 amostras de Queixadinha, Norte de Minas Gerais, para todo o Brasil): "Obviamente estas estimativas foram feitas por extrapolação de resultados experimentais com amostras relativamente pequenas e, conseqüentemente, têm limites de confiança bastante amplos". Outro estudo genético autossômico, também levado a cabo pelo renomado geneticista brasileiro Sérgio Pena, em 2011, e contando desta vez com aproximadamente 1000 amostras (do Norte, do Nordeste, do Sudeste e do Sul do Brasil), demonstra que os Brasileiros "brancos" na maior parte das regiões brasileiras possuem ancestralidade africana, no geral, em nível inferior a 10%, sendo que os "pardos" brasileiros, no geral, possuem ancestralidade Européia em grau predominante, sendo o componente Europeu o principal na formação da população brasileira, junto com o Africano (em grau menor do que o Europeu, embora significante), e o Indígena (em grau inferior aos componentes Africano e Indígena). Em todas as regiões do Brasil, a ancestralidade Européia responde pela maior parte da ancestralidade da população: "Em todas as regiões estudadas, a ancestralidade Européia foi a predominante, com proporções variando de 60,60% no Nordeste a 77,70% no Sul do país". A ancestralidade Africana encontra-se presente em grau alto em todas as regiões do Brasil. E a Indígena, em grau menor, também encontra-se presente em todas as regiões do Brasil. Os "Negros" possuem significativo grau de ancestralidade Européia e, em menor grau, ancestralidade Indígena.

De acordo com um estudo genético autossômico feito em 2010 pela Universidade Católica de Brasília e publicado no American Journal of Human Biology, a herança genética europeia é a predominante no Brasil, respondendo por volta de 80% do total, sendo que no Sul esse percentual é mais alto e chega a 90%. Esse estudo se refere à população brasileira como um todo: "Um novo retrato das contribuições de cada etnia para o DNA dos brasileiros, obtido com amostras das cinco regiões do país, indica que, em média, ancestrais europeus respondem por quase 80% da herança genética da população. A variação entre regiões é pequena, com a possível exceção do Sul, onde a contribuição europeia chega perto dos 90%. Os resultados, publicados na revista científica "American Journal of Human Biology" por uma equipe da Universidade Católica de Brasília, dão mais peso a resultados anteriores, os quais também mostravam que, no Brasil, indicadores de aparência física como cor da pele, dos olhos e dos cabelos têm relativamente pouca relação com a ascendência de cada pessoa.

Outro estudo genético autossômico recente, de 2009, também indica que a ancestralidade Européia é mais importante, seguida da Africana, e depois da Ameríndia. "Todas as amostras (regiões) encontram-se mais perto dos Europeus do que dos Africanos ou dos Mestizos do México", do ponto de vista genético.

De acordo com um estudo autossômico realizado em 2008, pela UnB, a população brasileira é formada pelos componentes Europeu, Africano, e Indígena, com as seguintes proporções: 65,90% de contribuição européia, 24,80% de contribuição africana e 9,30% de contribuição indígena.

Outros estudos, vieram a demonstrar a predominância da ancestralidade Européia, na população Brasileira. O que não quer dizer que ela seja Européia, já que a contribuição Africana é imensa, e a Indígena, significativa. O povo Brasileiro é, em verdade, o resultado do encontro de Europeus, Africanos e Indígenas:

 "A correlação entre cor e ancestralidade genômica é imperfeita: ao nível individual não se pode prever com segura a cor da pele ou seu nível de ancestralidade Européia, Africana e Ameríndia nem o oposto. Independentemente da sua cor de pele, a grande maior parte dos Brasileiros possui um nível de ancestralidade Européia muito alto. Também, independentemente de sua cor de pele, a maior parte dos Brasileiros possui um grau significativo de ancestralidade Africana. Finalmente, a maior parte dos Brasileiros têm um grau significativo e muito uniforme de ancestralidade Indígena. A alta variabilidade observada em Brancos e Negros sugere que cada Brasileiro possui uma proporção única e singular de ancestralidades Européia, Africana e Indígena. Assim, a única maneira de se lidar com os Brasileiros não é considerando eles como membros de categorias segundo a cor da pele, mas sim em uma base de pessoa para pessoa, como 190 milhões de seres humanos com um genoma e histórias de vida singulares".

No Sudeste


De acordo com um estudo autossômico de 2009, a herança Européia é a dominante no Sudeste, embora a Africana também seja significativa. A composição do Sudeste foi assim encontrada: 60.7% Européia, 32.0% Africana 7.3% Ameríndia.

Um estudo de ancestralidade autôssomica, de 2009, em escola pública objeto da pesquisa, em Nilópolis, Baixada Fluminense: pessoas que se autoidentificaram como "pretas" nesse estudo, em média, acusaram ancestralidade em torno de 52% europeia, africana 41% e ameríndia 4%. Pessoas que se autoidentificaram como pardas revelaram ancestralidade, em média, 80% europeia, 12% africana e 8% ameríndia. Os pardos se achavam quase 1/3 ameríndios, 1/3 africanos e 1/3 europeus, e, no entanto, sua ancestralidade européia foi superior a 80%". Os brancos praticamente não apresentaram grau de miscigenação significativo. A maior parte dos brancos registrou ancestralidade européia superior a 90%, e 1/3 dos pardos também revelou ancestralidade superior a 90%. Os resultados desse importante estudo revelaram que o componente Europeu é muito mais importante do que aquilo que os estudantes pensavam que seria.

Em São Paulo, tanto brancos como negros apresentam grande ancestralidade africana. Um estudo encontrou média de 25% de ancestralidade africana nos "brancos" da cidade de São Paulo (entre 18-31%), e 65% nos "pretos" da mesma cidade (entre 55-76%). Em Campinas, um estudo encontrou ancestralidade 45% africana, 41% europeia e 14% indígena em pessoas com hemoglobina S (mais prevalente em africanos e seus descendentes). Este mesmo estudo revelou que em apenas 53% dos indivíduos a sua ancestralidade africana era visível no fenótipo.

O componente Europeu é o dominante no estado de São Paulo, e responde por 79% da herança genética da população, o restante sendo africano (14%) e indígena (7%), de acordo com um estudo autossômico de 2006.

Em Minas Gerais, os Brancos possuem ancestralidade predominante Européia, no geral, embora 89% dos brancos teriam mais de 10% de ancestralidade africana e 87% dos pretos têm mais de 10% de ancestralidade europeia, além da ancestralidade indígena.

 

 Os negros do Quilombo de Marinhos, em Minas, são 81% africanos, enquanto os habitantes do município são 59% africano, 37% europeu e 4% indígena, enquanto que em Belo Horizonte (incluindo pessoas de diversas cores, com maior proporção de brancos) a média da população é 66% europeia, 32% africana e 2% indígena. De acordo com esse estudo, a ancestralidade Européia é também a dominante em Minas Gerais, tendo havido considerável fluxo gênico Europeu para a comunidades quilombola objeto da pesquisa. A dominância da ancestralidade Européia em Minas Gerais foi explicada com base no fato de que a maior dos Africanos era do sexo masculino e com baixa expectativa de vida, tendo pouco sucesso reprodutivo, quanto comparado ao colonizador. Em Queixadinha, no Norte de Minas Gerais, foi encontrado índice de ancestralidade africana bastante próximo entre pessoas classificadas de acordo com seu fenótipo como brancas, pardas ou pretas. A partir, portanto, do seu fenótipo, os indivíduos foram classificados da seguinte forma: 30 pessoas como “pretas” (17,3%), 29 pessoas como “brancas” (16,8%) e 114 pessoas como “pardas” (65,9%). Os brancos de Queixadinha têm 32% de ancestralidade africana, os pardos 44% e os pretos 51%, estando os pardos mais próximos aos pretos do que aos brancos. Até o momento não foram feitos estudos na região mais densamente povoada de Minas Gerais, que é a região do Sul de Minas Gerais e Zona da Mata, onde o componente Europeu é significativamente maior.

No Nordeste


De acordo com um estudo genético autossômico de 2009, a herança Européia é a dominante no Nordeste, respondendo por 66,70% da população, o restante sendo africano (23,30%) e ameríndio (10%). O Nordeste encontra-se, assim, então constituído: 66,70% Europeu, 23,30% Africano e 10% Ameríndio.

De acordo com um estudo genético de 2011, "em todas as regiões estudadas, a ancestralidade Européia foi a predominante, com proporções variando de 60,60% no Nordeste a 77,70% no Sul do país".

De acordo com um estudo genético realizado em 1965, pelos pesquisadores norte-americanos D. F. Roberts e R. W. Hiorns, "Methods of Analysis of a Hybrid Population" (em Human Biology, vol. 37, number 1), a ancestralidade média do nordestino é predominantemente europeia (grau por volta de 65%), com contribuições menores, mas importantes, da África e dos indígenas brasileiros (25% e 9% respectivamente).

De acordo com um estudo genético (DNA autossômico) de 2011, pardos e brancos de Fortaleza possuem ancestralidade africana, e também indígena, mas a herança europeia responde por mais de 70% da ancestralidade tanto de "pardos" como de "brancos".

De acordo com um estudo genético de 2005, em São Luís do Maranhão a contribuição africana para a população foi estimada em 19%. A europeia, 42; e a indígena, 39%

Um estudo genético realizado no Recôncavo baiano confirmou o alto grau de ancestralidade africana na região. Foram analisadas pessoas da área urbana dos municípios de Cachoeira e Maragojipe, além de quilombolas da área rural de Cachoeira. A ancestralidade africana foi de 80,4%, a europeia 10,8% e a indígena 8,8%.

Em Salvador a ancestralidade predominante é africana (49,2%), seguida pela europeia (36,3%) e indígena (14,5%). O estudo também concluiu que soteropolitanos que possuem sobrenome com conotação religiosa tendem a ter maior grau de ancestralidade africana (54,9%) e a pertencer a classes sociais menos favorecidas.

Nas capitais nordestinas analisadas (assim como no Nordeste em geral) a ancestralidade africana é expressiva em todas elas, embora a Européia seja a principal, na maior parte delas, e na região Nordeste como um todo. Sem especifiar a cor das pessoas analisadas, para a população de Aracaju chegou-se a um índice de 62% de ancestralidade europeia, 34% africana e 4% indígena.

Para a população de Natal, também sem especificar a cor dos pesquisados, de acordo com um estudo antigo baseado em polimorfismos sanguíneos encontrou a seguinte composição: ancestralidade encontrada foi 58% europeia, 25% africana e 8% indígena. Já a ancestralide de migrantes nordestinos que moram em São Paulo é 59% europeia, 30% africana e 11% indígena. Segundo outro estudo, de 1997, para toda a população nordestina, a ancestralidade estimada seria de 51% europeia, 36% africana e 13% indígena.

No Sul


De acordo com um estudo genético autossômico feito em 2010 pela Universidade Católica de Brasília e publicado no American Journal of Human Biology, a herança genética europeia é a predominante no Brasil, respondendo por volta de 80% do total, sendo que no Sul esse percentual é mais alto e chega a 90%. Assim, a ancestralidade Européia é a principal no Sul, e a Africana significativa, assim como a Ameríndia.

De acordo com outro estudo genético autossômico de 2009, a herança Européia é, sim, a dominante no Sul do país, respondendo por 81,50% do total, o restante sendo Ameríndio (9,2%) e Africano (9,3%).

Estudos genéticos realizado no estado do Paraná entre "afrodescendentes" (negros ou mulatos de diferentes tom de pele) mostram que o grau de mistura é muito variável. Os "mulatos claros" ou "mulatos médios" apresentam grau semelhante de ancestralidade africana e europeia (44% europeia, 42% africana e 14% indígena). Por sua vez, os "mulatos escuros" ou "negros" do Paraná são predominantemente africanos, sendo a ancestralidade 72% africana, 15% europeia e 6% indígena. Mesmo entre os "brancos" do Paraná, os índices de ancestralidade africana são expressivos, porém bastante variáveis, indo desde um mínimo de 3% em um estudo, a um máximo de 17% em outro.

No Norte


De acordo com um estudo genético de 2011, a composição genética da população de Belém é 69,70% europeia, 10,90% africana e 19,40% ameríndia.

 


No Centro-Oeste


De acordo com estudos autossômicos realizados, a Ancestralidade Africana responde por 21,70% da herança da população no Centro Oeste. A Européia, 66,30%; e a Indígena, 12,00%.

Comunidades quilombolas


Estudos genéticos realizados em quilombos (comunidades formadas por descendentes de escravos) têm revelado que a ancestralidade africana predomina na maioria deles, embora seja bem significativo a presença de elementos de origem europeia e indígena nessas comunidades. Isso mostra que os quilombos não foram povoados apenas por africanos, mas também por pessoas de origem europeia e indígena que foram integradas nessas comunidades. Os estudos mostram que a ancestralidade dos quilombolas é bastante heterogênea, chegando a ser quase que exclusivamente africana em alguns, como no quilombo de Valongo, no Sul, enquanto em outros a ancestralidade europeia chega até a predominar, como no caso do quilombo do Mocambo, no Nordeste. Estudos genéticos realizados especificamente em comunidades negras do Brasil (quilombos) mostram que em quase todas a ancestralidade africana é predominante.

Ancestralidade genética de habitantes de quilombos
Nome do quilombo
Africana
Europeia
Indígena
Cametá (Norte)
48%
17,9%
34,1%
Cajueiro (Nordeste)
67,4%
32,6%
0%
Curiaú (Norte)
73,6%
26,4%
0%
Paredão (Sul)
79,1%
2,8%
18,1%
Trombetas (Norte)
62%
27%
11%
Valongo (Sul)
97,3%
2,7%
0%
Mimbó (Nordeste)
61%
17%
22%
Sítio Velho (Nordeste)
72%
12%
16%

Discriminação


O preconceito racial no Brasil é o que alguns autores chamam de preconceito “de marca”, ou seja, que recai sobre o fenótipo do indivíduo (tipo de cabelo, traços e cor da pele). Ele não recai diretamente sobre a ancestralidade, pois no Brasil as classificações raciais se baseiam mais na aparência física da pessoa do que na ancestralidade. É um racismo que aparece como expressão de foro íntimo, mais apropriado ao recesso do lar.79 A escravidão foi abolida, houve a universalização das leis, mas o padrão tradicional de acomodação racial não foi alterado, mas apenas camuflado. Apesar da tão falada “miscigenação brasileira”, um sistema enraizado de hierarquização social com base em critérios como classe social, educação formal, origem familiar e na raça continuaram. Se após a Segunda Guerra Mundial o darwinismo racial foi perdendo força e o conceito biológico de raça foi se desmontando, o “preconceito de cor” fazia as vezes da raça.

Os anos 70 representaram a chegada de todo um movimento de contestação dos valores vigentes no Brasil, por meio de política oficial e, sobretudo, alternativa, na literatura e música. Nessa época surgiu o Movimento Negro Unificado (MN) que, ao lado de outras organizações paralelas, passaram a discutir as formas tradicionais de poder. A existência de movimentos negros no Brasil, porém, é mais antiga: data de 1931 a criação da Frente Negra Brasileira e do seu jornal, e periódicos dedicados ao tema já circulavam no Brasil.

O racismo no Brasil está nas diferenças no acesso à educação e ao lazer, na distribuição desigual de rendas, marcas da discriminação que fugiam à alçada oficial, mas que eram evidentes no cotidiano. A desconstrução do mito da democracia racial circunscreveu o tema racial a uma questão de classe e abandonou a cultural. O tema racial parecia subsumido à luta entre classes e seu problema não seria resolvido por meio do enfrentamento de suas especificidades. Os estudos mais recentes, todavia, demonstraram que o preconceito de cor não estava exclusivamente atrelado a uma questão econômica e social, mas que continuava como um divisor da sociedade.

O racismo brasileiro é de foro íntimo, presente na intimidade, mas camuflado quando toma a esfera pública. Ele se reflete nas relações pessoais mais íntimas, num modelo antigo de hierarquização social e de oportunidades desiguais entre os cidadãos. Reflete-se em práticas reiteradas, como o "elevador social", reservado ao moradores do prédio e o "elevador de serviços", reservado aos serviçais, majoritariamente negros. Na situação econômica se aflora, assim como na relação com a justiça, sendo que os réus negros têm 80% de chance a mais de serem incriminados que os brancos. O Brasil vive uma dicotomia, ao exaltar a miscigenação racial e cultural mas de, ao mesmo tempo, perceber-se um país extremamente desigual.

Indicadores sócio-econômicos



 

Catadores de lixo no Recife. Mais de 70% dos brasileiros que vivem na miséria são negros ou pardos.

Um relatório da UFRJ divulgado em 2011 aponta que tem crescido a parcela de negros e pardos no total de desempregados.80 De acordo com o relatório, em 2006, 54,1% do total de desocupados eram negros e pardos (23,9% de homens e 30,8% de mulheres). Pouco mais de 10 anos antes, ou seja, em 1995, os negros e pardos correspondiam a 48,6% desse total (25,3% de homens e 23,3% de mulheres).

Em relação aos que estão empregados, as diferenças entre as raças também são claramente perceptíveis: em 2006, o rendimento médio mensal real dos homens brancos equivalia a R$ 1.164,00, valor 56,3% superior à remuneração obtida pelas mulheres brancas (R$ 744,71), 98,5% superior à conseguida pelos homens negros e pardos (R$ 586,26) e 200% à obtida pelas mulheres negras e pardas.

Um levantamento do MDS divulgado em 2011 estima que, na parcela extremamente pobre da população, 50,5% são mulheres e 70,8% declararam ser pretas ou pardas.

O Censo 2010 apurou que, dos 16 milhões de brasileiros vivendo em extrema pobreza (ou com até R$ 70 mensais), 4,2 milhões são brancos e 11,5 milhões são pardos ou pretos.

 

Diferenças sociais baseada na origem étnica


Os indicadores sociais revelam que no Brasil os trabalhadores brancos recebem o dobro dos trabalhadores negros e pardos.

Histórico da desigualdade


No período colonial


A desigualdade social entre brancos e negros e mulatos no Brasil remonta aos tempos coloniais. Embora nos primeiros dois séculos de colonização a maioria da população de origem africana no Brasil fosse escrava, no século XVIII houve um incrível crescimento das alforrias e negros e mulatos livres chegaram a formar a maioria da população em algumas capitanias. Porém, as leis e decretos vindos da Coroa Portuguesa e as práticas sociais impediram enormemente o progresso econômico dessa população. Os libertos de ascendência africana eram discriminados por leis que, frequentemente, deixavam de distingui-los dos escravos. Essas leis eram mais evidentes com relação a porte de armas e no uso de certas vestimentas. Pessoas de origem africana eram proibidas de ocupar cargos públicos, uma vez que era necessário comprovar a "pureza de sangue" para se candidatar.

O negro e o mulato livres tinham três possibilidades de ganhar a vida. A primeira era obter a independência financeira a qualquer custo tirando proveito de qualquer oportunidade comercial que surgisse. A segunda era deixar-se absorver no sistema escravocrata como feitor e trabalhador assalariado. A última era desistir de enfrentar os desafios e as desvantagens de ser um indivíduo de cor e entregar-se à vagabundagem. Muitos ex-escravos tinham imensa dificuldade em se integrar ao mundo dos livres. No cativeiro, tudo que se exigia de um escravo era sua força física. A instituição escravocrata minava a sua iniciativa, a capacidade de tomar decisões, a oportunidade de demonstrar liderança e a capacidade de autocontrole. Apenas os indivíduos mais determinados e resolutos conseguiam ultrapassar essas barreiras psicológicas. Portanto, os negros e mulatos nascidos livres tinham mais oportunidades que aqueles nascidos escravos e alforriados depois.

E, por fim, os mulatos de pele mais clara, mesmo os nascidos no cativeiro, tinham mais chances de ser assimilados no "mundo branco" do que os negros de pele mais escura, mesmo os nascidos livres.

Assim, enfrentar a sociedade livre mostrou-se uma tarefa complicada para a crescente população de negros e mulatos livres no período colonial. Socialmente marginalizados, desprovidos de recursos financeiros, muitos viviam em situação mais precária do que os escravos. A Coroa Portuguesa e as autoridades municipais brasileiras nada fizeram para resgatar essa população da marginalidade. Não havia nenhuma política de recuperação social ou ajuda financeira. As únicas organizações do Brasil colonial que tinham alguma preocupação com os indivíduos de origem africana foram as irmandades leigas. A Santa Casa de Misericórdia, única fonte institucionalizada de assistência social de todo o império marítimo português, costumava oferecer dotes para mulheres negras e mulatas em idade de se casar, cuidava dos doentes de graça e ajudava pessoas a aprender algum ofício. Em consequência, as irmandades do Brasil colonial ajudavam, até certo ponto, a aliviar os problemas decorrentes da total ausência do Estado e da Igreja na recuperação social dos negros e mulatos livres na sociedade colonial brasileira.

No Brasil independente


O Estado brasileiro independente não mudou a sua política em relação à população negra e mulata. A medida que mais e mais pessoas de origem africana iam se libertando da escravidão, passavam a engrossar a população de marginalizados na entrada de vilas e cidades.

Comparação entre negros e imigrantes


No final do século XIX, um grande número de imigrantes, sobretudo europeus, foram para o Brasil. A maioria desses imigrantes rumou para o estado de São Paulo, onde foram engajados como trabalhadores em plantações de café. Neste momento, estava havendo a transição do trabalho escravo para o trabalho assalariado. Muitos imigrantes trabalharam lado a lado de negros e mulatos, exercendo as mesmas funções, ou seja, imigrantes europeus e afrodescendentes estavam, inicialmente, no mesmo nível social. Porém, com o passar do anos os imigrantes e sobretudo seus filhos tenderam a alcançar uma incrível ascensão social, enquanto a maioria dos negros e mulatos continuaram pobres.

Vários autores já tentaram explicar o porquê desse fenômeno. Florestan Fernandes explicava que os libertos não estavam preparados para competir com imigrantes, porque a desumanização e a violência da escravidão tornavam os primeiros anômicos, sem laços familiares e comunitários fortes, sem disciplina e tendentes a enxergar a liberdade como ausência de trabalho. A literatura atual dá mais ênfase ao racismo dos fazendeiros brasileiros, que preferiam contratar imigrantes aos trabalhadores nacionais de origem africana.

O sociólogo Karl Monsma foi mais além em sua pesquisa, ao analisar dados censitários do município de São Carlos, em São Paulo. Embora a pesquisa tenha se limitado a esse estado, ela pode ser aplicada em outras partes do país. Em 1907, em muitos aspectos a situação de negros e imigrantes era muito semelhante.

A principal ocupação dos imigrantes no município era o colonato, assim como era a principal ocupação de negros e mulatos. Isso mostra que os afrodescendentes não foram inteiramente excluídos das fazendas. Naquela altura, os imigrantes ainda não tinham grande acesso à terra: apenas 13% dos italianos e 10,1% dos espanhóis eram proprietários, número inferior ao de proprietários mulatos (16%) e pretos (13,5%). A tese de Florestan Fernandes, hoje muito criticada, de que negros e mulatos, após a liberdade, passaram a viver em anomia, também não é comprovada. Em São Carlos, a porcentagem de famílias chefiadas por mulheres foi maior entre os brasileiros brancos (15,8%) do que entre pretos (14,2%) e mulatos (12,8%). As taxas de casamentos de pretos e mulatos era maior do que aquela entre brasileiros brancos o que, num contexto católico tradicional, afasta a tese de uma desorganização familiar.

Quanto à taxa de alfabetização, ela era evidentemente maior entre brasileiros brancos do sexo masculino (61,7%), portugueses (45,6%), espanhóis (45,5%) e italianos (43,8%) do que entre mulatos (30,5%) e pretos (14,7%).

O autor do trabalho chega às seguintes conclusões que tentam explicar porque imigrantes e seus descendentes progrediram enormemente no Brasil, enquanto negros e mulatos, na maioria dos casos, continuaram pobres.

  • A grande presença de imigrantes europeus pobres barateou a mão-de-obra nas fazendas, o que prejudicou trabalhadores negros e outros brasileiros.
  • Em cada nacionalidade imigrante havia uma elite escolarizada com a qual os compatriotas podiam contar para lutar contra os abusos dos fazendeiros e da polícia. A elite imigrante também empregava os compatriotas nas fazendas, oficinas e lojas e ajudava os pobres e analfabetos a lidar com a burocracia do Estado. Entre os negros praticamente não havia uma elite, tendo que contar apenas com a ajuda da elite branca local, o que coibia a organização coletiva dos negros. A falta de uma elite negra deixava os negros desorganizados e incapazes de contrapor às representações negativas a eles atribuídas pelos brancos.
  • Os poucos mulatos bem-sucedidos estavam se "embranquecendo" por meio do casamento com pessoas brancas e não se identificavam com os negros pobres. Com o passar de uma ou duas gerações, seus descendentes se tornavam brancos, engrossando a população de brancos bem-sucedidos.
  • As famílias dos imigrantes eram, em média, maiores que as dos negros. As famílias maiores eram preferidas dos fazendeiros e podiam ganhar mais como empreiteiros ou colonos.
  • A proporção de brasileiros brancos e imigrantes alfabetizados era muito maior que a de negros. Isso impedia que os negros pudessem buscar empregos melhores no comércio e no serviço público, limitando-se ao trabalho braçal. O racismo enfrentado nas escolas fazia com que a evasão escolar fosse alta entre os negros, impedindo a sua formação acadêmica.
  • Os negros eram rejeitados pela elite brasileira. Por outro lado, os imigrantes e descendentes se integravam mais facilmente com as elites locais, favorecendo sua ascensão social.
  • Com a ascensão social, os imigrantes e descendentes passaram a controlar um número crescente de postos de trabalho e favoreciam os seus semelhantes, internalizando o racismo, excluindo o negro de posições de poder e estigmatizando-o como moralmente inferior.

Salário por origem étnica


 


Uma pesquisa realizada em 1998, pelo sociólogo mineiro Simon Schwartzman, mostra que a desigualdade salarial no Brasil também possui um viés étnico e racial. A pesquisa mostrava que os brasileiros que ganhavam mais eram de cor ou raça amarela e branca, enquanto pretos, pardos e indígenas ganhavam menos. A renda mensal de um brasileiro branco era de R$848,41, maior do que entre indígenas (R$515,07), pardos (R$440,14) e pretos (R$400,84).

Por origem ancestral, os descendentes de imigrantes ocupavam o topo da pirâmide social brasileira. Os entrevistados que apontaram ter ancestralidade judia, árabe ou japonesa eram os mais bem sucedidos. Descendentes de judeus ganhavam R$2.047.24 mensais, de japoneses ganhavam R$1.719.14 e de árabes R$1.759.26.

No grupo intermediário estavam os descendentes de italianos (R$1.135.66), de espanhóis (R$1.134.55), de portugueses (R$1.071.97) e de alemães (R$976.59). Brancos que disseram ter só origem "brasileira" ganhavam menos, R$778.09. Pardos que disseram ter ancestralidade africana ganhavam R$496.14, os de ancestralidade "brasileira", R$431.64. Pretos de ancestralidade africana recebiam R$515.3 e, o grupo mais pobre de todos, pretos de ancestralidade "brasileira", ganhavam R$384.81.

Nota-se que pretos e pardos que associaram uma ancestralidade africana ganhavam mais que aqueles que só se disseram de ancestralidade "brasileira". Isso sugere que uma identificação com uma ancestralidade africana está relacionada a uma posição social melhor e, provavelmente, a um maior grau de escolaridade do indivíduo.

 

 

Representatividade na mídia


 



 

A atriz Camila Pitanga já foi protagonista de algumas telenovelas.

Os afrodescendentes têm pouca visibilidade na mídia brasileira. Na televisão brasileira ainda impera o modelo hegemônico branco, refletindo um anseio por uma euro-norte-americanização do retrato social brasileiro. Apesar da resistência cultural e política de grupos negros, a televisão brasileira ainda não foi capaz de representar os valores, experiências e importância desse grupo formador da população brasileira. A telenovela, importante produto da indústria cultural brasileira, já representou várias classes sociais, mas os centros de suas tramas sempre rodam em torno de uma classe média branca e suas relações com os ricos. A "classe média da Zona Sul" é retratada nas novelas brasileiras de forma destacada e glamourizada, e os personagens negros são retratados a partir da visão dos brancos. Os personagens negros aparecem como "empregados fiéis e anjos da guarda dos protagonistas e personagens mais relevantes do horário nobre". Mesmo a classe média negra, quando retratada nas novelas, aparece de forma tão normal e assimilada, sem ligação com a cultura afro-brasileira, que poderia ser interpretada por atores brancos.

O Brasil produz telenovelas desde a década de 1960, porém só em 1996 é que uma atriz negra, Taís Araújo, se tornou protagonista, em Xica da Silva. Sobre os títulos de ter sido a primeira atriz negra a se destacar em diversas áreas da televisão, Taís Araújo declarou que dispensaria esses títulos pois "mostram o preconceito e o atraso existentes no meu país". Indagada sobre o porquê de haver tão poucos negros na televisão brasileira, a atriz declarou: "Porque vivemos num país recheado de preconceito. Existem muitos atores negros no mercado, bons profissionais e muito bem preparados para enfrentar qualquer personagem". Reflexo nítido disso aconteceu em 1970, na adaptação do livro americano Uncle Tom's Cabin para a televisão feita pela Rede Globo.

 Quem foi escalado para fazer o papel do Tio Tomás, que no livro era um personagem negro, foi o ator branco Sérgio Cardoso. Para parecer negro, Cardoso teve que pintar-se de preto durante toda a novela. Numa outra adaptação do livro de Jorge Amado, na novela Porto dos Milagres, de 2001, praticamente todos os atores eram brancos, embora no livro original a história se passasse na Bahia e o próprio autor descrevia que os personagens fossem em sua maioria negros. No Brasil, os personagens negros são frequentemente estereotipados, normalmente em papéis submissos, de empregada doméstica, motorista, serviçal, guarda-costas ou favelado. As negras normalmente são retratadas como mulheres com grande apetite sexual e exarcebada sensualidade. Os homens negros, por sua vez, estereotipados como malandros e criminosos.

Embora desde a década de 1970 os movimentos negros no Brasil lutem por uma maior representação de afrodescendentes na mídia, a televisão brasileira ainda segue o padrão do "branqueamento" e, apesar dos avanços, em muitas novelas os personagens negros são simplesmente ignorados. Com exceção de produções com temática escravagista, das 98 telenovelas produzidas pela Rede Globo na década de 1980 e de 1990, em 28 delas simplesmente não havia sequer um personagem negro. Em apenas 28% delas mais de 10% dos atores eram negros, em um país onde pelo menos 50% da população é formada por descendentes de africanos. A telenovela, ao não refletir a real composição étnica da população brasileira, concilia-se com a negação da diversidade racial do Brasil. Atores morenos ou mestiços também não são destacados. Telenovelas com uma temática que dê destaque à cultura ou às experiências específicas dos afro-brasileiros raramente são retratadas no horário nobre, ficando restritas a algumas minisséries.

No meio publicitário brasileiro a situação não é diferente. Há negros em apenas 3% dos comerciais de televisão. Na década de 1980, movimentos negros e publicitários renomados se reuniram para analisar a falta de negros na publicidade brasileira. Chegou-se à conclusão que o negro era ignorado pois a propaganda pretendia retratar um modelo de família da classe média brasileira, onde a presença negra seria escassa. Ademais, o negro não seria consumidor, os clientes não estariam aceitando a inclusão do negro em seu produto e, por fim, a publicidade seria um reflexo de uma sociedade preconceituosa. O cineasta mineiro Joel Zito Araújo, que fez um amplo trabalho sobre a representação do negro na mídia brasileira, afirmou: "na lógica dessa maioria, preto é igual a pobre, que é igual a consumo de subsistência". Como muitos brasileiros ainda vivem sob a égide do mito da democracia racial, muitos publicitários e produtores simplesmente acreditam que a questão racial não é importante, o que ilimina a preocupação em retratar a diversidade racial do Brasil.

Porém, nos últimos anos, a publicidade brasileira têm percebido que muitos negros vêm ascendendo socialmente, transformando-se em potenciais consumidores. Dos brasileiros que ganham mais de vinte salários mínimos, 28% são negros. Somado a isso, há anos há pressão de grupos e de políticos negros para que haja uma maior representação dessa parcela da população. Assim, de forma paulatina a visibilidade do negro na publicidade vem aumentando. Porém, em muitos casos, os publicitários escalam para as suas propagandas um único negro, rodeado de brancos, seguindo a linha do politicamente correto.

A "branquidade normativa", ou seja, os brancos tidos como o padrão a ser seguido, não é algo exclusivo dos meios de comunicação do Brasil, sendo também uma constante em diversos países da América Latina.

Nesses países, negros, índios e mestiços, sobretudo, são desvalorizados. Na mídia latino-americana, ter um fenótipo branco e, preferencialmente, o nórdico, é associado com valores positivos, como inteligência, habilidade, educação, beleza, honradez e amabilidade. São países que vivem uma dualidade pois, apesar de haver uma promoção oficial da miscigenação e um orgulho em um contexto internacional, o padrão branco é aquele tido como normal, e os outros grupos são excluídos ou estereotipados.


 

Taís Araújo foi a primeira protagonista negra de uma novela brasileira.

Negros nos livros didáticos


Nos livros didáticos brasileiros, há uma invisibilidade dos negros e uma disparidade em relação à representação de brancos. Em uma pesquisa, nos textos não verbais analisados, em apenas 11% há representação de negros, embora mais de 40% da população brasileira se defina como preta ou parda. A representação dos negros nos livros escolares acontece com uma ênfase no lado pejorativo e degradante dessas pessoas. Em mais de 72% das representações nos livros, o negro está exposto sob uma perspectiva negativa e em somente 30% de forma positiva. No meio escolar brasileiro, a representação dos negros no livro didático está normalmente associada com o que há de pior, com a deliquência, as drogas, a escravidão, a miséria, o lixo. Frequentemente fazem referências à cor do personagem de forma negativa. A maioria dos professores entrevistados dizem não perceber essa representação negativa do negro ou não dá a devida importância ao tema, muitas vezes delegando o preconceito ao próprio aluno negro. Para a maioria dos professores, o racismo existente na sociedade não adentra o meio escolar. A ótica dos alunos, por outro lado, se mostrou mais aguçada quanto à percepção dessa discriminação. A maioria dos estudantes relataram que percebem que nos livros didáticos há uma maior representação do grupo branco do que do negro, apenas 11,11% disseram que tanto brancos quanto negros são representados de forma igual. Porém uma minoria entende isso como uma manifestação de racismo. Os alunos, ao terem contato com o livro, associam os personagens ali contidos com os colegas de classe. Como a maioria dos negros são retratados de forma pejorativa no livro didático, os colegas negros passam a ser estigmatizados e ridicularizados, gerando sérios reflexos na sua formação.

A educadora Andreia Lisboa de Sousa, ao analisar a representação do negro na literatura infanto-juvenil, chegou à conclusão de que a representação negativa e degradante do negro leva a uma extrema baixa autoestima dos alunos negros: "Os instrumentos legitimadores como família, escola e mídias tendem a desqualificar os atributos do segmento étnico-racial negro", afirmou ela.

 

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